Redação Enem 2025: confira dicas e exemplos de textos com boas notas

Redação Enem 2025: confira dicas e exemplos de textos com boas notas

A redação do Enem vale de 0 a mil pontos; confira exemplos de textos com boas notas para se preparar melhor para a edição de 2025
Atualizado às Autor Yasmin Louise Szezerbatz Tipo Notícia

O Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) será aplicado em 2025 nos dias 9 e 16 de novembro, em dois domingos consecutivos.

Apenas nos municípios paraense de Belém, Ananindeua e Marituba, farão as provas em datas diferentes, em 30 de novembro e 7 de dezembro, devido à COP 30, sediada na capital do Pará.

No primeiro dia do exame, a redação será aplicada valendo de 0 a mil pontos. 

A seguir, O POVO selecionou uma lista com redações que tiveram bom desempenho no Enem para se preparar melhor para a edição deste ano:

Exemplos de redações com boas notas no Enem

O Ministério da Educação elaborou uma cartilha para os estudantes que realizarão o Enem em 2025. Para esse informe, foram selecionadas algumas redações que cumpriram as exigências relativas às cinco competências cobradas pelo Enem.

O tema cobrado em 2024 foi "Desafios para a valorização da herança africana no Brasil". Confira os exemplos escolhidos:

Veja a redação de Ana Clara Pereira na íntegra:

“O livro “Quarto de despejo”, de Carolina Maria de Jesus, retrata o cotidiano da própria autora — mulher negra e pobre —, que viveu na favela do Canindé, na década de 1960, em São Paulo. Conforme exibido na história de vida de Carolina e expandindo esse cenário para a realidade atual, infelizmente, ainda são perceptíveis desafios para a valorização da herança africana no Brasil. Assim, destacam-se o racismo estrutural e a negligência por parte da sociedade como aspectos dessa preocupante problemática em solo nacional.

O racismo estrutural, ou seja, o preconceito étnico enraizado na população, está muito presente nas relações sociais e na estrutura do Brasil. Isso porque o longo período escravocrata vivenciado no país e a não adoção de políticas de inserção dos libertos na sociedade deixaram cicatrizes irreversíveis na história brasileira, tais como a marginalização desse grupo, a menor taxa de acesso à escolarização e o menor salário desses indivíduos. Nesse sentido, segundo o filósofo Elijah Anderson, os brancos reduzem o espaço dos negros aos guetos — ambientes periféricos e desvalorizados pelos cidadãos em geral —, privando esses sujeitos de participarem de práticas eruditas, como o ensino superior e a atuação na política, o que impulsiona a desatenção quanto aos diversos legados das culturas africanas em território nacional. Dessa forma, o racismo estrutural constitui um obstáculo para a valorização dessa herança no país.

Além disso, a negligência da sociedade quanto à existência concreta desse preconceito é um grave desafio para a adoção de medidas que combatam tal desvalorização. Nesse contexto, apesar de inúmeros dados estatísticos comprovarem o desfavorecimento social desses indivíduos — como a informação do Atlas da Violência de 2019 de que quase 80% das vítimas de homicídio do ano foram negros —, muitas pessoas ainda persistem em acreditar que o preconceito racial não existe de fato. De acordo com o teórico Florestan Fernandes, a ideia de democracia racial brasileira é um mito, já que a convivência entre grupos étnicos no país foi, historicamente, marcada por violência, como a psicológica, a sexual e a física, ocorridas, principalmente, durante a escravidão — e impedindo o reconhecimento dos aspectos culturais dessas pessoas. Desse modo, a negligência por parte da população é um grande empecilho para a devida consideração do legado dessas comunidades no país.

Portanto, destacam-se o racismo estrutural e a negligência por parte da sociedade como desafios para a valorização da herança africana no Brasil. Logo, o Ministério da Educação — órgão federal responsável por coordenar as diretrizes do ensino na nação — deve criar um componente curricular voltado para a recuperação da cultura e da história africanas, por meio da criação de uma lei que implemente tal disciplina em todas as escolas do Brasil, a fim de reverter o atual quadro de desvalorização dessa etnia entre as próximas gerações. Ademais, o Ministério da Igualdade Racial deve promover campanhas que sinalizem a cotidiana presença dos preconceitos de cunho étnico, com o objetivo de conscientizar a população brasileira acerca da real existência dessa inquietante discriminação em solo nacional. Em última instância, busca-se, com tais medidas, alterar a situação de invisibilidade histórico-cultural ainda experienciada por brasileiros, a exemplo de Carolina Maria de Jesus.”

