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Cearenses desenvolvem molécula sintética que pode impedir a infecção por coronavírus

Estudo objetiva desenvolver um medicamento eficaz contra o Sars-Cov-2; a molécula foi testada no computador e, no fim de agosto, devem ser iniciados os testes em laboratório

 

Pesquisadores cearenses desenvolveram uma molécula sintética que aparenta ser capaz de impedir o vírus Sars-Cov-2, causador da Covid-19, de infectar as células humanas. A pesquisa faz parte de um projeto mais amplo que objetiva produzir um medicamento eficaz contra o novo coronavírus a partir de moléculas desenhadas pelos próprios pesquisadores.

O estudo é o primeiro no mundo a utilizar moléculas da classe de peptídeos para impedir a infecção do coronavírus. Na teoria, a molécula cearense é capaz de confundir as proteínas spike do Sars-Cov-2, localizadas na coroa do vírus, cuja função é invadir as células humanas.

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Funciona assim: as proteínas spike do coronavírus reconhecem um receptor das células humanas, chamado ACE 2. Então, elas interagem com o receptor e abrem caminho adentro das células, utilizando-as para multiplicar o código genético do vírus e, então, provocar uma infecção. O que os peptídeos cearenses irão fazer é induzir as proteínas spike ao erro.

“É como se você pegasse uma chave de uma fechadura que não é dela”, ilustra Pedro de Souza, autor principal e líder do estudo publicado na revista científica International Journal of Biological Macromolecules no dia 1º de agosto. Pedro de Souza, doutor da Universidade Federal do Ceará (UFC), trabalha desde 2016 com moléculas sintéticas.

A molécula cearense está em azul. Já a cor verde representa as proteínas spike, enquanto os traços pretos são a ligação entre a molécula cearense com a proteína do coronavírus
A molécula cearense está em azul. Já a cor verde representa as proteínas spike, enquanto os traços pretos são a ligação entre a molécula cearense com a proteína do coronavírus (Foto: DIVULGAÇÃO)


Próximos passos

Ainda que os resultados sejam satisfatórios, é preciso ter cautela. A eficácia da molécula foi testada in silico, ou seja, por meio de simulação computacional, e ainda irá passar por longos processos de testagens em laboratório (in vitro) e em seres vivos (in vivo). A última etapa começa com testagens em ratos, depois macacos e por último em humanos.

Além disso, os estágios dependem uns dos outros. Se as testagens in vitro apresentarem resultados insatisfatórios ou inseguros, não haverá testagem in vivo.

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A equipe formou parceria com o Helmholtz Center for Infection Research (Centro Helmholtz para Pesquisa em Infecção, em tradução livre) da Alemanha. O centro irá prosseguir com os ensaios in vitro e, se possível, in vivo. A perspectiva é que os testes em laboratório iniciem no final de agosto.

“Iniciamos a pesquisa há uns cinco meses e somos gratos por poder contribuir com possíveis soluções para a atual crise global em saúde pública que estamos vivendo”, comemorou o doutorando em Biotecnologia da Escola de Saúde Pública do Ceará (ESP/CE), Francisco Eilton Lopes. A UFC fará o pedido de patente do experimento ao Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Inpi).

“Embora no Brasil a gente tenha uma onda de descrédito na ciência e nas universidades é uma satisfação porque sei que estou contribuindo para sociedade. Se a gente não tiver dinheiro pra fazer, outras pessoas podem ter. Por isso publicamos [a pesquisa]”, explica Pedro. Para ele, desenvolver um tratamento farmacológico é tão importante quanto encontrar uma vacina, justamente por aliviar os sintomas.

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Também integram a equipe de pesquisadores o doutorando em Bioquímica Jackson Lima Amaral (UFC), o professor do Departamento de Bioquímica e Biologia Molecular da UFC, Cleverson Diniz Teixeira de Freitas e o professor titular do Laboratório de Proteínas Vegetais de Defesa (LTVD), doutor José Tadeu Abreu de Oliveira. José também é o chefe do grupo e coordenada a pesquisa em sua amplitude.

Importância de pesquisas anteriores

Proteínas spike, receptores ACE 2 e tantos outros nomes que indicam a estrutura e do Sars-Cov-2 e a interação dele com outras células: todos foram descobertos por pesquisadores dedicados a modelar o novo coronavírus e também sequenciar a genética dele.

Em abril de 2020, cientistas estadunidenses chegaram a transformar a estrutura do novo coronavírus em música para identificar com mais precisão os pontos fracos do organismo.  Ainda que estudos do tipo pareçam soltos, eles têm grande impacto na compreensão do vírus e na formulação de hipóteses que podem levar a tratamentos e curas.

“A partir dessas pesquisas foi que a gente conseguiu conhecer como é o modelo da estrutura da proteína do vírus. Eu precisava saber como era a proteína do vírus e como ele interagia com o receptor, para fazer o estudo”, explica Pedro. Francisco completa: “Quando trabalhamos com o desenvolvimento de moléculas sintéticas e interação molecular entre proteínas, o conhecimento da estrutura tridimensional da proteína toma um sentido bem mais abrangente.”


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