Empresários viram réus por vender oxigênio adulterado durante pandemia no Ceará

Empresários viram réus por vender oxigênio adulterado durante pandemia no Ceará

Investigações do MP revelaram que algumas empresas participaram de licitações para vender o produto modificado a unidades de saúde em Fortaleza e no Interior

A Justiça do Ceará, por meio da 11ª Vara Criminal de Fortaleza, aceitou na quinta-feira, 16, a denúncia contra 12 empresários de estabelecimentos acusados de ter adulterado oxigênio medicinal durante a pandemia da Covid-19. Denúncia do Ministério Público (MPCE) revelou que os produtos alterados chegaram a ser vendidos para clínicas e hospitais públicos e privados na Capital e no Interior do Estado. 

A investigação, conduzida pelo Grupo de Atuação Especial de Combate às Organizações Criminosas (Gaeco), do órgão ministerial, teve início no primeiro ano da pandemia após informações anônimas. 

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Na época, foram apontadas as práticas criminosas de adulteração e comercialização de oxigênio industrial para uso medicinal. A denúncia do órgão apontou ainda que o repasse do oxigênio adulterado das empresas que comercializavam era, em muitos casos, feito de forma legal com a finalidade do uso medicinal. De acordo com apuração, vendas foram realizadas principalmente em 2020. 

Conforme o promotor e integrante do Gaeco, Patrick Oliveira, algumas empresas dos proprietários citados na denúncia chegaram a participar de licitações, processo administrativo de uso da administração pública, como prefeituras e governos, usado para compra de bens, contratação de serviços ou execução de obras.

“Era uma compra e venda normal, como se tivesse comprando efetivamente um oxigênio medicinal. Participavam de licitações para oferecer o produto, inclusive, uma delas chegou a oferecer uma marca como se ela tivesse autorizado para oferecer gás medicinal, mas não estava”, disse o promotor.

Ainda segundo o promotor, entre dois a três hospitais públicos clínicas realizaram a compra dos oxigênios adulterados. As unidades, no entanto, não foram divulgadas pelo MP. A investigação não identificou nenhum óbito de pacientes que vieram a inalar os oxigênios adulterados durante a pandemia, tanto em hospitais públicos quanto em clínicas.

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No início da investigação, após a reunião de provas, o Gaeco deflagrou em novembro de 2020, a operação “Oxida”, que buscou desarticular o esquema. À época, foram expedidos 11 mandados de busca e apreensão, que foram cumpridos nas cidades de Barbalha, Caucaia, Eusébio, Fortaleza, Jaguaribe e Juazeiro do Norte.

Entre os alvos, 11 empresas foram citadas, sendo que oito foram, de fato, apontadas pelo órgão em práticas criminosas de adulteração e comercialização. Outras três foram incluídas ao longo da investigação até chegar no recebimento da denúncia pela Justiça.

Na época, um empresário, que não foi inserido na denúncia, foi preso em flagrante por adulterar oxigênio. “Ele tava com cilindros de oxigênio da cor verde, que são específicos para o envazamento de oxigênio medicinal, só que o tanque que ele utilizava para armazenar o oxigênio era um tanque de oxigênio industrial e não um tanque de oxigênio medicinal”, disse Patrick

Além da prisão, foram apreendidos cilindros e materiais de falsificação, como lacres e adesivos em algumas empresas. O promotor do MP afirmou que os suspeitos estavam fazendo um “verdadeiro crime". O MP, no entanto, não confirmou nenhum óbito após uso do oxigênio adulterado.

Conforme Patrick, as investigações revelaram a existência de pelo menos duas empresas clandestinas que adulteravam oxigênio. Uma delas era localizada na região do Cariri. Inicialmente, foram criadas para comercializar gases industriais, mas, posteriormente, começaram a adulterar os produtos com objetivo de lucrar mais.

Outras empresas chegaram a adulterar nos próprios estabelecimentos. Outros locais adquiriram uma pequena quantidade de oxigênio medicinal sem modificação para justificar a entrada e saída desse tipo de produto.

No entanto, os valores da entrada eram diferentes dos valores da saída do material. Dentro da empresa eles eram adulterados e vendidos em maior quantidade. Com objetivo de burlar fiscalização, alguns dos estabelecimentos teriam utilizado lacres falsos de empresas com autorização para o comércio.

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O órgão confirmou as ações criminosas no primeiro ano da pandemia. Na operação, à época, nenhuma empresa foi fechada a pedido do órgão, apenas foi realizado o cumprimento de busca e apreensão.

O promotor do MP disse que a investigação não chegou a confirmar se, depois da operação Oxida, as empresas chegaram a continuar com ações criminosas. Atualmente, nenhum dos 12 empresários estão presos, apenas se tornaram réus. 

Os crimes previstos nas ações criminosas são de falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais, com penas entre dez e 15 anos de prisão.

Confira as empresas que tiveram os proprietários enunciados:

  • Clodoaldo Paulo Sousa ME
  • Raimundo Barros de Oliveira ME (Fortgas)
  • A&G Gases Comércio de Ferragens LTDA
  • Crajubar Gases LTDA
  • Oxigênio Cariri LTDA
  • C. A. Lima Serviços LTDA
  • F.O. Lima Guedes (Center Gases)
  • Líder Gases (Oxigênio Padre Cícero Eireli).

O POVO tentou contato, por e-mail, mensagens no WhatsApp e ligações telefônicas, com oito empresas identificadas na denúncia do MP com objetivo de saber o posicionamento dos empresários, agora réus.

Por WhatsApp, a dona da empresa Líder Gases informou que na época da pandemia quem respondia pela firma era o seu ex-marido, que atualmente seria dono da empresa Crajubar Gases, outro estabelecimento que está sendo investigado por comercializar oxigênio adulterado. Ela afirma ter assumido os negócios somente após a separação do casal e diz não ter contato com o ex-companheiro.

Em nota, a assessoria jurídica da Crajubar Gases informou que ainda não havia sido "notificada do recebimento da denúncia pelo Juízo competente" e destacou que "no momento processual oportuno irá apresentar todos elementos probatórios que elucidarão o caso e demonstrarão a sua completa inocência".

Defesa também destacou que a empresa tem "mais de 10 anos de atividade ilibada no mercado de distribuição de gases industriais e medicinais". "A Crajubar Gases reafirma o seu compromisso com a legalidade e as boas práticas empresariais, colocando-se a disposição das autoridades", frisa.

O POVO ligou para a Clodoaldo Paulo Sousa ME, onde uma mulher atendeu se identificando como funcionária da empresa. Ao saber do motivo da ligação, ela disse que o proprietário não se encontrava no local e que não estava autorizada a passar o contato dele. Ela anotou o número da reportagem para que o mesmo retornasse quando voltasse, mas até o fechamento da matéria não houve retorno. As outras cinco empresas procuradas também não retornaram a tempo da publicação. 

 

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