Comentários

O repertório sociocultural mobilizado é legítimo, pertinente e produtivo, com referências relevantes à literatura (Carolina Maria de Jesus) e à sociologia (Elijah Anderson e Florestan Fernandes).

Ademais, com excelente domínio da norma-padrão e das convenções de escrita, o texto revela conhecimento das regras gramaticais, com o emprego de vírgulas, travessões e demais sinais de pontuação.

No entanto, nota-se imprecisão vocabular no uso do termo “exibido”, em “Conforme exibido na história de vida de Carolina”, uma vez que, nesse caso, por se tratar de uma obra literária, “representado” seria, por exemplo, um termo mais adequado e preciso.

Também há uma imprecisão na formulação da ideia “e o menor salário desses indivíduos”, já que o texto está truncado, uma vez que o argumento que se queria apresentar era o de que trabalhadores negros estatisticamente recebem menores salários em comparação a trabalhadores brancos.

Em relação aos aspectos coesivos, o texto apresenta continuidade temática e repertório variado de recursos coesivos, empregados sem inadequações: pronomes e expressões referenciais (“desses indivíduos”, “esses sujeitos”, “dessa inquietante discriminação”, “Portanto”, “Logo”, “Ademais”, “Em última instância”) contribuem para a clareza e a progressão das ideias.

Por fim, a participante apresenta propostas de intervenção detalhadas, que respeitam os direitos humanos, viáveis e articuladas à discussão do texto. Elas indicam o que deve ser feito, por quem, de que forma e com qual finalidade, atendendo integralmente ao comando da proposta de redação.

Confira a redação de Camila Oliveira Costa na íntegra:

“A teoria da Banalidade do Mal, criada pela filósofa Hannah Arendt, confirma que em uma sociedade, um problema é tão recorrente que torna-se banal, ou seja, passa a ser ignorado e tratado com normalidade. Nesse sentido, é possível fazer uma relação entre essa teoria e o grande desafio presente no Brasil em garantir a valorização da herança cultural africana. Logo, vale ressaltar que, dentre as inúmeras causas que colaboram para a invisibilidade das tradições desses povos, duas são principais: o legado racista deixado pelo histórico escravocrata do Brasil e a negligência educacional em dar visibilidade à memória da cultura afrodescendente.

Primordialmente, é válido citar a música “Negro Drama”, da banda Racionais MC’s, cuja mensagem principal é uma denúncia às dificuldades vividas pelos negros no Brasil. Nesse contexto, sabe-se que os anos de escravidão que ocorreram no país no período de sua colonização marcaram a história com o racismo, a constante e persistente discriminação e, consequentemente, o apagamento da cultura trazida pelos povos da África para o Brasil. Dessa forma, as raízes históricas escravocratas contribuem para a aversão e desvalorização de crenças africanas atualmente.

Ademais, Nelson Mandela — importante figura responsável pelo fim da política de segregação africana — afirmou que a educação é necessária para mudar o mundo. Entretanto, é perceptível na educação brasileira a negligência em ensinar a respeito da cultura afro-brasileira, assim como sua importância para a formação sociocultural do país. Deste modo, a herança africana perde seu reconhecimento e importância, já que é dada a esses povos apenas a posição vulnerável a qual foram submetidos quando escravizados, tornando invisível seu legado cultural.

Portanto, tornam-se necessárias medidas para facilitar a valorização da herança desses povos. Assim, o Ministério da Educação — órgão regulamentador do sistema educacional brasileiro — deve promover, por meio da mudança na grade curricular escolar, a criação de itinerários que sejam específicos para o estudo da cultura afrodescendente, com o fim de tornar conhecido o legado desses povos. Também é preciso a divulgação em rede nacional sobre a importância do combate à discriminação de crenças africanas. Então, a memória africana será vista e valorizada, e sua importância será reconhecida no Brasil.”

