Entre o Sol e a esperança, irmãos vendem suco em cruzamento de Fortaleza

Hiro e Jhonny chamam atenção pela vestimenta, pela semelhança, pela parceria e pela relação com a clientela. Há um mês, investem em projeto de venda na rua

13:25 | Dez. 28, 2025

Por: Mateus Brisa
Jhonny Santos (esquerda) e Hiro Rodrigues chamam atenção pela vestimenta preta, acompanhada de jaqueta jeans e chapéu de vaqueiro, e também pela semelhança (foto: FÁBIO LIMA)

Quem passa pelo cruzamento entre a avenida Bezerra de Menezes e a rua Coronel Mozart Gondim, no bairro São Gerardo, em Fortaleza, pode conseguir um refresco para o Sol candente, no fim da manhã. Dois irmãos vendem sucos artesanais no semáforo, distribuindo simpatia e esforço para crescer.

Hiro Rodrigues e Jhonny Santos chamam atenção pela vestimenta preta, acompanhada de jaqueta jeans e chapéu de vaqueiro, e também pela semelhança. São tão parecidos que fizeram uma “jogada de marketing”, como dizem, e se lançaram como “gêmeos que vendem”.

Com mais de dois mil seguidores no Instagram, o perfil criado por eles para se divulgarem inclui relatos cotidianos, interações com clientes e outros vendedores, e reflexões sobre trabalho, labuta e crescimento profissional.

A “veia empreendedora” é herança do pai, que “tinha uma vida muito difícil, enfrentando a pobreza. Ele sempre foi muito trabalhador. E dizia: ‘O homem que não trabalha não é homem’”, contou Hiro, que tem 32 anos. “Isso nos fez ver o benefício de trabalhar, moldou nosso caráter ao longo do tempo”.

Sob a sombra de árvores, ele e o irmão organizam mesa retrátil, isopores e maquininhas de crédito, e se dividem entre os carros e motos. As garrafas de suco têm chave Pix em QR code para não atrapalhar o fluxo do trânsito.

A estrutura não era assim há um mês, quando principiaram a empreitada. Tudo começou, rebobinou Hiro, após ele sonhar com o pai o “ensinando a vender balinha”. Quando soube, Jhonny instigou que prontamente começassem e, no dia seguinte, estavam na rua com pacotes de bala.

A dupla pesquisou sobre vendas nas ruas e sinais movimentados de Fortaleza, e visitaram o cruzamento entre as avenidas José Jatahy e Bezerra de Menezes.

Cronometraram o tempo de semáforo e observaram a região, mas decidiram explorar e, um quilômetro e meio depois, chegaram na esquina com a rua Coronel Mozart Gondim, onde há árvores e academias por perto. “Assim que vimos, a gente pensou: ‘Vai ser aqui’”, disse Hiro.

Com o tempo, trocaram a mercadoria para paçoca de amendoim. No meio tempo, Jhonny, de 26, descobriu vídeos virais de sucos produzidos a partir do líquido da melancia com espremedores manuais, no continente asiático. Veio daí a decisão de produzir sucos. “A gente precisa de um investimento para ter a máquina, mas decidimos começar com o que a gente tem”, disse Jhonny.

“Achamos a ideia do suco ‘instagramável’, aí eu cheguei nele e falei: ‘Vamos vender mais paçoquita não’”, complementou Hiro. “Fomos numa feira pertinho de casa, compramos as frutas, fizemos testes…”

Inicialmente, o suco teria como base o líquido da melancia, mas os irmãos perceberam que fermentava em 24 horas, enquanto o consumo nem sempre acontece no mesmo dia. Hoje, o produto tem água de coco como base.

“Nós dois somos a empresa, as pernas e os braços. De dia a gente vende, à noite a gente produz”, relatou Hiro. “Todo santo dia a gente produz os sucos e todo dia a gente só volta para casa quando acabam todos”.

Para o futuro, eles esperam aprimorar a produção e a embalagem dos sucos, além de incluir informações nutricionais. Os dois matutam até a ideia de entregar os produtos a partir de um serviço de assinatura.

'Não é só pelo dinheiro'

Durante conversa com a reportagem na véspera de Natal, Hiro e Jhonny demonstraram alinhamento entre si, seus objetivos e desejos. Em 15 dias vendendo paçoca de amendoim, os dois contaram ter lucrado R$ 6 mil. “Mas viemos para a rua com uma mentalidade diferente”, disse Jhonny.

“Não é só pelo dinheiro. Ó, estamos parados aqui agora, isso não é dinheiro. Mas isso aqui nos traz frutos”, complementou o fortalezense.

“E a gente não faz só porque é você, porque veio nos entrevistar”, emendou Hiro, “mas com todo mundo que para, conversa, se conecta, pergunta. A gente faz questão de dar essa atenção às pessoas, porque o que a gente sabe fazer de melhor é nos relacionar com as pessoas. Vender, a gente aprendeu”.

Por isso, Hiro entende que, quando um motorista não abaixa o vidro para ouvi-lo, ali há uma oportunidade de aprender ou de seguir em frente. Por isso, a relação com clientela é “ótima, porque nós não queremos o seu dinheiro”.

“Queremos o seu relacionamento. E é ótimo, quando baixam o vidro. Quando não, fica para uma próxima”.

