Alunas da rede pública são finalistas na Olimpíada Nacional em História do Brasil
Estudantes da EEFM João Paulo II são a única equipe que representará a escola pública da rede estadual Fortaleza na competição da ONHB da Unicamp, em São Paulo
Três alunas de uma escola pública localizada no bairro Henrique Jorge, em Fortaleza, foram classificadas para a final da Olimpíada Nacional em História do Brasil (ONHB), uma das mais prestigiadas competições acadêmicas do país.
A fase final será presencial e ocorrerá em agosto, no campus da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), em São Paulo.
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Dentre as mais de 57 mil equipes inscritas, as estudantes Iara Carneiro da Paz, de 18 anos, Vitória Sena Girão, de 17 anos, e Analice Bernardo de Sousa, de 17 anos, integram um dos 351 grupos finalistas de todo o País.
Em agosto, as meninas irão sair do Ceará e viajar de avião pela primeira vez para disputar a final da prova na Unicamp, em São Paulo.
Elas detalham suas experiências na Olimpíada, desde a rotina intensa de estudo e superação de desafios, como conciliar a competição com o trabalho e a vida social, até o orgulho de representar a educação pública do Ceará na esfera nacional após dois anos de tentativas frustradas.
As adolescentes estão na 3ª série do Ensino Médio da Escola de Ensino Fundamental e Médio João Paulo II. Este é o último ano delas no ensino médio, e elas sentiam "muita vontade" de chegar à final da ONHB.
Iara comenta que sente um pouco de medo de andar de avião, mas está disposta a enfrentar esse medo para realizar seu sonho.
Para as alunas, o nervosismo aumenta à medida em que o dia da viagem se aproxima. “Ainda não caiu a ficha”, diz Analice.
Essa é a terceira vez que as meninas participam da competição e pela primeira vez elas foram classificadas para a final. No primeiro ano, Iara e Analice foram semifinalistas, mas no segundo ano ficaram na quarta fase. Vitória se juntou à equipe neste ano, após mudar de escola.
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“É uma grande realização representar a escola pública. E imagina você em no meio de várias outras escolas grandes de renome, achando que você não consegue, mas você tem pessoas que apoiam você”, diz Vitória indicando os professores orientadores Raul Castro e Samanta Forte, da escola João Paulo II.
Samanta Forte, de 35 anos, é a orientadora e professora de história da escola João Paulo II, que está acompanhando as alunas na ONHB.
Ela trabalha na escola João Paulo II desde 2014 e, a partir do ano seguinte, a instituição de ensino começou a participar da Olimpíada.
Embora a escola já tenha tido equipes que chegaram à semifinal, é a primeira vez em 10 anos que a escola consegue ter uma equipe finalista.
A professora destaca a persistência, a paixão, o interesse e a proatividade das alunas como um grande diferencial, pois elas vêm tentando há algum tempo e insistem no processo da Olimpíada, não apenas com a intenção de ir para a final, mas por curiosidade e vontade de aprender.
“Um grande diferencial delas é essa persistência mesmo. De um ano foi até a sexta fase, outro ano foi até a quinta fase, mas essa persistência delas e essa paixão, esse interesse, essa proatividade é o grande diferencial”, comenta Samanta.
Samanta Forte e o professor Raul Castro (o outro orientador) são amigos desde a faculdade de história e são figuras centrais no sucesso das alunas. Eles também se dedicaram intensamente, vendo o trabalho da equipe ser recompensado com a inédita participação na final da ONHB.
A maior dificuldade, tanto para os alunos quanto para os professores, é a questão do tempo. Nas escolas públicas, não há uma carga horária específica destinada à participação na Olimpíada de História.
Os professores dedicam tempo da vida pessoal e dos finais de semana, para orientar as equipes, além de suas demandas normais de sala de aula, provas e notas dos demais alunos da escola.
Ela compara essa realidade com a das escolas particulares, que estão investindo mais na participação da ONHB, destinando carga horária e recursos, devido ao retorno comercial e de publicidade.
“Enquanto que na rede pública nós não temos tempo. Nós tiramos do nosso tempo de vida pessoal. A gente tira do nosso fim de semana, a gente tira o tempo da nossa vida pessoal para conseguir participar da Olimpíada de História e é uma dedicação que é realmente bem exaustiva”, relata Samanta.