Comentários

O repertório sociocultural mobilizado é legítimo, pertinente e produtivo na maior parte do tempo, especialmente na referência à música “Negro Drama”, da banda Racionais MC’s, e a Nelson Mandela.

Com relação a Mandela, faltou contextualizar geograficamente o país onde se deu a política de segregação africana, a África do Sul e a Namíbia, já que o adjetivo “africana” contempla, de modo geral, todos os povos do continente africano, o que, no caso do texto, configura uma imprecisão na informação.

O parágrafo conclusivo apresenta uma proposta de intervenção, detalhada e compatível com os argumentos desenvolvidos anteriormente, cumprindo adequadamente o que se espera para o gênero.

Ademais, com ótimo domínio da norma-padrão e das convenções de escrita, o texto apresenta um projeto bem estruturado, organizado por quatro parágrafos equilibrados e articulados.

Em relação à pontuação, há desvios de emprego de vírgulas nos seguintes trechos: “confirma
que[,] em uma sociedade”; “os anos de escravidão que ocorreram no país[,] no
período de sua colonização[,] marcaram a história com o racismo”; “é perceptível[,] na educação brasileira[,] a negligência em ensinar a respeito da cultura afrobrasileira”.

Há também um desvio no emprego da ênclise em “um problema é tão recorrente que torna-se banal”.

No que diz respeito à coesão, o texto apresenta continuidade temática e repertório variado de recursos coesivos; pronomes e expressões referenciais contribuem para a clareza e a progressão das ideias.

Confira a redação de Camila de São Tiago Silva na íntegra:

“A música “Bença”, do cantor e compositor Djonga, reflete criticamente, ao longo de seus versos, os empasses enfrentados por pessoas pretas na sociedade. Concomitantemente, é notório que a crítica feita pelo cantor destaca um problema social recorrente na realidade contemporânea, tendo em vista que cresce, na atual conjuntura brasileira, os desafios para a valorização da herança africana no Brasil. Nessa perspectiva, surge uma problemática agravante no país, que se potencializa, principalmente, devido ao legado histórico e à lacuna educacional.

Sob esse viés, é imprescindível destacar o legado histórico como agravador da falta de valorização da herança africana. Nesse sentido, a escravidão no Brasil, marco histórico nacional, foi movida e estruturada por uma série de preconceitos étnicos e raciais que, na época, evidenciaram a crença de superioridade dos europeus em relação aos povos nativos e africanos. Paralelamente, na sociedade brasileira atual, fica claro que as sequelas históricas do passado ainda têm efeito no presente, visto que a desvalorização da cultura negra e de sua herança é recorrente, tanto na série de representações esteriotipadas, quanto no contínuo apagamento de sua história.

Ademais, a lacuna educacional também impacta na problemática. Segundo o filósofo Immanuel Kant “O homem não é nada além daquilo que a educação faz dele”, compreendendo, dessa forma, a importância da educação na construção do ser humano. Entretanto, é fato que a crítica tecida por Kant não se concretiza na realidade, uma vez que a falta de atuação das instituições educacionais acomete o razo conhecimento acerca da origem afro-brasileira, bem como sua forte representação histórica e cultural no território nacional, o que desencadeia o desconhecimento sobre a importância de valorizá-la.

Conclui-se, portanto, que medidas devem ser tomadas para enfrentar os desafios para a valorização da herança africana no país. Por isso, cabe ao Ministério da Cultura, órgão responsável por garantir a valorização cultural no Brasil, assegurar que o legado afro-brasileiro seja devidamente reconhecido, por meio de políticas públicas e campanhas voltadas à cultura, para fins de promover maior inclusão social e étnica. Além disso, é dever do Ministério da educação, responsável por administrar os setores educacionais, dar maior visibilidade à história afrodescendente, por meio de atividades educativas e palestras pedagógicas voltadas às grandes personalidades negras do território nacional, para assim promover uma melhora do quadro no Brasil”.

Comentário

O tema é abordado em sua totalidade no decorrer dos quatro parágrafos. No primeiro parágrafo, é apresentado um repertório sociocultural legitimado e pertinente, que é a música “Bença”, do cantor e compositor Djonga.

