Você sabia que o Ano-Novo nem sempre foi celebrado no dia 1º de janeiro?

Já pensou como seria comemorar o Ano Novo em março? Ao longo da história, a data desse festejo sofreu significativas mudanças

A contagem regressiva no Ano-Novo é, com certeza, um dos momentos mais aguardados das festas de fim de ano ao redor do mundo. Ou melhor, por quase todo o mundo. A celebração da virada não é realizada de forma padronizada em todos os lugares. Aliás, você sabia que o Ano-Novo nem sempre foi comemorado no dia 1º de janeiro?

Ao longo da história, a data passou por diversas mudanças até chegar ao formato atualmente estabelecido. Alterações no calendário, na cultura e nos comportamentos contribuíram diretamente para a concepção contemporânea desse festejo.

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O Ano-Novo na Antiguidade

Historiador formado pela Universidade Federal do Cariri (UFCA) e mestre em História Cultural pela Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), Roberto Viana explica que as diferentes percepções do tempo entre os povos antigos influenciavam tanto o modo como a virada do ano era comemorada quanto a própria existência dessa celebração.

“Na Antiguidade Clássica, com gregos e romanos, ou até mesmo antes, no Império Babilônico, os povos que habitavam a Mesopotâmia tinham uma relação diferente com o tempo. A celebração do Ano-Novo é uma marca da orientação do ser humano com relação ao tempo”, reforça ele.

O historiador diz ainda que, “apesar das diferenças culturais, a ideia de virada de ano está ligada a esses ritos de passagem, à superação de dificuldades, à renovação de votos, a pensamentos para o futuro, e isso aparece em várias sociedades, mas não da mesma forma nem no mesmo período”.

A influência astronômica e cultural sobre o Ano-Novo

Para compreender melhor os diversos raciocínios lógicos utilizadas ao longo da história para determinar os tipos de demarcações temporais adotados pelas sociedades, é possível dividir as interpretações do início do ano em dois eixos principais: o astronômico e o cultural/religioso.

Essa segmentação permite analisar como eventos naturais, como o solstício de inverno, e tradições sociais, como o calendário gregoriano, moldaram as diferentes formas de marcar o começo de um novo ciclo

Super lua na Praia de Iracema, em Fortaleza
Super lua na Praia de Iracema, em Fortaleza Crédito: Samuel Setubal

O primeiro eixo se refere a como o ser humano percebe e lida com o tempo por meio de eventos relacionados à movimentação dos astros, como as fases da lua e as estações do ano.

Por outro lado, o segundo eixo aparece como uma maneira de as sociedades enxergarem a passagem do tempo a partir de uma ótica ligada aos comportamentos e costumes das comunidades, além da influência do cristianismo na adesão de um mesmo calendário, no caso, o gregoriano, em diversas regiões do mundo.

Dessa forma, a compreensão do tempo foi se moldando às realidades das sociedades à medida que a história avançava. Em relação ao dia do ano-novo, Roberto destaca que “a globalização reforça a padronização do calendário gregoriano, que foi oficialmente adotado por grande parte do mundo e contribuiu para unificar essa celebração”.

Ano-Novo em março e calendário de dez meses?

Bem antes da difusão do calendário gregoriano no mundo, já existiam comemorações de início de ano, contudo, elas não ocorriam em 1º de janeiro. “A celebração da virada e da renovação de ciclos é uma constante em várias civilizações, diante de várias experiências humanas”, afirma Roberto Viana.

Festival Akitu e a renovação de ciclos

O pesquisador ouvido pelo O POVO dá destaque a dois períodos históricos que exemplificam e evidenciam a variação das datas em que o Ano-Novo já foi celebrado. Voltando alguns milênios, por volta de 2 mil anos antes de Cristo (a.C.) no Oriente Médio, os babilônicos tinham o costume de realizar o festival Akitu.

Esse festejo se dava durante o equinócio de primavera do Hemisfério Norte, que se inicia em meados de março. Nessa data, o povo da Babilônia promovia essa celebração em alusão à renovação dos ciclos agrícolas e da “ordem cósmica”, indicando uma ligação tanto com eventos naturais quanto com a cultura e a religião.

O ano costumava começar em março

Outro exemplo tem relação com alterações na marcação do tempo na Roma Antiga. No Império, era vigente um calendário que tinha dez meses, o qual começava em março e terminava em dezembro.

