Entenda a confusão envolvendo o diretório do PDT no Ceará que chega a um fim

Imbróglio no diretório cearense do partido se arrastou por meses, com direito a briga, gritaria e reviravoltas na Justiça

Com a oficialização, pela Justiça Eleitoral, da nova Comissão Provisória do PDT no Ceará, está em vias de se encerrar um capítulo turbulento da sigla trabalhista no Estado. No ano passado, o PDT foi palco de um racha interno, seguido de intensa disputa entre alas divergentes que colocou em lados opostos os irmãos Ciro e Cid Gomes, personagens com grande relevância na história política recente do Ceará e também do PDT.

De um lado, o grupo de aliados do senador Cid Gomes, com prefeitos, a maioria dos deputados estaduais e parte dos deputados federais do partido defendia a aproximação com a gestão do governador Elmano de Freitas (PT), num aceno favorável à manutenção da aliança estadual entre PT e PDT que havia sido rompida nas eleições de 2022, na esteira de divergências na escolha do candidato que representaria o grupo governista.

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Do outro lado, nomes próximos ao ex-ministro Ciro Gomes e da direção nacional pedetista, liderada interinamente pelo deputado federal André Figueiredo (PDT-CE). Este grupo entende que o partido deveria ficar na oposição à gestão Elmano e manter o afastamento registrado em 2022, quando o PDT disputou e perdeu a eleição para governador. Essa ala conta ainda com nomes de peso no cenário local, como o ex-prefeito de Fortaleza Roberto Cláudio e o atual gestor José Sarto; além de três deputados estaduais na Assembleia.

O impasse que se alastrou pelo partido foi gerado ainda na pré-campanha durante a escolha do ex-prefeito de Fortaleza, Roberto Cláudio, para concorrer ao Governo do Ceará, em detrimento da ex-governadora Izolda Cela (sem partido), que tinha o apoio de alas do PT e do próprio PDT mais ligados a Cid. Ciro, na época, era pré-candidato à Presidência da República e defendia internamente que, no Ceará, RC fosse o indicado.

Começo

No Ceará, o PDT era comandado por André Figueiredo, enquanto Cid ocupava a cadeira de vice-presidente. Após reclamações de prefeitos, deputados estaduais e lideranças ligadas ao senador, esta ala começou a pressionar Cid para tomar alguma atitude e assumir as rédeas do partido, argumentando a necessidade de ter uma liderança que abarcasse o interesse da maioria do diretório visando as articulações para as eleições de 2024.

No início de julho, após algum tempo de pressão, Cid e André firmaram um acordo para que o deputado se licenciasse da presidência estadual do PDT até o fim de dezembro do ano passado, ficando Cid responsável pelo partido no período. O acordo envolvia ainda o compromisso de que Cid apoiaria André em uma nova eleição para renovar o diretório que tinha mandato vigente apenas até 31 de dezembro. Parecia tudo resolvido, mas não estava.

Carta de anuência a Evandro

Sob o comando de Cid Gomes, o Diretório Estadual do PDT aprovou, em 25 de agosto de 2023, carta de anuência para que o presidente da Assembleia Legislativa, o deputado estadual Evandro Leitão, pudesse deixar o partido sem perder mandato. À época, Evandro já almejava ser pré-candidato a prefeito de Fortaleza, mas não via possibilidade de fazê-lo pelo PDT, que já contava com o prefeito José Sarto como pré-candidato posto à reeleição.

Na ocasião, Cid classificou a carta como um “gesto político” e disse que o diretório entendeu que Evandro tinha razões de projeto para deixar o partido. “Ele cogita ser candidato a prefeito de Fortaleza e, na compreensão que ele tinha, e que o diretório também chancela, é que não existiria nenhuma possibilidade de ele ser candidato pelo PDT e, portanto, ele vai ver se consegue esse espaço em outro partido”, disse Cid à época.

A medida foi mal vista por pedetistas ligados a André e ao grupo de Sarto, que entenderam que Cid estava dando carta branca para um então aliado deixar a sigla e disputar contra o próprio candidato pedetista. O tema virou pauta de discussões entre as alas trabalhistas. A carta de anuência cedida a Evandro por Cid foi questionada na Justiça pelo PDT nacional, que está sob comando interino de André Figueiredo, devido à licença de Carlos Lupi.