Nesse mesmo parágrafo, há a delimitação do tema, além da apresentação das duas causas que serão discutidas: o legado histórico e a lacuna educacional. No segundo parágrafo, o legado histórico é apresentado como agravador da falta de valorização da herança africana.

Em seguida, o terceiro parágrafo é dedicado à lacuna educacional e, nele, é apresentado mais um
repertório sociocultural ao citar o filósofo Immanuel Kant, “O homem não é nada além daquilo que a educação faz dele”. 

Demonstra bom domínio da modalidade escrita formal da língua portuguesa e de estruturação sintática do texto, com desvios de escrita em: “empasse” por “impasse”, “razo” por raso, “esteriotipadas” por estereotipadas e emprego de letra minúscula em “Ministério da educação” por Ministério da Educação.

Há também a falta do emprego de vírgula no trecho “Segundo o filósofo Immanuel Kant [,] ‘O homem não é nada além daquilo que a educação faz dele’” e a ausência de vírgulas para isolar a conjunção conclusiva “assim” no trecho “para [,]assim[,] promover uma melhora do quadro no Brasil”.

Por fim, no trecho “para fins de promover maior inclusão social e étnica”, o verbo promover está empregado incorretamente, já que, nesse caso, o correto seria o emprego do substantivo “promoção”, já que "para fins de" é uma locução prepositiva que significa "com o objetivo de" ou "com a finalidade de".

O texto também apresenta continuidade temática e emprega, sem inadequações, um repertório variado de recursos coesivos, que articulam os argumentos, as partes do texto e as informações apresentadas.

O texto é finalizado com duas propostas que respeitam os direitos humanos. Elas permeiam o texto e são decorrentes do desenvolvimento da argumentação.

Entretanto, há uma incoerência no trecho “por meio de atividades educativas e palestras pedagógicas voltadas às grandes personalidades negras do território
nacional”, já que, da forma como está expresso, a ideia é a de que as propostas deveriam destinar-se às personalidades negras, e não a toda sociedade, como se presume que era a ideia da autora do texto.

De todo modo, essas propostas são detalhadas, mostram o quê e como devem ser realizadas, quem vai realizar o que foi proposto e qual será o efeito dessas ações de intervenção.

Confira a redação de Nicolle da Costa Pinto na íntegra:

“Na música “Negro Drama”, do grupo Racionais MC’s, é exposta a indignação dos autores com a realidade atual, na qual os valores, crenças e cultura dos negros são menosprezados. De maneira análoga à melodia, é evidente a existência de desafios para a valorização da herança africana no Brasil. Logo, é imprescindível analisar a discriminação racial e a desigualdade social como entraves.

Em primeira instância, vê-se que o racismo possui suas origens no passado. Nesse sentido, durante os séculos XVI ao XIX houve a mercantilização e escravidão dos africanos em território nacional, os quais foram forçados a trabalhar sob condições precárias e violentas. Sob esse viés, fica claro que os acontecimentos retrógrados originaram pensamentos limitantes e excludentes que permanecem até os tempos hodiernos, acarretando a desumanização dos pretos e a ausência de aceitação social. Diante disso, prejudicados são os afro-brasileiros pelo preconceito instaurado na sociedade, pois suas ideologias são postergadas em comparação a outras tradições, impossibilitando a valorização de suas heranças culturais. Desse modo, é imperiosa a realização de ações resolutivas.

Já em uma segunda análise, cabe ressaltar a disparidade coletiva. No livro “Memórias Póstumas de Brás Cubas” o defunto-autor, de Machado de Assis, narra sua relação de dominância com um garoto negro em sua infância, demonstrando a segregação socioeconômica. Nessa perspectiva, é notório que indivíduos brancos, muitas vezes, possuem mais oportunidades de expressarem-se devido ao fato de serem “prestigiados” e mais respeitados, isto difere do cotidiano dos pretos e pardos residentes das favelas e periferias. Consequentemente, por não alcançarem ascensão e consideração social, subjugados são os descendentes de africanos pelo corpo civil, este que privilegia os costumes advindos das elites. Dessa forma, faz-se impetuosa a tomada de medidas focadas em sanar os óbices abordados.

