Mês da Consciência Negra: livros e autores para além do óbvio

Mês da Consciência Negra: livros e autores para além do óbvio

Vida&Arte traz lista de obras escritas por pessoas negras que fogem de enredos focados na dor. Um convite para descobrir novas leituras no mês da Consciência Negra
Atualizado às Autor Eduarda Porfírio Tipo Notícia

Em novembro, as redes sociais são banhadas de listas várias com indicações de obras com autoria negra. O problema é que a maioria dessas produções traz narrativas focadas no sofrimento. Além disso, algumas autorias são repetidas ano após ano, sem diversificar os nomes e os gêneros de obras.

Falando especificamente de livros, por exemplo, escritoras como Carolina Maria de Jesus, Conceição Evaristo, Toni Morrison e bell hooks aparecem com frequência quando o assunto é autoria negra.

Esse movimento acontece, segundo a doutora em Literatura pela Universidade de Brasília (UnB), Anne Quiangala, devido a uma demanda de mercado. “Outras coisas estão relacionadas a como o mercado também vai criando modismo”, explica a acadêmica.

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“As grandes listas em jornais, em revistas, o que os intelectuais estão lendo, enfim, essa questão das premiações, tudo isso vai motivando esse burburinho, esse modismo e essa tendência mesmo das pessoas quererem se sentir confortáveis sabendo sobre os assuntos que estão em alta”, explica Anne.

A escritora Kinaya Black, residente no Sertão Central do Ceará, salienta que a produção literária de autoria negra é vista “quase que como uma literatura de nicho” na qual os consumidores tratam como um termo guarda-chuva para obras distintas - estabelecendo um "padrão" do que deve conter em um livro escrito por uma pessoa preta.

 

“Me parece muito que os leitores possuem um preconceito definido sobre escritores negros, como se associassem qualquer livro escrito por pessoa negra com história, sociedade, política e isso afasta a ideia de ser uma ficção e faz eles pensarem que o livro é chato”, elucida Kinaya, que cursou mestrado em Letras pela Universidade Federal do Ceará (UFC).

Apesar disso, ambas as pesquisadoras não veem problema na repetição de nomes nas listas de indicação. Kinaya defende que, embora esses autores já sejam conhecidos dos leitores e da literatura produzida por pessoas pretas, “ainda não são vistos como suficientes para outras esferas da literatura e do mercado”.

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“Um exemplo disso é o fato de a própria Conceição [Evaristo] não ter ainda uma cadeira na Academia Brasileira de Letras. Uma academia criada por um homem negro, inclusive, Machado de Assis, que é facilmente o maior escritor brasileiro e que até uns anos atrás não se falava sobre a cor de sua pele”, cita Kinaya, que também é produtora cultural e criadora de conteúdo digital no perfil @afrofuturistaceraense.

Anne percebe que essa repetição é um modo de questionar a temporalidade das obras, visto que algumas foram esquecidas após a publicação e rememoradas anos depois.

“Porque se formos pensar nesse estudo da literatura brasileira, temos essas obras contemporâneas, por exemplo, o 'Quarto de despejo' da Maria Carolina Maria de Jesus, que foi publicado inicialmente na década de 1960 e é um texto ficou não publicado durante muito tempo”, destaca a pesquisadora capixaba.

A escritora cearense Kinaya Black argumenta, entretanto, que trazer listas com o mesmos nomes é também um modo de abrir portas para novos escritores: “Como uma pessoa que estudou muito mais a literatura negra estadunidense que a literatura negra brasileira, acho importante que possamos repetir nossos autores relevantes, pois acredito que isso pode abrir portas para outros autores. Se um de nós quebrar a bolha, outros de nós podem sair pelo buraco que se criou”.

Quando o foco é somente o sofrimento

A principal problemática das listas de indicações é a presença de obras focadas em narrativas de sofrimento. “Ponciá Vicêncio” (2003), primeiro romance de Conceição Evaristo, traz uma história dolorosa de busca por identidade e pertencimento.

Anne Quiangala elucida que a maior presença desse tipo de enredo em listas de indicações acaba apontando para um tipo de literatura de autoria negra que é “vendável”.

“Que tipo de imagem do negro é do interesse da elite que seja reiterada? Por que que histórias de libertação, histórias que não tenham violência gráfica, por que que essas histórias são menos consideradas?”, questiona a também criadora de conteúdo no perfil @pretaenerd.

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Para a pesquisadora, a questão maior não é a existência de narrativas doloridas, mas limitar a literatura de autoria negra a somente esse tipo de obra.

