Ceará registra 20 casos de stalking desde sanção de lei; entenda o crime

O crime tem pena prevista de reclusão de seis meses a dois anos, além de multa. Delegado de Fortaleza explica como proceder em caso de stalking e analisa esforços da força policial para enfrentamento do crime

Em vigor no País desde 31 de março deste ano, a lei nº 14.132 criminaliza a conduta do “stalking”, que em tradução livre significa perseguição. Incluído no artigo 147-A do Código Penal, o ato de “perseguir alguém de qualquer forma invadindo ou perturbando sua esfera de liberdade ou privacidade” é crime com pena prevista de reclusão de seis meses a dois anos, além de multa. No Ceará, 20 casos do tipo foram registrados desde o último mês de abril.

Titular do 5º Distrito Policial de Fortaleza, o delegado Valdir Passos afirma que a penalidade pode ser ampliada dependo das circunstâncias do crime, como número de criminosos envolvidos ou idade e gênero das vítimas. Em entrevista à Rádio O POVO/CBN, ele revela que, caso aconteça em ambiente virtual, o crime pode ser comprovado com uma ata notarial, comprovada em cartório, além de contato dos investigadores com plataformas.

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Segundo o delegado, o melhor a se fazer caso seja vítima de importunação não é somente capturar um “print” da tela do celular, pois estes podem ser manipulados, e sim armazenar a URL da página que está sendo acessada (em caso de acesso por navegadores). Com este dado, a polícia pode contatar as plataformas e solicitar as informações e atividades ocorridas em determinados espaços virtuais, conta Valdir.

“Com algumas dessas informações, a gente consegue descobrir o que a gente necessita de mais urgente para individualizar e chegar à autoria desse caso. Essas ferramentas são primordiais. E você obviamente precisa registrar o Boletim de Ocorrência na delegacia mais próxima”, explica ele. O delegado orienta a não excluir mensagens ou bloquear stalkers, aqueles que perseguem.

Na visão de Valdir, a maioria dos crimes de stalking, principalmente aqueles cometidos na Internet, tem conotação sexual e atinge mulheres, “por mais que a lei tenha abrangido tudo”. Segundo ele, os agentes de delegacias distritais estão recebendo formações sobre crimes cibernéticos para melhor acolher vítimas do âmbito. A criação da Delegacia de Repressão aos Crimes Cibernéticos foi sancionada pelo governo estadual em setembro de 2020, mas não entrou em atividade até o momento.

O delegado avalia que a recente criminalização do stalking precisa ser amplamente divulgada para que as vítimas dessa conduta possam realizar denúncias. Desde a sanção da lei, 19 mulheres e um homem, com idades entre 18 e 64 anos, buscaram a Polícia Civil do Ceará e registraram ocorrência de stalking.

Vítimas da perseguição

Passível de diversos desdobramentos criminosos, no stalking os suspeitos geralmente projetam controle sobre a vítima, desenvolvendo mecanismos como obtenção de fotos de onde a pessoa está ou relatos de situações íntimas. “Algumas vezes, o/a stalker adiciona ou entra em contato com amigos, familiares, vizinhos e colegas de trabalho do seu alvo, com o intuito de ter informações sobre tudo o que a pessoa faz”, explica a SaferNet, organização não governamental dedicada à defesa dos direitos humanos na Internet.

Em entrevista à Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS), a psicóloga Vanessa Lúcia, do Departamento de Assistência Médica e Psicossocial (Damps) da Polícia Civil, explica que “muitas vezes esses perseguidores são pessoas que fizeram parte do convívio da vítima, como ex-companheiros ou colegas de trabalho, por exemplo. Entretanto, os ‘stalkers’ também podem escolher suas vítimas aleatoriamente”.

Também psicóloga do Damps, Marleide de Oliveira frisa a importância de buscar ajuda das autoridades: “No primeiro sinal de abuso, se você tentou barrar e não conseguiu, não espere que chegue o maior período de tempo vivendo nessa situação. Não tenha medo, pois isso acaba alimentando a pessoa que está lhe perseguindo, pois percebe que você está com receio”.

“Se a situação interferir no seu dia a dia, busque auxílio o mais rápido possível. Dessa forma, poderemos orientar e iniciar um tratamento juntando a psicoterapia com a psiquiatria medicamentosa. Isso não significa que esse trauma vá passar de imediato, pois o tratamento é paliativo, mas é um suporte emocional muito importante que estará sendo oferecido para ela”, orienta.

“Eu não dormia à noite”

Uma das vítimas que denunciou sua perseguição concedeu entrevista à SSPDS, relatando os traumas resultantes dos sete meses em que foi perseguida e importunada por um homem que nunca viu. A partir de fevereiro deste ano, a jovem, de 19 anos, precisou mudar sua rotina de vida, inclusive sair do emprego, para tentar fugir das investidas do stalker.

Segundo as investigações da PC-CE, o criminoso escolheu a vítima após observá-la num ônibus. Ao perceber que ela estava fardada, o homem compareceu ao seu local de trabalho e conseguiu seu telefone. Ele a abordou, virtualmente, com uma oferta de trabalho, mas logo passou a proferir cantadas e comentários de cunho sexual, além de enviar fotos da recepção do trabalho e do deslocamento da jovem até sua casa.

“Era desesperador. Ele falava da minha roupa, do meu corpo, do meu sorriso. Eu não confiava em ninguém. Passei a sentir muito medo”, relatou a mulher. “O que mais me afetou nisso tudo foi a questão da minha paz. Eu não conseguia ter tranquilidade, eu não dormia à noite, não podia mais sair sozinha. Até em casa eu já não conseguia mais ficar sozinha. Qualquer pessoa que se aproximasse de mim eu achava que poderia ser ele”.

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