Portanto, conclui-se que os desafios para a valorização da herança africana devem ser extintos. Para isso, cabe ao Ministério da Educação fomentar nas instituições de ensino a realização de projetos culturais, palestras, debates e passeios obrigatórios, visando educar os alunos sobre as crenças afro-americanas e romper os pensamentos preconceituosos presentes na contemporaneidade, por meio de procedimentos administrativos e propostas de temas que serão abordados nas escolas. Assim, a pátria amada tornar-se-á mais equitativa e respeitosa, destoando do passado colonial e erradicando o contexto exposto na melodia”.

Comentários

O repertório sociocultural mobilizado é legítimo, pertinente e produtivo, com referência ao livro “Memórias Póstumas de Brás Cubas”, de Machado de Assis. O parágrafo conclusivo apresenta uma proposta de intervenção detalhada e compatível com os argumentos desenvolvidos anteriormente, cumprindo adequadamente o que se espera para o gênero.

Ademais, com bom domínio da norma-padrão e das convenções de escrita, o texto apresenta um projeto bem estruturado, organizado por quatro parágrafos equilibrados e articulados, com uso consistente dos recursos de coesão, tanto no plano intraparágrafo quanto no interparágrafo.

Em relação à pontuação, há desvios de emprego de vírgulas nos seguintes trechos: “No livro ‘Memórias Póstumas de Brás Cubas’[,] o defunto-autor” e “cabe ao Ministério da Educação fomentar[,] nas instituições de ensino[,] a realização de projetos”. Também há problemas de paralelismo no trecho “na qual os valores, [as]crenças e [a]cultura dos negros são menosprezados”. Também no primeiro parágrafo falta um complemento para o vocábulo “entraves”, por exemplo”, “entraves para a resolução desses problemas”.

No segundo e no terceiro parágrafo, o verbo “possuir”, cujo sentido é deter a posse de algo concreto, está empregado incorretamente, sendo adequado, nos dois casos, a utilização do verbo “ter”. No segundo parágrafo há, ainda, uma imprecisão vocabular no trecho “suas ideologias são postergadas”, em que se depreende que o objetivo seria o uso de um vocábulo com sentido, por exemplo, de “negligenciadas”.

Por fim, a participante apresenta proposta de intervenção detalhada, que respeita os direitos humanos, viável e articulada à discussão do texto. Indica o que deve ser feito, por quem, de que forma e com qual finalidade, atendendo integralmente ao comando da proposta de redação. 

Confira a redação de Pedro Ricardo Alves Freitas na íntegra:

“O Brasil, ao longo de sua história, tornou-se um país bastante miscigenado, sendo o povo africano um dos principais agentes na herança da identidade brasileira. Entretanto, com o passar dos anos, surgiram tentativas de desvalorizar essa descendência, como o surgimento do movimento Eugenista, que buscava embranquecer a população, pois acreditava-se que assim ela se tornaria mais pura e melhor. Dessa forma, infelizmente, fomentou-se uma visão negativa da herança negra, trazendo, para os dias de hoje, desafios para a valorização das origens africanas, tais como: a precária representatividade nas escolas e a falta de incentivos à cultura afrodescendente.

Nesse sentido, a representatividade escassa nas escolas acaba perpetuando estereótipos em relação à cultura africana, pois ela é pouco ensinada nos anos escolares e quando é abordada em sala de aula costuma ser apenas sobre o passado escravista, tratando os longos anos de sofrimento dos afrodescendentes, ou de um jeito estereotipado, resumindo a herança negra a poucos elementos como a capoeira, sem abordar sua diversidade. Assim, a educação cumpre um papel essencial na luta pela valorização da herança africana, pois desde cedo é preciso ensinar sobre a pluralidade da cultura negra às crianças e aos jovens; disseminando de forma adequada as origens africanas e transformando a sociedade, como afirmou Paulo Freire quando disse que, sem a educação, será impossível evoluirmos como sociedade.