“Quando a gente se restringe a um tipo específico de literatura que conecta pessoas negras a experiências dolorosas, as experiências de violação, de direitos, a gente também tá reforçando ideias específicas sobre a população negra”, diz Anne

A doutora em Literatura argumenta que, ao insistir nesse tipo de representação, o enredo limita “o que uma pessoa negra pode ser”.

Livros com autoria e protagonismo negro para você conhecer:

1. Oceanïc - Cosmópolis vol. 1 (Waldson Souza)

Na obra do brasiliense Waldson Souza, a humanidade vive nas costas dos gigantes. Em uma dessas terras, o casal Rafael e Jonas passa a ser encarado como ameaça pelo exército por algo que aconteceu no passado de um deles.

Ed. Dame Blanche

183 pág.

Quanto: R$7,90

2. Raybearer - O dom do Raio (Jordan Ifueko)

O maior desejo de Tarisai é o aconchego de uma família. Criada em isolamento por sua mãe, chamada de A Senhora, a criança é enviada aos 11anos para a capital do império Global Aritsar.

O objetivo é que a menina seja escolhida como um dos membros do Conselho do Príncipe Herdeiro Ekundayo. Caso entre para o Conselho, ela se unirá com os membros através do Raio, um vínculo mais profundo que o sangue.

Porém, A Senhora tem outros planos e decide usar Tarisai para torná-los realidade no livro da nigeriana-estadunidense Jordan Ifueko.

Ed. Desrotina

456 pág.

Quanto: R$69,90

3. A diplomata (GG Diniz)

Feitosa é uma das poucas sobreviventes na Terra. Após os super-ricos deixarem o planeta, os que ficaram sobrevivem do lixo. As mulheres restantes passaram a ser sequestradas para serem levadas até Éden - a nova colônia lunar. Feitosa é a próxima.

No meio do caminho ela conhecerá Matilde, uma foragida, e Eunir'ra, uma agente em missão diplomática. As três deverão se unir para salvar a vida na Terra. A obra é da autora cearense G.G Diniz.

Ed. Plutão Livros

123 pág.

Quanto: R$ 19,90

4. O serviço de entregas monstruosas (Jim Anotsu)

O mineiro Jim Anotsu traz um universo onde dragões e bruxas co-existem em harmonia com a humanidade. Objetos mágicos poderosos são parte da rotina e por isso é preciso um serviço de confiança para transportá-los.

Para isso, existe o Serviço de Entregas Monstruosas que leva encomendas sobrenaturais a qualquer lugar de Belo Horizonte. O humano Gustavo e sua fada Strix, porém, sofrem uma tentativa de roubo em sua primeira entrega. A dupla não suspeitava que estava carregando uma valiosíssima encomenda: o último ovo de Dragão da Patagônia.

Ed. Intrinseca

364 pág.

Quanto: R$ 26,96

5. Joanna Mina (Luciany Aparecida)

Inspirada em Catarina Mina, uma mulher africana escravizada no Brasil que obteve alforria, a obra é a primeira peça publicada pela baiana Luciany Aparecida. A ficção acompanha Joanna Mina, desde sua infância no Benim até o momento de alforria, em que se torna posteriormente uma vendedora de tecidos.

Ed. PARALELO13S

Quanto: R$ 44,90


6. Eu conheço Uzomi (Kinaya Black)

Num futuro distópico em que as escolas são fechadas no Ceará, a professora Hadassa se vê obrigada a ir trabalhar numa fábrica. Com o tempo, ela percebe que os funcionários do estabelecimento passam a sumir e um deles é Uzomi, seu namorado. O livro é escrito pela cearense Kinaya Black.

 

Ed. Kitembo

80 pág.

Quanto: R$ 34,90

7. Trama Ancestral (Wilson Junior)

Na obra do cearense Wilson Junior, um homem negro acorda numa praia sem saber quem é, onde está ou de onde veio, no Brasil Colônia do século XVII. Ao sair em busca de alimentos e água, ele encontra Anansi, um deus aranha que lhe oferece barganha.


O rapaz terá que ajudar a Anansi a libertar seu povo que está sendo escravizado em uma fortaleza, como recompensa, a entidade devolverá suas memórias.

Ed. Cortez

192 pág.

Quanto: R$ 34,53

 

 8. Legado Selvagem (Larissa Cristal)

A princesa Aurora está a caminho de seu casamento quando é atacada pela ladra Isabela, que recebe a missão de assassinar a monarca. Mas, os planos de Isabela dão errado e as duas terminam presas na Floresta do Caos, onde terão que se unir para enfrentar terríveis criaturas mágicas.

Publicação Independente

84 pág.

Quanto: R$ 11,98

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