O Agente Secreto: pré-estreia lota Cine Ceará e conquista plateia
"O Agente Secreto" tem pré-estreia especial lotada no 35º Cine Ceará e recebe aplausos de pé após sessão
15:13 | Set. 26, 2025
Em um Cineteatro São Luiz lotado, beirando a expectativa e ansiedade, foi exibido “O Agente Secreto” na última quarta-feira, 24.
O candidato a representar o Brasil no Oscar contou com um recado fofo do diretor Kleber Mendonça Filho, que não pode estar presente, mas se revelou feliz em poder exibir o longa-metragem no “irmão caçula” do Cinema São Luiz de Pernambuco (que é seis anos mais velho que o nosso São Luiz).
Não imaginava que meu primeiro contato com a filmografia de Kleber seria com uma de suas produções mais "hypadas", não havia visto nada do cineasta antes por puro descuido.
Na trama, Wagner Moura é um professor que retorna a Recife como fugitivo durante a ditadura civil-militar, em 1977. Encontrando refúgio em um prédio com vizinhos peculiares, ele tenta sair do País para um lugar seguro com seu filho.
Entre absurdos e metáforas, “O Agente Secreto” tece críticas ao regime
Diferente das narrativas convencionais que abordam o regime, “O Agente Secreto” se ambienta para a audiência com certa calma, apesar da atmosfera de suspense que pairar no ar de modo quase sutil.
O professor chega a Recife ainda durante o Carnaval, sob o nome de Marcelo, para se instalar no edifício Ofir, administrado por dona Sebastiana (Tânia Maria).
O roteiro é ousado em não ter pressa de revelar a verdadeira razão de Armando, verdadeira identidade do personagem de Wagner Moura, e seus vizinhos terem ido parar ali.
No entanto, a pergunta que realmente fica é se a gatinha que surge na sala do novo apartamento do docente realmente possui dois rostos ou se aquilo é fruto da imaginação de algum personagem.
A bichana é apenas um dos absurdos que Kleber traz na obra. A lenda da Perna Cabeluda também surge, como uma ameaça responsável por chutar transeuntes que ficam até tarde na rua.
Os elementos não só acrescentam uma dose de diversão à história, mas também quebram um pouco a dureza da realidade dos dias de regime.
Enquanto isso, uma perna aparece na boca de um tubarão, servindo uma das primeiras cenas de "gore" (violência explícita) do longa, além de apresentar uma metáfora.
Afinal, estão todos ali cercados por tubarões: quer sejam os policiais comandados pelo terrível delegado Euclides (Robério Diógenes) ou as ameaças que os fizeram se refugiar ali.
“O Agente Secreto” mostra o encontro de dissidências
Outro ponto interessante sobre a trama de Kleber, que também assina o roteiro, é a forma como ele consegue promover o encontro de corpos dissidentes organicamente, sem esvaziar as pautas e ilustrando como cada luta se conecta.
Desde o casal de angolanos Tereza Vitória (Isabel Zuáa) e Antonio (Licínio Januário) refugiados da Guerra Civil de Angola (1975 a 2002), Hans um judeu alfaiate que é atormentado pelo delegado Euclides e a própria dona Sebastiana que sobreviu ao fascismo italiano.
Leia também | A diversidade saiu de moda em Hollywood?
É interessante porque mostra como a ditadura se localiza em relação à geopolítica da época. Eram os tempos de Guerra Fria, com conflitos diversos em países afetados pela briga entre Estados Unidos e União Soviética.
Parece algo sem importância. Mas, para o espectador médio, pode ser difícil conectar os acontecimentos históricos. Visto que, ainda há quem afirme que não houve ditadura.
“O Agente Secreto” é o representante ideal do Brasil no Oscar
O filme protagonizado por Wagner Moura prova porque é a escolha ideal para representar o Brasil no Oscar. Além de falar de uma dor latente que foi o regime em tempos que pedem anistia para golpistas, “O Agente Secreto” não tem medo de ser uma ficção.
Explico: o filme brinca com horror e comédia para falar de algo sério e traz até mesmo elementos fantásticos, beirando quase uma ficção especulativa histórica para falar de algo relevante e sério.
Poucos cineastas têm coragem de fazer isso. Recentemente, talvez só Ryan Coogler que usou vampiros para denunciar racismo e apropriação cultural com “Pecadores”.
A fotografia de Evgenia Alexandrova é uma excelente aliada com seus planos gerais que ambientam a audiência em Recife e planos sequência tensos dignos de boas cenas de ação. A trilha sonora também acompanha o tom presente no enredo, com sucessos da época.
O elenco por si só é merecedor de todas as premiações possíveis. Wagner Moura está impecável ao incorporar alguém calmo até demais para quem está ameaçado de morte. Alice Carvalho também brilha em seus poucos minutos em cena, uma coisa meio Zendaya no primeiro “Duna”.
Mas quem brilha mesmo é Tânia Maria, a dona Sebastiana, que rouba os holofotes em todos os momentos em que aparece. Responsável pelo alívio cômico do enredo, seus diálogos rendem risada certa.
O cearense Robério Diógenes é outro destaque como delegado Euclides, mostrando um dos piores tipos de ser humano e as atrocidades que ele é capaz de realizar.
Embora tenha um final abrupto, principalmente devido às idas e vindas no tempo que parecem cortes secos e que deixam a história um tanto anticlimática, “O Agente Secreto” é uma ficção que deixa quem assiste com sede por mais.
O longa chega em 6 de novembro em todos os cinemas.