Ademais, a falta de incentivos culturais aos afrodescendentes é um grande desafio, pois é muito difícil valorizar algo que não conhecemos. Dessa forma, é preciso destacar a ocorrência de casos como o que Djamila Ribeiro conta em seu livro, “Pequeno manual antirracista”, em que a autora relata ter consumido pouquíssimo conteúdo feito por pessoas negras em sua infância e, na maioria das vezes, observando apenas protagonistas brancos em livros., Nesse sentido, sem incentivos para artistas negros ocuparem espaços culturais, como livros ou filmes, apenas os brancos estarão sendo representados, privando as pessoas de contemplarem e valorizarem a cultura africana.

Portanto, cabe ao Ministério da Educação, órgão responsável por gerir os processos educacionais no Brasil, intensificar a representatividade negra nas escolas, por meio de uma reforma na base educacional, para trazer às aulas e aos livros didáticos a diversidade cultural negra para além da escravidão. Além disso, faz-se necessário que o Ministério da Cultura, órgão brasileiro responsável por gerir os meios culturais do país, destinar incentivos a artistas negros, a fim de fomentar a produção de conteúdo afrodescendente e disseminá-lo à população, por intermédio dos teatros, do cinema, da televisão e dos livros, suprimindo visões estereotipadas da sociedade.”

Comentários

O repertório é legitimado, pertinente e com uso produtivo. No primeiro parágrafo, ao tratar da representatividade escassa da cultura africana nas escolas, o participante cita Paulo Freire, para quem “sem a educação, será impossível evoluirmos como sociedade”.

O segundo parágrafo trata da falta de incentivos para artistas negros ocuparem espaços culturais. O repertório mobilizado tem como fonte a filósofa Djamila Ribeiro.

Desse modo, com referência ao arcabouço científico e legal brasileiro, bem como a fatos históricos, a redação demonstra, além do excelente domínio do texto dissertativo-argumentativo, a abordagem completa do tema com uso de repertório sociocultural produtivo.

A redação é caracterizada por uma boa estruturação sintática: os períodos são construídos com a complexidade esperada para que a estrutura sintática seja avaliada como muito boa, com subordinações e orações intercaladas, o que revela o domínio do participante na elaboração de períodos.

Contudo, há alguns desvios: imprecisão vocabular no trecho “um dos principais agentes na herança da identidade brasileira”, no qual, aparentemente, o sentido seria de “construção da identidade brasileira”.

Há também o uso inadequado de letra maiúscula em “movimento Eugenista”, ausência de vírgulas para separar a oração adverbial intercalada “[,]quando é abordada em sala de aula[,]”, emprego inadequado de vírgula em um aposto especificativo em “é preciso destacar a ocorrência de casos como o que Djamila Ribeiro conta em seu livro, ‘Pequeno manual antirracista’,”.

Por fim, no trecho “é preciso ensinar sobre a pluralidade da cultura negra às crianças e aos jovens; [,] disseminando de forma adequada as origens africanas”, o uso de ponto-e-vírgula está inadequado para preceder o gerúndio “disseminado” na oração, e uma imprecisão no uso da expressão “origens africanas”, já que não podem ser disseminadas as “origens africanas”, mas, por exemplo, “conhecimentos dos povos africanos”.

No plano sequencial, há o emprego de marcadores argumentativos e conectivos (“Entretanto”, “Dessa forma”, “Nesse sentido”, “Assim”, “Ademais”, “Portanto”, Além disso”).

Enem: redação nota mil

Desde 1998, o Enem exige um texto dissertativo-argumentativo em prosa. Ao longo dos anos, os temas já abordaram cultura, meio ambiente, desigualdade social, saúde mental e inclusão.

O POVO reuniu exemplos de redações notas mil para ajudar o estudante a entender a linha de raciocínio esperada; confira:

2023 - Desafios para o enfrentamento da invisibilidade do trabalho de cuidado realizado pela mulher no Brasil

Redação nota 1.000 de Maria Luiza Januzzi, de Valença (RJ):

“De acordo com a pensadora brasileira Djamila Ribeiro, o primeiro passo a ser tomado para solucionar uma questão é tirá-la da invisibilidade. Porém, no contexto atual do Brasil, as mulheres enfrentam diversos desafios para que seu trabalho de cuidado seja reconhecido, gerando graves impactos em suas vidas, como a falta de destaque. Nesse sentido, essa problemática ocorre em virtude da omissão governamental e da influência midiática.

