67 anos do Núcleo Colonial Pio XII, em Guaiúba; conheça a história

Local abrigou uma das primeiras ações da Reforma Agrária, se desenvolveu com a agricultura e foi palco da imigração japonesa no Ceará; confira

12:40 | Out. 31, 2025

Por: Mariana Fernandes
O Núcleo Colonial Pio XII foi fundado em 3 de outubro de 1958 (foto: Divulgação/Rafael Rosário)

O Núcleo Colonial Pio XII, hoje distrito São Jerônimo, do município de Guaiúba, foi criado em 31 de outubro de 1958.

A localidade surgiu de um terreno cedido à União, utilizado para medidas da Reforma Agrária no Ceará, e recebeu imigrantes brasileiros e estrangeiros.

Um dos marcos para o Núcleo Pio XII foi a chegada de nove famílias japonesas em maio de 1960, para cuidar da terra e incentivar a produção para abastecer a capital, Fortaleza.

Confira a história do Núcleo Colonial Pio XII e como a realidade da população mudou durante os 67 anos de fundação.

Como foi a criação do Núcleo Colonial Pio XII?

A criação do Núcleo Colonial Pio XII foi perpassada por aspectos políticos, econômicos e até religiosos. O primeiro deles foi o Primeiro Encontro dos Bispos do Nordeste, encabeçado por Dom Hélder Câmara e Dom Eugênio.

Essa reunião aconteceu em Campina Grande, na Paraíba, e contou com a presença do presidente da época, Juscelino Kubitschek.

"A reunião desses bispos é histórica porque, desde a Proclamação da República, o estado estava separado da religião. Essa união do poder religioso com o poder temporal… inseriu a região no Plano de Metas e atendeu a vários pedidos”, explica o historiador Rafael Nogueira.

Rafael estudou a história que perpassa o Núcleo no livro "Núcleo Colonial Pio XII: um resgate histórico da primeira reforma agrária do Estado do Ceará" e elenca que os núcleos coloniais foram criados a partir deste encontro.

A notícia também circulou nos jornais. Na edição do O POVO de março de 1958 apresentava o plano do Instituto Nacional de Imigração e Colonização (INIC), definido como "colonização a longo prazo", que previa a "abertura de novas terras para imigrantes nordestinos".

Núcleo Colonial Pio XII: pioneirismo na Reforma Agrária

Dois anos após o encontro, o Núcleo foi criado, especialmente para colocar em prática uma medida de Reforma Agrária, considerada a primeira do estado do Ceará.

Foi motivada pelas secas que assolavam o Nordeste de tempos em tempos, além da fome na região.

“Isso ocorreu em Pacatuba, no então distrito de Guaiúba. Antes de ser vendido ao INIC, o território, que era o Sítio São Jerônimo, abrangendo quase 1.500 hectares, pertencia à família do ”, conta Rafael.

O historiador destaca que, além de servir como moradia e terra para a produção, o Núcleo tinha a função de abastecer o mercado central de Fortaleza - Mercado São Sebastião - com os produtos cultivados na região.

Influências da imigração japonesa no Ceará

O Japão mantém uma relação migratória com o Brasil desde 1908, quando os japoneses começaram a chegar ao País no porto de Santos, em São Paulo. No Ceará, isso começou quase 50 anos depois, em 1960.

Os nipônicos trouxeram técnicas modernas de agricultura, para incorporá-las em terras cearenses, e buscavam melhores condições de vida para a família, já que o Japão ainda sofria as consequências da Segunda Guerra Mundial, que terminou em 1945.

“A propaganda no Japão prometia muito mais do que eles encontraram. Eles sofreram um pouco com a terra, e trouxeram equipamentos, motores e carrinhos que não existiam na época”, afirma Nogueira.

Dentre as influências dos japoneses na agricultura brasileira, pode-se destacar:

  • Produtos que ganharam o rótulo de "japoneses" devido à sua boa qualidade, como "melão japonês" e "pepino japonês";
  • O melão, conhecido como "melão japonês", foi difundido por eles, embora a semente fosse estadunidense;
  • Enraizaram a cultura da melancia redonda no estado, pois antes ela tinha uma forma mais comprida.

Mas “os japoneses não vieram exclusivamente para o Ceará. Eles foram espalhados por todo o norte e nordeste, e alguns até para outros países”.

As particularidades da vivência dos japoneses no Ceará foram temas de notícias publicas nos jornais do estado. É o caso do evento de casamento de um casal japonês que se mudou para Guaiúba (veja imagem abaixo).

 

67 anos do Núcleo Colonial Pio XII: o que mudou para o município?

“Na época, o núcleo tinha uma grande importância histórica por ter sido criado pelo Presidente da República. Por ser uma colônia federal, havia um decreto e um bom orçamento, que fazia parte do Plano de Metas”, explica Nogueira.

As famílias chegaram de diversos municípios para ocuparem as terras, além de quem já vivia no local. Rafael Nogueira conta que a sua própria família veio de Capistrano e que outras vieram de Quixadá, por exemplo.

Na década de 1960 e 1970, o Núcleo Colonial tinha muita assistência do governo federal, que incluía saúde, educação e demandas sociais.

O historiador relembra que em entrevistas realizadas para a escrita de seu livro, os mais velhos afirmaram que a realidade hoje “nem se compara” ao que viveram nos primeiros anos da fundação do Núcleo, que hoje abriga cerca de cinco mil pessoas.

“Os colonos mais velhos comparam a realidade atual com a da época e preferem o passado. Havia acompanhamento na saúde e um clima social diferente no início da década de 60, com formação de grandes amizades”.

A situação do distrito passou por mudanças a partir de 1973, que afetou a realidade da população que ali vivia. Foi neste ano que o controle foi devolvido ao município de Pacatuba. Quando Guaiúba também se emancipou, o Núcleo passou a ser um distrito.

Após a mudança, a assistência que a região recebia diminuiu e não há orçamento maior por ter sido uma colônia federal. Para Rafael, hoje o Núcleo fica um pouco atrás de outros distritos, politicamente.