Vereador Ronivaldo completa 2 meses preso e defesa quer provar que não houve intenção de matar

Acusado de tentativa de feminicídio, o parlamentar está detido no presídio Irmã Imelda Lima Pontes, em Aquiraz, e o processo se encontra em fase de coleta de provas e concessão do direito de contraditório e ampla defesa

O vereador de Fortaleza, Ronivaldo Maia (PT), completou dois meses preso e quer provar que não teve intenção de cometer feminicídio. A defesa tenta ainda que ele possa sair do regime fechado e responder em liberdade.

No dia 29 de novembro, o petista foi preso em flagrante pela Polícia Militar após atropelar, depois de discussão, uma mulher no bairro Granja Portugal. Ele está detido em regime fechado no presídio Irmã Imelda Lima Pontes, em Aquiraz. Preso provisoriamente, o parlamentar entrou com pedido de prisão especial alegando ser vereador de Fortaleza, ter diploma de ensino superior e condição de saúde especial – em decorrência de diabetes. No dia 14 de dezembro, o Ministério Público do Ceará (MPCE) se manifestou pelo deferimento do pedido de prisão especial feito uma semana antes pelo vereador.

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Apesar de críticas ao modelo, o promotor Marcus Renan Palácio disse que o parlamentar possuía direito ao benefício segundo a legislação em vigor. Com a decisão, a defesa do petista conseguiu que o comandante do Corpo de Bombeiros do Ceará (CBMCE), Ronaldo Roque, disponibilizasse para o vereador local para que ele ficasse detido na 4ª Companhia do 1º Batalhão dos Bombeiros, localizada no bairro José Walter.

Porém, no dia 19 de janeiro, o juiz Antônio Edilberto Oliveira Lima, da 1ª Vara do Júri de Fortaleza, negou a transferência de Ronivaldo para o quartel do CBMCE. Ele considerou que o parlamentar “já se encontra em cela especial” e com devida assistência médica no presídio onde está recolhido.

“No mais, no tocante ao pedido de transferência do acusado para prisão especial constante às fls. 104/106, o mesmo não merece prosperar, haja vista que o acusado já se encontra em cela especial na unidade prisional onde está recolhido, sendo-lhe garantida, ainda a devida assistência médica”, diz a decisão, assinada por Edilberto, magistrado responsável por receber a denúncia do MPCE no dia 8 de dezembro, o que levou o parlamentar à condição de réu por tentativa de feminicídio.

A questão, no entanto, continua sendo refutada pela defesa do parlamentar. Para o advogado Hélio Leitão, a prisão em regime fechado não se faz necessária, pois o vereador reúne todas as condições para responder ao processo em liberdade. “A defesa está trabalhando nisso, no sentido da liberação dele o quanto antes”, diz. Leitão diz ter convicção de que o ambiente onde Ronivaldo se mantém recolhido “não faz jus à sua condição de preso”.

“Não só em razão de ser detentor de diploma, mas também em razão da qualidade de vereador e por razões de saúde, ele tem diabetes em estado avançado, e a sua condição exige a aplicação de medicamento duas vezes ao dia. Essas razões, somadas, apontam que o recolhimento em uma unidade militar, que já se dispõe a acolhê-lo, seria a forma mais adequada”, explica o advogado o petista.

Denúncia

O POVO teve acesso à denúncia acatada pelo Judiciário em dezembro de 2021. O vereador é acusado por homicídio qualificado, crime tentado e violência doméstica contra a mulher. A denúncia atualmente se encontra em julgamento pela 1ª Vara do Júri de Fortaleza, durante a fase de instrução processual. A etapa inclui a coleta de provas e a concessão do direito de contraditório e ampla defesa ao acusado.

Segundo o advogado de Ronivaldo, Hélio Leitão, o objetivo da defesa é provar, quando provocado pela Justiça, que não houve qualquer dolo ou intenção de matar a vítima.

“A expectativa da defesa é que seja demonstrado ao longo da instrução processual, de forma induvidosa, que não houve qualquer dolo de matar nesse episódio, longe disso. Temos certeza de que isso ficará cabalmente demonstrado ao longo do processo”, diz o advogado.

A vítima é uma mulher de 36 anos. Após acelerar o veículo contra ela, o vereador a arrastou por aproximadamente três casas. Ela teria relacionamento com o parlamentar e ele teria ficado irritado por ela se recusar a pagar conta de R$ 1,6 mil para ele.

No relatório do inquérito, a delegada Manuela Lima da Costa registra que a vítima, após a agressão, disse que não teria chamado a Polícia se algum dos vizinhos não tomasse a iniciativa. Conforme o relato da delegada, a vítima disse que, como o acusado de agressão é pessoa pública, ele teve medo que "respingasse" nela. Conforme a policial, a mulher disse que pretendia buscar auxílio médico e informar que foi atropelada por um desconhecido. A medida seria para evitar transtorno para ele própria, conforme relatou, e não para proteger Ronivaldo, segundo o relatório.

O vereador tirou licença por 120 dias. Metade do prazo já transcorreu. No lugar dele, exerce mandato o suplente Vicente Pinto (PT).

 

ANÁLISE

O político e as mulheres

Por Sara Oliveira

Dias antes de ser preso após tentar atropelar a mulher com quem mantinha um relacionamento, o vereador Ronivaldo Maia (PT) havia feito um discurso na Câmara Municipal de Fortaleza sobre o Dia Internacional de Combate à Violência contra as Mulheres. Ele disse: “Eu queria, ao reforçar, nessa data, o 25 de novembro, os muitos movimentos que de maneira organizada fazem essa luta, discutem a necessidade de aumentar o combate à eliminação dessa violência, que é uma chaga social".

O parlamentar de esquerda, preso há dois meses em uma cela para quem tem nível superior, trouxe em seu discurso dois pontos importantes — e infelizmente pouco tratados — da política brasileira: os movimentos de luta e as chagas sociais. Ronivaldo era um político até admirado por levar pautas de minorias ao plenário. Ele, assim como tantos outros, usou das lutas para ter destaque e estar inserido em um determinado contexto político.

O Fórum Cearense das Mulheres chegou a emitir nota afirmando que “O lugar mais importante que um homem pode ocupar nas trincheiras de luta pelo fim da violência contra as mulheres, é não a cometendo”. Na realidade, no cenário político de maioria masculina, brancos e com respaldo financeiro, temas como o direito de mulheres, movimentos de luta e chagas sociais muitas vezes são usurpados por quem, de verdade, não os têm como prioridade política. Ronivaldo Maia é exemplo disso. Os comentários machistas que alguns dos seus colegas parlamentares fizeram após o ocorrido também é.

E essa apropriação indevida das causas que tanto causam sofrimento torna ainda mais difícil a discussão séria dos temas. Impossibilita que políticas públicas sejam criadas e implementadas. Faz com que a estrutura política não cumpra seu papel. Na verdade, os homens dificilmente pensam nas mulheres. Homens políticos dificilmente se importam com as mulheres. O vereador Ronivaldo Maia fez muita política junto e usando o nome das mulheres, mas tenho minhas dúvidas se ele um dia se importou.

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