Dessa forma, em primeiro plano, é preciso atentar para o descaso estatal em relação aos obstáculos enfrentados diariamente por mulheres que trabalham como cuidadoras. Segundo John Locke, “as leis fizeram-se para os homens e não para as leis”. No entanto, a inércia governamental direcionada à tais pessoas não cumpre com o previsto na Carta Magna, visto que a falta de investimento em políticas públicas causa dificuldades no âmbito profissional deste setor - como a desvalorização salarial. Isso contribui para que suas necessidades sejam cada vez mais negligenciadas.

Além disso, a influência dos meios digitais é um fator agravante no que tange ao problema. Para Chimamanda Adichie, mudar o “status quo” - o estado atual das coisas - é sempre penoso. Essa conjuntura pode ser observada no papel que a mídia possui na luta diária de mulheres que exercem o trabalho do cuidado ou doméstico, uma vez que ela auxilia no fortalecimento de uma mentalidade social machista no país. Isso ocasionou o silenciamento da população feminina, enraizando a lógica do patriarcado na sociedade. Diante do exposto, as mulheres perdem a voz na busca por direitos profissionais na área de cuidado, ao ser propagada a ideia de que essa função é sua, e somente sua, obrigação.

Portanto, é necessário que esta situação seja dissolvida. Para isso, o governo, órgão responsável por garantir a condição e existência de todos, deve prover apoio psicológico e financeiro às cuidadoras, por meio de investimentos e pelo exercício das leis, a fim de sanar a vulnerabilidade socioeconômica existente no cotidiano desses grupos. Paralelamente, os meios de comunicação precisam combater a lógica de inferioridade e a concepção machista agregadas a este trabalho. Assim, será possível solucionar esta questão, pois será retirada do cenário de invisibilidade, como propõe Djamila.”

2022 - Desafios para a valorização de comunidades e povos tradicionais no Brasil

Redação nota 1.000 de Juliana Moreau de Almeida, de Itamaraju (BA):

“Declarado patrimônio imaterial brasileiro, o ofício das quebradeiras de coco é exemplo de preservação de conhecimentos populares que marcam a cultura, a economia e as relações interpessoais dos povos envolvidos. Similarmente, muitos outros grupos tradicionais possuem saber de extrema importância e, no entanto, não recebem o respeito merecido, o que cria uma urgente necessidade de promover a valorização dessas comunidades. Nesse contexto, é válido analisar como a negligência estatal e a existência de uma visão capitalizada da natureza representam desafios para a resolução de tal problemática.

Diante desse cenário, nota-se a inoperância governamental como fator agravante do descaso em relação às culturas tradicionais. Para pensadora contemporânea Djamila Ribeiro, é preciso tirar as situações da invisibilidade para que soluções sejam encontradas, perspectiva que demonstra a falha cometida pelo Estado, uma vez que existe uma forte carência de conscientização popular sobre o assunto - causada pelo baixo estímulo governamental a essas discussões, tanto nas salas de aula quanto no âmbito político. Nesse sentido, fica evidente que, por não dar notoriedade à luta desses povos, o governo permite o esquecimento e a minimização de seus costumes, o que gera não somente a massiva perda cultural de um legado cultivado por gerações, mas também o prejuízo da desestruturação econômica de locais baseados nessas técnicas.

Ademais, percebe-se a influência de uma ideologia que mercantiliza o ambiente na manutenção de tal entrave. "Para a ganância, toda natureza é insuficiente" - a frase, do filósofo Sêneca, critica uma concepção recorrente na atual conjuntura brasileira, segundo a qual o meio ambiente é visto como um objeto para o luxo humano- logicamente, tal visão mercadológica se choca com o modo de vida experienciado pelos povos tradicionais, que vivenciam seu relacionamento respeitoso e recíproco com o ecossistema, fazendo uso de seus recursos sem fins exploratórios. Por conseguinte, as comunidades que vivem dessa intimidade com a natureza são altamente reprimidas pelas classes que se beneficiam do uso capitalizado e desigual do meio natural, como grandes empresas pecuaristas, que lucram da concentração de terras e do monopólio comercial, o que exclui - ainda mais - a população originária e resulta no declínio de sua cultura.

