Tarifaço de Trump pode ter efeito de tsunami nas exportações, diz especialista

Empresários relatam prejuízos com incertezas causadas pela possível taxação de 50% sobre produtos brasileiros nos EUA. Setores de mel, calçados e pedras ornamentais estão entre os mais afetados

18:53 | Jul. 11, 2025

Por: Mariah Salvatore
Exportações de produtos como mel e pedras ornamentais estão suspensas enquanto empresas aguardam decisão sobre nova tarifa norte-americana (foto: George Andrade)

O anúncio do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, sobre a intenção de aplicar uma tarifa de 50% sobre produtos brasileiros que entram no país já começa a gerar impactos diretos na economia do Ceará. Cargas estão paradas no Porto do Pecém e a insegurança se espalha entre exportadores, especialmente nos setores de mel, pescados, calçados e pedras ornamentais.

Em entrevista ao Guia Econômico, da rádio O POVO CBN, o CEO da JM Negócios Internacionais, Augusto Fernandes, o efeito da medida é comparável a “uma bomba atômica” sobre a economia brasileira. A empresa atua com despacho aduaneiro e frete internacional e já contabiliza prejuízos com contêineres retidos, negociações suspensas e custos extras com armazenamento.

“Desde o anúncio da tarifa, ninguém mais dorme. O impacto já é real: temos contêineres parados e outros a caminho dos EUA, com chegada prevista entre o fim de julho e a segunda quinzena de agosto. Se a tarifa entrar em vigor no dia 1º, esses produtos já estarão sujeitos à cobrança”, explica Fernandes.

Logística em risco

O Porto do Pecém é hoje um dos principais corredores de exportação do Nordeste. De acordo com Fernandes, a média de tempo entre o embarque no Ceará e a chegada a destinos como Filadélfia, Houston ou Nova York é de 11 a 15 dias. No entanto, o trâmite completo — incluindo atracação, desembaraço e entrega ao cliente final — pode demorar ainda mais, ampliando os riscos para produtos perecíveis e sensíveis.

Além do mel produzido no interior do Estado, que é vendido em regiões como Wall Street e Times Square, cargas de pedras ornamentais, tecidos e ornamentos já enfrentam incertezas logísticas e financeiras. O custo de demurrage — termo usado para o "aluguel" dos contêineres retidos além do prazo — pode chegar a até 280 dólares por dia.

Efeitos em cadeia

O temor dos empresários é de que os efeitos da tarifa se espalhem em cadeia pela economia. Fernandes destaca que o prejuízo não se limita às empresas exportadoras, mas também ameaça empregos e a arrecadação.

“O impacto vem primeiro para as empresas, depois para os empregos e, por fim, para toda a economia. Estamos falando de um comércio bilateral que vem desde Dom João VI. Tudo é dolarizado: máquinas, insumos, tecnologia. Essa tarifa atinge todos nós”, afirma.

Atualmente, os Estados Unidos representam cerca de 15% das exportações brasileiras. Já o Brasil, segundo Fernandes, responde por menos de 1% das importações dos EUA, o que limita o efeito de medidas retaliatórias, como a aplicação da lei de reciprocidade, defendida pelo presidente Lula.

Setores mais afetados

O setor pesqueiro é um dos mais vulneráveis diante da crise. Estima-se que mais de 80% da produção nacional é destinada ao mercado norte-americano. Fernandes alerta que o número de contêineres parados pode ser bem maior do que o divulgado inicialmente — cerca de 58, segundo estimativas preliminares.

“Na nossa empresa, só nesta semana, temos entre 11 e 15 contêineres prontos para embarque, e outros 11 programados para a próxima semana. E isso é apenas uma pequena amostra do que está acontecendo nos portos do Ceará, Bahia e Pernambuco”, afirma.

Alternativas e entraves

Apesar de algumas sugestões de redirecionamento para outros mercados — como Europa ou China —, o especialista pondera que o processo de adaptação é demorado e complexo. Em muitos casos, as empresas foram concebidas exclusivamente para exportar aos Estados Unidos.

“Não é só mudar o destino. O que vendemos para Nova York não é o mesmo que venderíamos em Londres ou Berlim. O público, os padrões e as negociações são outros. Em um caso, só para exportar peças do Ceará para os EUA, foram dois anos de reuniões, contratações e adaptações”, relata.

Cenário de incerteza

O presidente Lula declarou recentemente estar disposto a negociar com os Estados Unidos para reverter a medida, mas também reforçou que, se necessário, aplicará a lei de reciprocidade. Trump, por sua vez, sinalizou que pode conversar com o Brasil, mas ainda não recuou.

Enquanto isso, a apreensão cresce entre empresários e cooperativas. Muitos já negociam prazos com clientes internacionais, tentam postergar envios e buscar garantias contratuais — tudo em meio a um cenário de instabilidade.

“Temos navios saindo hoje do Pecém, com carga prevista para desembarcar nos EUA após o dia 1º de agosto. Os clientes já estão ligando, perguntando: quem vai pagar esses 50%?”, conclui Augusto.

Taxas de Trump paralisam exportação de mil toneladas de pescados brasileiros | O POVO News

 

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