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Iara diz que também recebe um apoio "enorme" de sua família, embora eles "não tenham muito uma dimensão do que é isso, do que é a Olimpíada". As três dizem que mesmo sem a família entender a magnitude da competição, eles ficam muito felizes com a conquista delas.
Analice relata que sua mãe e o orientador Raul "choraram horrores" juntos, demonstrando o apoio e a forte emoção de orgulho pela classificação. “Minha mãe está mais feliz do que eu, está mais animada do que eu", diz.
A estudante cita que “a pressão” por “ser de escola pública” é uma das maiores dificuldades, porque “querendo ou não, ensino também é diferente”.
Para as meninas, a conquista serve como inspiração para outros alunos, especialmente os mais novos do João Paulo II, mostrando que "não é porque você é de escola pública que você não vai conseguir", conforme diz Vitória.
Agora há muito reconhecimento e apoio dos outros alunos da escola, que as parabenizam e perguntam sobre a Olimpíada, mostrando interesse em participar no futuro.
"Mostrar a força da escola pública na final” da Olimpíada Nacional em História do Brasil
A competição, promovida pela Unicamp, envolve seis fases online que testam conhecimentos em história, interpretação de fontes, análise crítica e produção textual. A fase final será presencial e ocorrerá em agosto, em São Paulo.
Em relação aos custos da viagem, a equipe solicitará uma ajuda de custo, que geralmente é liberada 15 dias antes.
Mas elas têm um "plano B" para complementar ou cobrir os custos, como fazer rifas ou vender produtos na escola, caso não consigam a ajuda de custo do governo.
No entanto, Analice acredita que a ajuda de custo é "meio certeza", porque as escolas públicas finalistas anteriores tiveram suas viagens financiadas.
De todo o País, o Ceará é o estado que mais classificou equipes na competição, com um total de 107 grupos finalistas na ONHB.
Com a conquista, as estudantes passam a representar a Escola de Ensino Médio João Paulo II e a educação pública estadual cearense no panorama nacional.
A Olimpíada é descrita por elas como "extensa" e que impulsiona o aprendizado "no decorrer da olimpíada". Elas se dedicaram muito, passando "noite sem dormir" para passar por todas as fases.
As alunas conseguiram gabaritar a quarta fase da Olimpíada, a fase de transcrição, considerada a mais difícil, em que as equipes devem transcrever um documento histórico.
Nessa etapa, as meninas atingiram a nota 9.9. Elas são a única equipe de escola pública de ensino médio da rede estadual de Fortaleza a chegar à final sob orientação do professor Raul Castro e da professora Samanta Forte.
“Nos primeiros anos, as escolas particulares, elas não davam tanto valor assim para a Olimpíada de História, mas estamos percebendo que de uns três anos para cá, as escolas particulares, elas já estão dando muita centralidade à participação da Olimpíada de História, tanto que esse ano diminuiu a quantidade de escolas públicas do estado”, explica Samanta.
A professora enfatiza que participa não apenas pela classificação, mas pelos ganhos em conhecimento e criticidade que a Olimpíada proporciona.
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As alunas também acham que a Olimpíada ajuda a ter um pensamento mais crítico. Para as três, a ONHB também contribui para o conhecimento de modo geral, porque muitas questões abordam temas não vistos em sala de aula, complementando o aprendizado.
Por meio da Olimpíada, Iara se apaixonou por história. Ela destaca que aprendeu que a história não se trata apenas de "decorar datas", mas de "conhecer como é que funciona a estrutura disto ou daquilo".
Ela descreve a grande emoção e gratificação de ver o esforço de sua equipe e o próprio trabalho serem reconhecidos. “É extremamente gratificante levar o nome do estado e mostrar a força da escola pública na final”, afirma a professora.
Samanta expressa a esperança de que a classificação para a final atual inspire mais alunos a se interessarem por história e pela ONHB no futuro.
No primeiro ano em que as meninas participaram, só havia duas equipes disputando a competição na ONHB na escola João Paulo II.
Após o sucesso delas como semifinalistas, o número de equipes aumentou significativamente para sete ou dez no segundo ano, e mais equipes este ano, mostrando o legado que deixaram.