Morte de 14 soins no Parque do Cocó pode estar relacionada à contaminação por herpes

Até o momento, exames detectaram o vírus da herpes em dois dos 14 animais que morreram durante os últimos três meses

Entre os dias 4 de novembro de 2021 e 24 de janeiro de 2022, pelo menos 14 saguis que viviam no Parque do Cocó morreram, provavelmente, vítimas de uma contaminação pelo vírus da herpes. Atualmente, os corpos dos animais, popularmente conhecidos como soins, passam por uma investigação minuciosa.

O vírus da herpes é altamente difundido entre humanos e não costuma se manifestar com gravidade entre o grupo, entretanto, para animais como os saguis, a contaminação pode ser fatal.

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"Nos saguis, o vírus gera lesões neurológicas, lesões do sistema nervoso, além de lesões cutâneas e hepáticas bem graves, podendo generalizar e levar à morte do animal", explica o veterinário Daniel Viana, vice-presidente do Conselho Regional de Medicina Veterinária do Estado do Ceará, que investiga a situação registrada no Cocó.

De acordo com Viana, alguns dos animais que chegavam para a necrópsia apresentavam lesões e até rupturas de órgãos. O especialista relata que nem todos os soins foram analisados, pois alguns já estavam em estado avançado de putrefação.

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O veterinário explica, ainda, que o exame avalia todos os órgãos dos animais visualmente e, em seguida, é feita uma análise via microscópio para verificar as alterações que vão corroborar com o que foi visto durante o processo investigativo.

"A confirmação exata de herpes só foi feita em dois animais, por meio de um exame de detecção de proteínas do herpes no tecido. Isso não significa que os outros não tiveram. Com esses dois casos confirmados, o link de contaminação do humano para o animal já está feito", ressalta.

O veterinário Marcelo Jucá, vice-presidente do Instituto Pró-Silvestre, realizou o atendimento de alguns dos saguis encontrados no Parque. Ele comenta que o quadro clínico dos animais atendidos apresentava bastante semelhança.

"Quase todos chegavam com alterações neurológicas, alguns também apresentavam problemas de coordenação, o olhar perdido. Possuíam alterações evidentes. Desses 14, alguns também apresentavam lesões de boca", relata.

Jucá alerta que pelo fato de alguns animais já estavam em estado de putrefação, a situação pode ser pior do que o cenário apresentado. Alguns desses animais podem acabar não sendo localizados antes do processo de decomposição ser finalizado.

O veterinário explica que a situação é preocupante porque saguis não possuem grandes núcleos familiares, contendo, em média, nove membros por família. Pelas dimensões do Cocó, o especialista acredita que apenas quatro ou cinco famílias, no máximo, habitem a região do Parque.

"Temos que ter muito cuidado com a velocidade que isso acontece para conseguirmos trabalhar cada vez mais rápido, evitando novos problemas", alerta.

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A preocupação de Jucá é a mesma da advogada Karine Montenegro, diretora do Instituto Pró-Silvestre e membro da Comissão da OAB em Defesa dos Animais. Ela teme pela vida de toda a espécie que vive no local.

"É uma realidade que ainda não acabou, acredito que ainda vamos receber mais. Não há uma quantidade muito expressiva de saguis por lá. Se a média de uma família é de nove animais e temos apenas quatro famílias no parque, já morreu uma família e meia", desabafa.

Saúde dos animais 

Para o veterinário Daniel Viana, a imagem do animal como um objeto de entretenimento humano é bastante prejudicial. O especialista destaca a importância de se pensar em uma saúde única, um tripé formado por saúde humana, animal e ambiental.

"Esse é o grande problema, o animal está ali disponível, é dócil, amistoso e se você oferece a comida, ele vem. Não é só com o sagui que estamos preocupados, é um problema grave. Existe toda uma cadeia ecológica que é quebrada quando você retira esse animal dali", explica.

Os especialistas afirmam que é preciso agir com urgência. Medidas como a localização desses animais na mata são fundamentais para que se tenha dimensão dos problemas, além de ser uma possibilidade de salvar saguis não contaminados e iniciar os cuidados necessários com aqueles que já possuem o vírus.

Todo o trabalho clínico e investigativo realizado em prol dos saguis tem acontecido de forma voluntária. Inclusive, parte das amostras está sob análise de professores da Universidade de Brasília (UnB) e deverá ser concluída em até dez dias.

A advogada Karine Montenegro destaca que, além da atuação do Instituto Pró-Silvestre, o trabalho realizado tem contado com o apoio da Clínica Veterinária de Silvestres Bicho do Mato, do Laboratório Pathovet, do Conselho Regional de Medicina Veterinária (CRMV), da Secretaria do Meio Ambiente (Sema), da Unidade de Vigilância de Zoonoses (UVZ) e da Secretaria de Saúde do Estado do Ceará (Sesa).

O coordenador de Proteção e Defesa Animal (Coani), Jeová Costa, da Sema, explica que, atualmente, além de aguardar o recebimento dos outros laudos, a pasta está em processo de mobilização para realizar a captura e a coleta de sangue dos outros animais do Parque, para que se faça um mapeamento da saúde dos animais. A expectativa é que esse processo seja finalizado em até 50 dias.

Jeová alerta que a atual crise causada à saúde dos animais serve de alerta para os seres humanos redobrarem os cuidados com a preservação da fauna local. "A alimentação realizada pelo homem ao animal é carregada de patogenias que levam aos bichinhos as nossas doenças. Uma pessoa morde a fruta e depois oferece ao animal, a saliva humana pode conter vários vírus e bactérias, e esse contato com a boca do animal automaticamente o contamina", finaliza.

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Soins do Cocó Saguis do Parque do Cocó Contaminação de herpes

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