Tarifaço de Trump pode ter efeito de tsunami nas exportações, diz especialista

Tarifaço de Trump pode ter efeito de tsunami nas exportações, diz especialista

Empresários relatam prejuízos com incertezas causadas pela possível taxação de 50% sobre produtos brasileiros nos EUA. Setores de mel, calçados e pedras ornamentais estão entre os mais afetados

O anúncio do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, sobre a intenção de aplicar uma tarifa de 50% sobre produtos brasileiros que entram no país já começa a gerar impactos diretos na economia do Ceará. Cargas estão paradas no Porto do Pecém e a insegurança se espalha entre exportadores, especialmente nos setores de mel, pescados, calçados e pedras ornamentais.

Em entrevista ao Guia Econômico, da rádio O POVO CBN, o CEO da JM Negócios Internacionais, Augusto Fernandes, o efeito da medida é comparável a “uma bomba atômica” sobre a economia brasileira. A empresa atua com despacho aduaneiro e frete internacional e já contabiliza prejuízos com contêineres retidos, negociações suspensas e custos extras com armazenamento.

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“Desde o anúncio da tarifa, ninguém mais dorme. O impacto já é real: temos contêineres parados e outros a caminho dos EUA, com chegada prevista entre o fim de julho e a segunda quinzena de agosto. Se a tarifa entrar em vigor no dia 1º, esses produtos já estarão sujeitos à cobrança”, explica Fernandes.

Logística em risco

O Porto do Pecém é hoje um dos principais corredores de exportação do Nordeste. De acordo com Fernandes, a média de tempo entre o embarque no Ceará e a chegada a destinos como Filadélfia, Houston ou Nova York é de 11 a 15 dias. No entanto, o trâmite completo — incluindo atracação, desembaraço e entrega ao cliente final — pode demorar ainda mais, ampliando os riscos para produtos perecíveis e sensíveis.

Além do mel produzido no interior do Estado, que é vendido em regiões como Wall Street e Times Square, cargas de pedras ornamentais, tecidos e ornamentos já enfrentam incertezas logísticas e financeiras. O custo de demurrage — termo usado para o "aluguel" dos contêineres retidos além do prazo — pode chegar a até 280 dólares por dia.

Efeitos em cadeia

O temor dos empresários é de que os efeitos da tarifa se espalhem em cadeia pela economia. Fernandes destaca que o prejuízo não se limita às empresas exportadoras, mas também ameaça empregos e a arrecadação.

“O impacto vem primeiro para as empresas, depois para os empregos e, por fim, para toda a economia. Estamos falando de um comércio bilateral que vem desde Dom João VI. Tudo é dolarizado: máquinas, insumos, tecnologia. Essa tarifa atinge todos nós”, afirma.

Atualmente, os Estados Unidos representam cerca de 15% das exportações brasileiras. Já o Brasil, segundo Fernandes, responde por menos de 1% das importações dos EUA, o que limita o efeito de medidas retaliatórias, como a aplicação da lei de reciprocidade, defendida pelo presidente Lula.

Setores mais afetados

O setor pesqueiro é um dos mais vulneráveis diante da crise. Estima-se que mais de 80% da produção nacional é destinada ao mercado norte-americano. Fernandes alerta que o número de contêineres parados pode ser bem maior do que o divulgado inicialmente — cerca de 58, segundo estimativas preliminares.

“Na nossa empresa, só nesta semana, temos entre 11 e 15 contêineres prontos para embarque, e outros 11 programados para a próxima semana. E isso é apenas uma pequena amostra do que está acontecendo nos portos do Ceará, Bahia e Pernambuco”, afirma.

Alternativas e entraves

Apesar de algumas sugestões de redirecionamento para outros mercados — como Europa ou China —, o especialista pondera que o processo de adaptação é demorado e complexo. Em muitos casos, as empresas foram concebidas exclusivamente para exportar aos Estados Unidos.

“Não é só mudar o destino. O que vendemos para Nova York não é o mesmo que venderíamos em Londres ou Berlim. O público, os padrões e as negociações são outros. Em um caso, só para exportar peças do Ceará para os EUA, foram dois anos de reuniões, contratações e adaptações”, relata.

Cenário de incerteza

O presidente Lula declarou recentemente estar disposto a negociar com os Estados Unidos para reverter a medida, mas também reforçou que, se necessário, aplicará a lei de reciprocidade. Trump, por sua vez, sinalizou que pode conversar com o Brasil, mas ainda não recuou.

Enquanto isso, a apreensão cresce entre empresários e cooperativas. Muitos já negociam prazos com clientes internacionais, tentam postergar envios e buscar garantias contratuais — tudo em meio a um cenário de instabilidade.

“Temos navios saindo hoje do Pecém, com carga prevista para desembarcar nos EUA após o dia 1º de agosto. Os clientes já estão ligando, perguntando: quem vai pagar esses 50%?”, conclui Augusto.

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