Portanto, cabe ao Estado - em sua função de promotor do bem-estar social - estabelecer uma ampla fiscalização do uso comercial do meio ambiente em áreas com maior volume de povos tradicionais, mediante a criação de mais delegacias especializadas no setor ambiental, a fim de garantir a preservação do estilo de vida desses indivíduos. Outrossim, é dever do Governo Federal organizar uma campanha de valorização de tais grupos, por meio da divulgação de informativos em redes sociais e da realização de palestras em escolas, de modo a enfatizar a contribuição socioambiental desses cidadãos, para, assim, conscientizar a população e possibilitar a exaltação das culturas tradicionais brasileiras.”

2021 - Invisibilidade e registro civil: garantia de acesso à cidadania no Brasil

Redação nota 1.000 de Giovanna Gamba Dias, de Recife (PE):

"Em sua obra “Os Retirantes”, o artista expressionista Cândido Portinari faz uma denúncia à condição de desigualdade compartilhada por milhões de brasileiros, os quais, vulneráveis socioeconomicamente, são invisibilizados enquanto cidadãos. A crítica de Portinari continua válida nos dias atuais, mesmo décadas após a pintura ter sido feita, como se pode notar a partir do alto índice de brasileiros que não possuem registro civil de nascimento, fator que os invisibiliza. Com base nesse viés, é fundamental discutir a principal razão para a posse do documento promover a cidadania, bem como o principal entrave que impede que tantas pessoas não se registrem.

Com efeito, nota-se que a importância da certidão de nascimento para a garantia da cidadania se relaciona à sua capacidade de proporcionar um sentimento de pertencimento. Tal situação ocorre, porque, desde a formação do país, esse sentimento é escasso entre a população, visto que, desde 1500, os países desenvolvidos se articularam para usufruir ao máximo do que a colônia tinha a oferecer, visão ao lucro a todo custo, sem se preocupar com a população que nela vivia ou com o desenvolvimento interno do país. Logo, assim como estudado pelo historiador Caio Prado Júnior, formou-se um Estado de bases frágeis, resultando em uma falta de um sentimento de identificação como brasileiro. Desse modo, a posse de documentos, como a certidão de nascimento, funcione como uma espécie de âncora para uma população com escasso sentimento de pertencimento, sendo identificada como uma prova legal da sua condição enquanto cidadãos brasileiros.

Ademais, percebe-se que o principal entrave que impede que tantas pessoas no Brasil não se registrem é o perfil da educação brasileira, a qual tem como objetivo formar a população apenas como mão de obra. Isso acontece, porque, assim como teorizado pelo economista José Murilo de Carvalho, observa-se a formação de uma “cidadania operária”, na qual a população mais vulnerável socioeconomicamente não é estimulada a desenvolver um pensamento crítico e é idealizada para ser explorada. Nota-se, então, que, devido a essa disfunção no sistema educacional, essas pessoas não conhecem seus direitos como cidadãos, como o direito de possuir um documento de registro civil. Assim, a partir dessa educação falha, forme-se um ciclo de desigualdade, observada no fato de o país ocupar o 9º lugar entre os países mais desiguais do mundo, segundo o IBGE, já que, assim como afirmado pelo sociólogo Florestan Fernandes, uma nação com acesso a uma educação de qualidade não sujeitaria seu povo a condições de precária cidadania, como a observada a partir do alto número de pessoas sem registro no país.

Portanto, observa-se que a questão do alto índice de pessoas no Brasil sem certidão de nascimento deve ser resolvida. Para isso, é necessário que o Ministério da Educação reforce políticas de instrução da população acerca dos seus direitos. Tal ação deve ocorrer por meio da criação de um Projeto Nacional de Acesso à Certidão, a qual irá promover, nas escolas públicas de todos os 5570 municípios brasileiros, debates acerca da importância do documento de registro civil para a preservação da cidadania, os quais irão acontecer tanto extracurricularmente quanto nas aulas de sociologia. Isso deve ocorrer, a fim de formar brasileiros que, cientes dos seus direitos, podem mudar o atual cenário de precária cidadania e desigualdade."

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