O que é NFT? Entenda o mercado de obras de arte digitais

Objeto virtual com identidade, autenticidade e rastreabilidade que se pretende inviolável transformou o mundo das artes nos últimos meses

Uma revolução em três letras: "NFT". O "token não fungível" — objeto virtual com identidade, autenticidade e rastreabilidade que se pretende incontestável e inviolável graças à tecnologia conhecida como "blockchain" — transformou o mundo das artes nos últimos meses. A venda de obras de arte digitais movimenta no mercado cifras milionárias. No último mês de março, a exemplo, o indiano Vignesh Sundaresan comprou o trabalho "Everydays: the First 5.000 Days", uma colagem de 5.000 imagens digitais do artista americano Beeple, por 69,3 milhões de dólares. Mas, muito além dos investimentos e lucros, a NFT está construindo relações de proximidade entre artistas e consumidores de arte ao estabelecer uma remuneração direta a quem vende e um outro conceito de propriedade a quem compra.

Na web, "token" é o nome do registro de um ativo em formato virtual. Já "não fungíveis" seriam não perecíveis — no caso de obras artísticas, anticomputadores sentimentais entre moedas digitais, são garantias de originalidade, itens que não podem ser trocados. Desenhos, animações, vídeos, fotos, músicas e até tweets: tudo pode ser valorado no mundo do NFT. Os nomes dos proprietários que compram NFT e as obras adquiridas ficam registrados no blockchain, um livro contábil que faz o registro de transações de criptomoedas. Mas quem compra obras digitais obtém, sobretudo, conceitos.

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As categorias de arte digital são múltiplas: software art, net-art, glitch-art, machine learning, arte cibernética, arte algorítmica, arte em código, arte generativa, escultura digital, animação 2D e 3D, game-art, hologramas, performance transmidiática, arte hacker, boomerang e até GIF animado e meme, entre muitas outras linguagens. Há oito anos, os curadores Julia Borges Araña e Guilherme Brandão criaram a plataforma brasileira Homeostasis Lab, iniciativa voltada para o mapeamento, catalogação, inscrição da arte digital e fomento à pesquisa.

"Arte digital, para mim, é a arte que tem o digital ou na sua concepção, ou no seu desenvolvimento, ou na sua realização. É a arte que se utiliza de tecnologias eletrônicas para ser executada ou que reflete sobre sobre esse mundo digital", explica a curadora Julia Araña. "Muita gente tem dúvida: 'O cordel que eu faço é arte digital?'. Se o cordel foi já concebido pensando num formato virtual e não só colocado no YouTube, por exemplo, é um trabalho de arte digital. Acredito que é preciso ter uma concepção com a tecnologia, não só na exibição".

Segundo Julia, a participação dos artistas brasileiros no cenário das artes digitais é diversa e contempla inúmeras modalidades imagináveis. "O brasileiro é muito criativo e muitos já estão conectados também com essa tendência da criptoarte, que é o tão falado NFT. Recentemente, iniciativas em arte imersiva, com realidade virtual, foram premiadas em festivais internacionais", destaca a fundadora da Homeostasis Lab. Símbolos do tradicional mercado de arte, grandes casas de leilão como Sotheby's e Christie's já enveredaram pelo virtual, mas os valores das obras digitais também podem ser acessíveis a qualquer interessado — e, assim, nascem novos colecionadores.

"O mercado do colecionismo está mudando e eu acho que o mercado da galeria também vai se expandir nesse sentido. A arte digital é super colecionável, mesmo antes desse boom do NFT. Agora, há obras que são super baratas para você comprar e colecionar nessas plataformas de marketplace e elas começaram a virar uma coisa meio cultura da celebridade. De repente, milhões de pessoas que nem eram colecionadoras estão colecionando", pontua Julia. A era digital também transforma o papel dos curadores e galeristas: "O galerista da bitforms gallery, criada em 2001 nos Estados Unidos, comentou que a galeria em si não vendeu nenhum NFT, mas que os artistas da galeria estão vendendo diretamente. 'Nesse processo, o que acontece com o galerista?', indagaram. Ele afirmou que o galerista ou o crítico de arte vão ressurgir nesse processo, porque as pessoas vão querer comprar obras que têm qualidade e, para isso, é preciso conhecer todo o background desse artista", complementa.

Juno B., artista multimídia cearense, integra o acervo da plataforma Homeostasis Lab. "Comecei a me interessar pelo digital na faculdade de Comunicação Social, um pouco nesse diálogo entre foto e vídeo. Mas o meu trabalho começou a se desenvolver quando eu vim morar em São Paulo e passei a entender, dialogar e conhecer pessoas da direção de arte e de projetos gráficos. Um dos últimos trabalhos que eu fiz foi com o Museu Itamar Assumpção, um museu virtual, e trabalhei na parte de concepção, coordenação da área de design e direção de arte", destaca.

"Pensar no virtual é também uma consequência do tempo. É um meio, é um lugar que se abriu para a gente poder trabalhar", defende Juno. "Mas é um espaço que ainda segue essas normas institucionais. Eu acho que o que está mudando é uma necessidade — que também tem relação com o mercado — que é a necessidade de dar mais abertura para pessoas que querem se expressar".

Para Juno, é fundamental ressaltar a autonomia de artistas que trabalham com o digital — como Glamourings, Garu e Paula Trojany. "Para mim, trabalhar como trabalho é ir contra essas construções que foram impostas por um homem branco cisgênero, que já demarcou demais o que pode e quem pode ser. É uma discussão sobre o tempo, sobre conectar tempos — presente, noções de como vislumbrar o futuro e manter ética sobre o que já passou".

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Arte digital Homeostasis Lab Juno B.

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