Por esse e outros motivos, os dois irmãos investiram em vestimentas mais dedicadas. “Na primeira semana, foi muito sol quente na pele. Com isso, percebemos que precisávamos de proteção, aí começamos a montar o look”.

Eles começaram com uma camisa térmica, depois veio uma jaqueta “para deixar o look mais presença, mais importante”. Ter essa camada “jeans” foi necessário devido “ao fato de, como você está no sinal, as pessoas já te olharem de maneira marginalizada. Então, decidimos ficar bonitões”.

O acessório mais recente foi o chapéu, “porque o Sol pega muito”. Segundo Hiro, ele também ajuda nas redes sociais, por chamar atenção. “Algumas pessoas vão assistir ao vídeo por causa do chapéu. Já teve até gente que chegou no direct perguntando onde compramos a jaqueta”, relatou.

Parceria fraterna

Ter um perfil no Instagram e trabalhar a presença online era uma vontade da dupla, segundo Jhonny. Junto do “uniforme” de trabalho, eles usam um suporte peitoral para encaixar o celular e têm um estabilizador. Com isso, filmam as diversas interações e situações que ocorrem ao longo do dia.

Hiro é formado Cinema e Audiovisual pela Universidade Federal do Ceará (UFC) e tem um sonho antigo de fundar uma produtora audiovisual. E era esse o discurso que usavam ao abordar os motoristas. Com a mudança para o suco, a abordagem mudou para focar nos benefícios do produto.

“Depois de um tempo, eu pensei: ‘Já tô falando isso para todo mundo’... Então, vamos abrir, sim, essa produtora. Já tô até com a ideia de começar um Instagram, para o cliente que compra ver que, de fato, existe a intenção de abrir uma produtora”, argumentou Hiro.

Jhonny acompanhou o irmão na paixão pelo cinema e compartilha o sonho com ele: “Eu sempre brincava em casa, ‘ah, tô me formando em Cinema por tabela’. Isso porque ele me levava para aulas. Aí acabei aprendendo um pouco”.

Quando mais novos, os dois compartilhavam o tempo juntos curtindo animes, séries de TV e desenhos animados. “A gente comprava o DVD na feira, assista juntos… Começou com anime, depois veio filme, Jackie Chan... Isso mesmo antes de termos o poder de comprar algo”, lembrou Hiro.

A proximidade entre os irmãos se traduz em parceria: na vida, no trabalho e no que querem para o futuro. “A gente costuma brincar que somos o Pinky e o Cérebro. Ele [Hiro] é o Cérebro, que pensa, maquina… e eu executo”.

“Meu negócio é fazer. Se tu me chamar para fazer algo, quero fazer agora. Por isso, quando soube do sonho [do Hiro], eu falei, ‘vamos fazer isso amanhã’”.

Para Hiro, é “incrível” trabalhar com o irmão: “Construímos nosso projeto com base em como crescemos, como fomos moldados ao longo da vida. Construímos essa relação de amizade. Então, nós somos amigos, talvez mais do que irmãos. É um prazer ter alguém que me apoia nas minhas loucuras”.

Assim, há estabilidade na parceria a dois, especialmente em situações de adoentamento e ausências. “Não tem parte ruim. Quando você tem um bom relacionamento com o seu parceiro de trabalho, é só benefício”, disse Hiro.

“O que a gente acertou, a gente acertou junto. Quando a gente quebrou, a gente quebrou junto. Como disse Eclesiastes, ‘Melhor é serem dois do que um’”, refletiu Jhonny.

Resiliência e religiosidade

Hoje, Jhonny se casou e mudou para o Icaraí, na Caucaia, Região Metropolitana de Fortaleza. Mas a casa da família dos irmãos fica na Barra do Ceará, onde moram há anos e aprenderam valores que carregam consigo.

Os pais deles são naturais de Pindaré-Mirim, município no interior do Maranhão. O pai era pescador e, devido às dificuldades, durante uma visita a uma parente em Fortaleza, decidiu mudar a família para a capital cearense.

Hiro contou que, ao chegar em terras alencarinas, o pai dele conheceu um cabeleireiro que o ensinou a cortar cabelo, então ingressou na profissão e, com o tempo, decidiu repassar seus conhecimentos aos filhos.

A busca por qualidade de vida foi algo ensinado de pai para filhos. Por isso, equilibrar o cotidiano sob o Sol, as questões da vida e os sonhos é “difícil, mas é necessário ter inteligência para, por exemplo, encontrar as sombras, para se diversificar, usar os braços e as pernas o máximo que eu puder”, pontuou Hiro.

“Nossa jornada também é ajudar outras pessoas, incentivar o trabalho, o empreendedorismo. De alguma maneira, sabemos que somos esse instrumento que Deus usa para alcançar as pessoas”.

Cristãos, os irmãos mencionam Deus e religiosidade com recorrência. “Nós entendemos que sem a fé não conseguiríamos chegar à ideia dos sucos”, argumentou Hiro. “Não sabia nem para onde ir. E estamos sendo capacitados por Deus. Somos gratos por tudo, pelos sucessos, pelos infortúnios, pela felicidade, pela tristeza, pela falência, pela fartura”.

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