Briga, gritaria e murro na mesa: “A” reunião

Em 29 de setembro do ano passado, uma reunião do PDT terminou em gritaria e gestos exaltados. A confusão foi gerada por um item presente na pauta daquela reunião: a deliberação sobre o partido apoiar ou não a gestão de Elmano de Freitas (PT). O assunto causou muita discussão entre os presentes e, a pedido do presidente nacional da sigla, André Figueiredo — ainda licenciado da presidência estadual à época — foi retirado de pauta. Mesmo com a retirada, houve muita confusão.

A discussão escalou, com direito a gritos e murro na mesa. Um dos envolvidos seria o deputado estadual em exercício Guilherme Bismarck (PDT). Da ala cidista, ele teria, segundo o grupo ligado a André, levantado-se com intenção de intimidar outros presentes. O bloco de Cid argumentou naquele dia que Guilherme teria apenas se defendido.

Houve tumulto, com filiados se levantando e intervindo e a turma do deixa disso tentando apaziguar os ânimos. "Calma, por favor, por favor, Guilherme, Guilherme", intermediou Cid.

O grupo de André e RC, minoritário naquela reunião, retirou-se em protesto. "Não terminou bem", afirmou Figueiredo na saída alegando haver uma ditadura no partido e prometendo intervir. "Vamos tomar decisões, porque não dá para conviver com ditadura dentro do PDT". Cid rechaçou as acusações e disse que trabalhava em prol dos interesses da maioria.

O retorno de André

No dia 2 de outubro, poucos dias após a reunião na qual acusou Cid de ditador, André reuniu aliados na sede do partido e reassumiu a presidência estadual do PDT. Como o deputado apenas havia saído de licença, ele organizou a reunião para anunciar que estava de volta da licença, retirando assim, Cid da presidência do partido por ora.

Ainda segundo o deputado, o acordo para a sua licença previa a pacificação e que qualquer questão de apoio ao governador tinha de ser discutida entre Cid, André e Lupi, o que segundo André não estaria ocorrendo.

"Lamentavelmente, o que nós vimos foi que tivemos cada vez mais dificuldades em relação à pacificação. Foi emitido uma carta de anuência para o presidente da Assembleia, Evandro Leitão, sem ter tido uma discussão prévia com a direção nacional do partido e, na última sexta-feira, 29, já se vislumbrava que seria pautada o apoio ao governo Elmano", pontuou.

Resposta de Cid e questionamentos na Justiça

Quatro dias após André retornar ao comando, Cid Gomes convocou reunião do diretório do PDT, com objetivo de eleger uma nova executiva estadual que substituiria a comandada por Figueiredo. A convocação contava com 49 assinaturas dentre os 84 membros que compunham o diretório estadual na época. A reunião ocorreu em 16 de outubro.

Na ocasião, Cid foi eleito presidente pela maioria do diretório e sem a participação de nomes ligados a André na reunião. Minutos após a votação, a Justiça suspendeu a convocação da reunião feita por Cid, botando em xeque a votação realizada.

A juiza de direito Maria de Fatima Bezerra Facundo, da 28ª Vara Cível, deferiu parcialmente pedido do deputado federal André Figueiredo (PDT) e suspendeu os efeitos da convocação da reunião que elegeu o senador como presidente estadual.

Cid disse estar tranquilo quanto à legalidade da votação ocorrida e que a juíza que proferiu a decisão foi "induzida ao erro". Segundo ele, havia menção equivocada à realização de uma convenção, quando na verdade o grupo de Cid realizava uma reunião extraordinária.

Dois dias depois da decisão inicial, em mais uma reviravolta judicial, Cid conseguiu reverter a suspensão da convocação do diretório do PDT e manteve a validade da eleição que o alçou ao comando do partido, retirando Figueiredo do posto.

Intervenção nacional e novas cartas de anuência

Em 27 de outubro, o PDT Nacional, comandado interinamente por André Figueiredo, marcou uma reunião para debater os rumos do partido no Ceará. A reunião foi marcada por momentos bastante acalorados, com direito a discussões envolvendo os irmãos Ciro e Cid Gomes e o ex-prefeito de Fortaleza, Roberto Cláudio, que se dirigiu de forma mais contundente contra Cid e seu grupo.