Eram usados como base os ciclos da Lua e as estações do ano, que tinha 304 dias, sendo os 61 dias restantes a época do inverno, a qual era desconsiderada nesse modelo. Contudo, no século VIII a.C., foram acrescidos os meses de janeiro e fevereiro ao início do calendário, não sendo mais março o mês inicial.

Séculos depois, durante o comando de Júlio César sobre o Império Romano, uma importante decisão do imperador alteraria as dinâmicas cronológica e comemorativa do Ano-Novo. Por volta do ano 46 a.C., foi estabelecido o dia 1º de janeiro como o marco inicial do calendário juliano, vigente na época.

Isso se deu em homenagem ao próprio César e a Jano, o deus romano da mudança e do recomeço. A determinação, portanto, consolidou a celebração da chegada de um novo ano no dia em questão, durante o inverno do Hemisfério Norte.

Ano-Novo com diversidade no passado e no presente

O mundo possui uma diversidade cultural expressiva, e, ao longo da história da humanidade, essa variedade se refletiu e continua se refletindo nas celebrações de Ano-Novo em cada região.

Roberto cita como exemplo as comemorações do Egito Antigo, em que essas viradas de momento se davam a partir das épocas de cheia e seca do Rio Nilo. Na Mesopotâmia, região que corresponde ao atual Iraque, “eram eventos astronômicos que davam as condições dessa celebração”.

“Há o calendário judaico, o islâmico, o persa, o chinês, e outros. E cada um deles tem uma outra experiência própria em relação ao tempo”, explica o historiador, justificando o fato de que, até hoje, há lugares em que o Ano-Novo não é celebrado no primeiro dia de janeiro.

Veja cinco povos que, tradicionalmente, comemoram o Ano-Novo em outras datas:

1. Muçulmanos

Não existe uma data fixa para o Ano-Novo no calendário islâmico, adotado pelas regiões de maioria muçulmana, pois ele segue a lógica dos ciclos lunares. Fazendo uma comparação com o calendário gregoriano, a virada de ano ocorre em meados de maio.

2. Judeus

Com povo de maioria judaica, Israel celebra o Rosh Hashana, como é chamado o Ano-Novo no país, em diferentes períodos, dependendo do ano. A celebração ocorre nos primeiros dois dias do mês de Tishrei, o sétimo mês do calendário judaico (geralmente em setembro ou início de outubro, no calendário gregoriano). 

Em 2024, a data foi comemorada nos dias 2 e 3 de outubro. Já em 2025, o Ano-Novo judaico acontecerá em 22 e 23 de setembro.

3. Chineses

Assim como o islâmico, a data do Ano-Novo Chinês é calculada com base no calendário lunar chinês, que considera a segunda Lua Nova após o solstício de inverno. Assim, é impossível uma determinação de uma data fixa para o Ano-Novo Chinês, os festejos de virada de ano no país costumam ocorrer durante o mês de janeiro ou de fevereiro.

4. Etíopes

Chamado de Ekutatash, o Ano-Novo na Etiópia ocorre em 11 ou 12 de setembro. O nome dado à data significa “presente de joias” e faz referência ao retorno da rainha do Sabá ao país após ela ter ido visitar o rei judeu Salomão.

5. Tailandeses

O Ano-Novo na Tailândia é chamado de Songkram, que significa “passagem astrológica”, ocorre em 13 de abril de cada ano. Esse dia, de acordo com o calendário budista, marca a volta do Sol em Áries no mapa astral.

O Ano Novo no Brasil

Queima de fogos com vista aérea de drone. Reveillon na Praia de Iracema 2023, Reveillon com 3 dias de festa
Queima de fogos com vista aérea de drone. Reveillon na Praia de Iracema 2023, Reveillon com 3 dias de festa Crédito: Aurélio Alves

Por adotar o calendário gregoriano, o Brasil celebra a virada de ano em todo 1º de janeiro, e preserva alguns costumes durante a comemoração dessa data. “A celebração no Brasil é uma síntese de diversas experiências culturais”, pontua Roberto.

“Temos os fogos de artifício, que estão ligados à tradição chinesa. O estourar do champanhe, ligado à tradição francesa, e o costume de pular as sete ondas, que tem a ver com tradições afroameríndias, ligadas, por exemplo, a Iemanjá”, complementa, refletindo sobre como a diversidade cultural brasileira tem forte influência sobre como o Ano-Novo é celebrado no País.

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