Gilberto Braga queria "superar fracasso" de "Babilônia", diz colaborador

João Ximenes Braga, que trabalhou com Gilberto Braga em vários projetos, revelou em depoimento ao blog de Cristina Padiglione a mágoa do autor com a Globo e projetos que ficaram inacabados

"O fracasso artístico e de audiência de 'Babilônia' não pode ser atribuído a Gilberto e sim à intervenção mal intencionada que destruiu completamente a espinha dorsal da novela". Foi com palavras diretas que o autor João Ximenes Braga fez revelações sobre a última trama escrita por Gilberto Braga, falecido no último dia 26. Parceiro do novelista em obras como "Paraíso Tropical", João cedeu depoimento ao blog TelePadi, da jornalista Cristina Padiglione, no qual aborda a luta de Gilberto por tentar "superar esse fracasso" com novos projetos, que acabaram cancelados pela Globo.

"Babilônia" foi exibida entre março e agosto de 2015, assinada por Gilberto, João e Ricardo Linhares. Protagonizada por Gloria Pires, Camila Pitanga e Adriana Esteves, a novela ficou marcada pelo casal formado por Estela e Teresa, vividas por Fernanda Montenegro e Nathalia Timberg.

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'Babilônia' teve resultados negativos históricos de audiência para uma novela das nove, levando a Globo a interferir no conteúdo da trama
'Babilônia' teve resultados negativos históricos de audiência para uma novela das nove, levando a Globo a interferir no conteúdo da trama (Foto: divulgação)

Já no primeiro capítulo, as personagens trocam um beijo, o que provocou reações contrárias de parlamentares evangélicos e lideranças católicas. Temas como prostituição e corrupção, abordados na trama, também foram rejeitados pelo público.

No depoimento de João Ximenes Braga, o autor lembra do primeiro encontro após o final da novela entre ele e Gilberto, que o recebeu em casa com saúde afetada e deprimido pelo fracasso de "Babilônia".

"Naquele dia (ele) me disse textualmente que não queria encerrar sua carreira com um fracasso e queria voltar a trabalhar logo para recuperar seu prestígio. Pode parecer irrelevante lembrar de um fracasso neste momento em que todos o homenageiam pelos sucessos. Mas superar esse fracasso era importante PARA ELE", relatou.

"Passaram-se seis anos e sinto a urgência de pôr os pingos nos is: o fracasso artístico e de audiência de 'Babilônia' não pode ser atribuído a Gilberto e sim à intervenção mal intencionada que destruiu completamente a espinha dorsal da novela. (...) Tenho zero esperança de que alguém venha a público assumir que o fracasso de 'Babilônia', novela que em suas duas primeiras semanas tinha problema de Ibope mas um prestígio junto à crítica além do habitual, mesmo comparado com outras novelas do Gilberto, seja responsabilidade da intervenção, e não dele e de sua equipe", segue João.

A menção à "intervenção", apesar de não ser explícita, possivelmente faz referência ao autor Silvio de Abreu, que à época era diretor de dramaturgia da Globo e chegou a reescrever e reeditar capítulos inteiros de "Babilônia".

De acordo com João Ximenes Braga, ele foi convocado por Gilberto Braga para dois projetos, no citado encontro em 2015: uma minissérie sobre Elis Regina e uma novela das onze que seria uma "revisita" à trama de "Brilhante", escrita por Gilberto em meio à ditadura.

"Ele queria revisitar 'Brilhante', que havia sido tão censurada pela ditadura militar que ficou incompreensível, e refazer a história como se deveria. A minissérie era sobre Elis Regina e, apesar de os seis capítulos entregues, nunca foi produzida porque o filme 'Elis' chegou primeiro. Já a novela das onze passou a ser muito mais que um simples remake de 'Brilhante' e ganhou outro título, 'Intolerância'. Teve seus 60 capítulos escritos e entregues, mas foi sucessivamente adiada e por fim, cancelada, pelas mesmas forças que destruíram 'Babilônia'", afirmou.

Um terceiro projeto capitaneado por Gilberto Braga - uma adaptação de "Feira das Vaidades", de William Makepeace Thackeray, para a faixa das 18 horas - chegou a ser escrito em parceria com Denise Bandeira, mas foi cancelado "porque diante da crise da pandemia a emissora não mais faria produções de época".

Finalmente, a Globo encomendou do novelista uma produção das nove, levando o autor a cogitar uma adaptação de "Intolerância" para o horário. "Ele não queria, de forma alguma, encerrar sua carreira com o fracasso de 'Babilônia'. Um fracasso que, repito e reforço, não pertencia a ele, mas ao interventor", reforçou João. O colaborador de Gilberto Braga terminou o relato honesto com um "apelo público" à Globo.

"A nova urgência que tenho é fazer um apelo público à TV Globo para que disponibilize os capítulos prontos de 'Intolerância'. Se possível, até os cerca de 80 capítulos que escrevemos de 'Babilônia' antes da intervenção, pois a 'Babilônia' que vocês viram não chega aos pés da 'Babilônia' que concebemos. (...) É o mínimo a fazer com a memória de Gilberto. E tenho certeza de que ele gostaria disso. Em seu último telefonema para mim, ele ainda insistia que que queria fazer um nova novela para não encerrar sua carreira com o fracasso que lhe foi imposto", finalizou.

Relembre "Babilônia"

Além disso, a trama também tocava em temas como corrupção, violência, prostituição e ambição, clássicos da teledramaturgia, mas que não foram bem recebidos na época. Na esteira da controvérsia, a audiência de "Babilônia" começou a enfraquecer e os 10 primeiros capítulos da obra tiveram o pior resultado de média em 50 anos, como noticiado à época por colunistas de TV como Ricardo Feltrin.

Em grupos de discussão com telespectadores, foi diagnosticado que a "maldade" das personagens era rejeitada pelo público. A emissora, então, passou a efetuar mudanças na novela, do logotipo a interferências no roteiro.

Cenas entre Fernanda Montenegro e Nathalia Timberg foram cortadas, bem como uma trama que previa um envolvimento amoroso entre os personagens de Marcos Pasquim e Marcello Mello (Ivan). A média geral de audiência de "Babilônia" foi de 25 pontos, configurando o pior resultado de uma novela das nove. 

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