O saldo da reunião foi a aprovação de uma decisão de caráter liminar para iniciar intervenção, que tiraria Cid do comando da sigla no Ceará e nomearia um interventor para gerir o diretório. A princípio foi o que ficou definido. No entanto, em 30 de outubro, Cid convocou nova reunião com aliados no Ceará, desconsiderando a decisão nacional, para debater a situação do grupo e do partido. A ala cidista entendeu que havia uma decisão judicial que assegura a vigência do diretório estadual do PDT e sua legalidade.

O PDT Nacional ao considerar que Cid ignorava a decisão nacional, marcou para o dia 9 uma nova reunião para confirmar a intervenção no Ceará.

Cid se antecipou e convocou reunião do diretório estadual no dia anterior para deliberação sobre a situação político-administrativa do diretório e da executiva estadual. Na reunião estadual, realizada no dia 8, o diretório aprovou uma série de cartas de anuência para parlamentares ligados a Cid e que desejavam acompanhar o senador, caso ele deixasse o partido, sem perder os respectivos mandatos.

Na reunião da Nacional, foi confirmada a destituição do diretório cearense pedetista, colocando no lugar uma comissão provisória com cerca de uma dúzia de membros, sob a liderança do ex-senador Flávio Torres e outros nomes ligados a André Figueiredo.

Cid retoma o diretório

No dia 10 de novembro, foi anunciado que a Justiça havia determinado a suspensão do Processo Ético-Disciplinar da intervenção aprovada na reunião da Executiva Nacional do PDT que retirou o diretório estadual eleito e colocou comissão provisória em seu lugar. Com isso, o comando da sigla no Ceará voltou para Cid Gomes. A decisão, à época, foi do juiz Cid Peixoto do Amaral Neto da 3ª Vara Cível. Ele intimou o Diretório Nacional do PDT para que tome ciência do deferimento da tutela de urgência e apresentasse contestação.

Nesse meio tempo, de reviravoltas judiciais e acontecimentos políticos, o clima escalou ainda mais. As declarações públicas ficaram mais agressivas e ficaram ainda mais evidentes quando Ciro Gomes criticou o irmão, chegando a afirmar que Cid liderava grupo de “descartáveis” e que o senador havia aprovado cartas de anuência até para “um poste”.

Início do fim

A partir daí já era inviável a permanência de Cid e de parte dos aliados no PDT. No dia 14 de novembro, um grupo de 43 prefeitos ligados ao senador anunciou uma saída em massa do partido. Parte deles, posteriormente, saiu sem esperar uma decisão em grupo. Outros gestores aguardam definição de Cid, que foi cotado no PSB, no PT, no Podemos e no Republicanos.

O destino do senador deve ser, de fato, o PSB. Parte dos gestores municipais deve acompanhá-lo para o mesmo partido, enquanto outros podem ir para outras legendas, a depender dos respectivos cenários políticos municipais

Evandro Leitão foi para o PT, gerando certo ruído com Cid que havia pedido que os aliados aguardassem para tomar uma decisão em grupo. Leitão se antecipou e deverá disputar a preferência interna do partido para disputar a Prefeitura de Fortaleza.

Já Cid deve oficializar a ida ao PSB no início de fevereiro. Já o grupo de deputados estaduais e mesmo os federais ligados a Cid tem tido mais cautela em relação a situação, já que o diretório nacional do PDT alega que as caras de anuência cedidas por Cid são nulas e que buscará os mandatos daqueles que saírem antes da janela partidária, que para deputados será apenas em 2026.

Um grupo de parlamentares estaduais já entrou na Justiça com um pedido para deixar o partido sem correr risco de perda de mandatos. Já outros parlamentares federais têm falado em tom mais cauteloso, apontando que não colocarão os mandatos em risco.

O diretório estadual comandado por Cid teve a vigência encerrada no último dia 31. Com isso, o PDT nacional enviou ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) inscrição de nova comissão provisória para gerir o partido pelos próximos seis meses. O sinal verde da Justiça Eleitoral foi oficializado nesta quarta-feira, 10, e a Comissão, com nomes ligados a André Figueiredo, passou a vigorar oficialmente.

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