Mortes de mulheres e LGBTQIA+ serão tratados primariamente como crimes de ódio no Ceará

Portaria publicada pela SSPDS ainda estabeleceu outras normas para garantir respeito à diversidade de gênero e sexualidade em investigações de homicídios

A Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS) determinou que assassinatos de mulheres e membros da população LGBTQIA+ no Ceará serão tratados, primariamente, como crimes de ódio. A nova determinação foi publicada na edição dessa quarta-feira, 29, do Diário Oficial do Estado (DOE).

Conforme a portaria de Instrução Normativa nº 0644/2023-GS, assinada pelo secretário Samuel Elânio, “todos os Crimes Violentos Letais Intencionais (CVLI), exceto latrocínios, que tenham como vítimas mulheres e membros da população LGBTQIA+ deverão ser tratados como resultantes de ações de ódio, intolerância sexual ou decorrentes do machismo estrutural, sendo registrado como feminicídio, transfobia ou homofobia, conforme o caso específico”.

A portaria ainda prevê outras medidas visando impedir ações discriminatórias durante os atendimentos de locais de ocorrências de crimes. Foi determinado, por exemplo, que, no atendimento das ocorrências de violência contra a mulher ou que envolva aversão odiosa à orientação sexual ou à identidade de gênero, o Comando de Prevenção e Apoio às Comunidades (COPAC) deverá ser acionado e encaminhar as partes para a Delegacia de Polícia Civil competente.

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Outra medida a ser tomada é perguntar, durante o atendimento às pessoas travestis e transexuais, como estas preferem ser chamadas “ainda que este não conste na carteira de identidade ou outro documento oficial válido, não cabendo qualquer tipo de constrangimento ou objeção de consciência”.

Os agentes também não poderão, conforme a portaria, dizer em voz alta o nome de registro da pessoa nas abordagens, atendimento primário, registro de boletins de ocorrência ou quaisquer outras ações de segurança.

As ações, conforme afirma a portaria, foram criadas levando em consideração ser de "fundamental importância estabelecer protocolos de proteção social com ações voltadas à superação da desinformação e do preconceito, criando estratégias de respeito a diversidade sexual e igualdade de gêneros".

Confira o texto na íntegra da portaria clicando aqui:

Medida é considerada vitória por movimento feminista

A portaria foi publicada no DOE após uma reunião, ocorrida na segunda-feira, 27, entre o titular da SSPDS e integrantes do Fórum Cearense de Mulheres (FCM), que, desde 2018, defendiam que mortes de mulheres deveriam ser tratadas primeiramente como feminicídios. A advogada Rose Marques, militante do FCM, afirma que a medida é importante por causa da subnotificação de feminicídios. Estudo do Fórum, apresentado à SSPDS na segunda, aponta que, em 2019 e 2020, ocorreram, pelo menos, 208 feminicídios, enquanto a SSPDS computou apenas 58.

“Ainda que os casos, uma vez encaminhados ao sistema de justiça, sejam catalogados, após a sentença penal condenatória (como não feminicídios), a forma como essas informações eram organizadas traziam muita invisibilidade”, diz Rose Marques. Outro avanço, pontuou a advogada, é a indicação dos transfeminicídios. “Da mesma forma que nós não temos a indicação adequada dos pertencimento étnico-racial das vítimas de violência letais, nós não temos dados especificamente sobre transfeminicídios”.

Violência contra grupos vulneráveis no Ceará em 2023

Neste ano, até o dia 20 de março, última atualização disponibilizada pela SSPDS, 53 mulheres foram mortas neste ano no Estado. Desses crimes, nove foram identificados pela SSPDS como sendo feminicídio. No ano passado, 272 mulheres foram mortas no Estado, sendo 28 casos registrados como feminicídios.

Até o momento, não há levantamento público da SSPDS sobre assassinatos de homossexuais, bissexuais, pessoas trans e travestis. Levantamento de O POVO, porém, mostra que, neste ano, pelo menos, seis pessoas trans foram mortas no Estado. Confira:

8 de fevereiro — Vítima identificada apenas como Lelê — bairro Jardim das Oliveiras
Uma mulher trans de de 19 anos, identificada apenas como Lelê, foi encontrada morta no rio Cocó, altura do bairro Jardim das Oliveiras.

11 de fevereiro — Luara de Souza Machado, de 27 anos — bairro Siqueira
A vítima foi morta após ser esfaqueada em um terreno localizado ao lado de um motel, onde veio a óbito após tentar pedir socorro. Em 14 de março, um homem identificado como Gilvan Almeida Barbosa, foi preso temporariamente pelo crime. Um outro suspeito também foi identificado e é procurado.

18 de fevereiro — Vítima identificada apenas como Mirela, de 27 anos — bairro Floresta
A vítima, identificada apenas como Mirela, de 27 anos, foi morta após ser agredida a pauladas e pedradas por pessoas não identificadas que invadiram a casa dela e passaram a desferir os golpes.

8 de março — Renna Rodrigues, de 37 anos — bairro Praia de Iracema

O corpo de Renna Rodrigues foi encontrado boiando na Praia de Iracema, próximo à faixa de areia. Conforme a SSPDS, a vítima foi morta a golpes de arma branca.

11 de março — Vítima identificada como Caju, de 36 anos — Camocim (Litoral Norte do Estado)

Caju, como foi identificada, foi morta a facadas após uma discussão, conforme divulgou a SSPDS. Logo após o crime, o suspeito, Josiel Pereira dos Santos, de 31 anos, foi preso em flagrante. No inquérito que investiga o caso, uma testemunha afirmou que o crime foi premeditado em decorrência de dívidas contraídas por Josiel. As investigações prosseguem visando coletar mais provas.

30 de março — Vítima ainda não identificada — bairro Cidade dos Funcionários
Uma travesti ainda não identificada foi encontrada morta em um córrego que corta a comunidade Vila Cazumba. Nenhum suspeito do crime foi preso até o momento e o caso é investigado pela 7ª Delegacia do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP).

Atualizado as 19h13min

 

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