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Em um mês, Rede ConVida acolheu psicologicamente quase 600 nordestinos

O serviço de atendimento gratuito da Secretaria Regional I de Fortaleza chegou a ouvir pessoas da Paraíba, Piauí, Pernambuco e Rio Grande do Norte
14:32 | Jun. 08, 2020
Autor Catalina Leite
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Catalina Leite Repórter do OP+
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Tipo Notícia

Por dias, Júlio Rocha, 31, teve medo de entrar para as estatísticas de óbitos da Covid-19. Ele já é um dos 54.986 casos confirmados de Covid-19 no Ceará e, durante a quarentena total no quarto de casa, a ideia de morrer o angustiava constantemente. Apesar de os sintomas do autônomo serem leves o suficiente para seguir com o tratamento em domicílio, o desespero o deixava com uma falta de ar assustadora.

“Eu já estava com a saúde mental muito ruim e comecei a sentir muitos sintomas, a me desesperar mesmo. Aí eu pesquisei na internet e vi que poderia ser de origem psicológica”, conta. Por isso, ele decidiu procurar apoio psicológico pela primeira vez na vida, na esperança de reduzir a intensidade das manifestações. Após a primeira ligação com a Rede de Acolhimento Emocional ConVida (Rede ConVida), “foi como se tivessem botado um balão de oxigênio [nos pulmões]”, descreve.

A Rede ConVida, serviço de acolhimento psicológico gratuito durante a pandemia da Secretaria Regional I de Fortaleza, já atendeu quase 600 pessoas em um mês de funcionamento. Por meio de ligações telefônicas de 30 minutos, os psicólogos voluntários escutam cearenses como Júlio, que enfrentam as consequências da ansiedade e medo intensificadas pela crise sanitária mundial de Covid-19.

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“Eu era meio cético com consultas psicológicas. Mas pesquisando eu vi que mesmo não estando com Covid-19 você pode desenvolver sintomas porque a saúde mental está muito prejudicada nesse período”, relembra o autônomo. Após semanas trancado no quarto, Júlio está assintomático e considera o atendimento como crucial para a cura.

Importante ressaltar que todas as informações das pessoas atendidas pela Rede ConVida são confidenciais. A entrevista de Júlio ao O POVO foi sugerida pelo próprio rapaz, na expectativa de compartilhar a importância do atendimento psicológico.

Do outro lado da linha

Iniciada com 16 profissionais, a Rede ConVida já disponibiliza 71 psicólogos para atendimentos de pessoas acima de 18 anos nos turnos da manhã, tarde e noite. Todos os profissionais participantes são autorizados pelo Conselho Regional de Psicologia (CRP) para realização de atendimento a distância. Acesse a tabela geral de atendimento da Rede ConVida.

“Levar o acolhimento psicológico às pessoas que neste momento não têm acesso: não há dinheiro no mundo que pague isso”, justifica a psicóloga Leidiane Nogueira, voluntária na rede. Inclusive, dados da ConVida demonstram que mais de 83% dos ouvidos não fazem acompanhamento psicológico. De acordo com a psicóloga, as principais queixas atendidas por ela estão relacionadas à ansiedade e a piora de quadros ansiosos no período de distanciamento social.

Outros dos problemas mais citados são angústia, transtorno obsessivo-compulsivo (TOC), ideação suicida, depressão, separação no relacionamento afetivo durante atual período de pandemia, transtorno de bipolaridade, hipocondria, desamparo, descontrole, estresse, impaciência, crise de pânico, luto, tristeza profunda, insônia, medo de adoecer, somatizações, impaciência, irritabilidade, oscilação de humor e sensação de impotência.

O poder de ouvir e acreditar

Enquanto a lista de sintomas serve como dados para indicar os efeitos da pandemia na saúde mental das pessoas, os relatos dos profissionais demonstram que a falta de empatia ainda impede a melhora de muitos. A psicóloga Márcia Linhares relembra de um relato que a marcou muito durante o voluntariado na rede.

“Era um paciente que apresentava sintomas de ansiedade. No final e durante a conversa, ele disse assim: ‘Sabe o que é o melhor de estar falando com você? É porque você não é mais um que diz que os sintomas que eu tenho são besteira, uma coisa da minha cabeça, falta de Deus na minha vida ou falta de força de vontade’”, descreve Márcia. Segundo ela, esse desmerecimento ao sentimento dos outros é uma reclamação comum dos atendidos. “A nossa cultura ocidental está interessada apenas em sintomas físicos”, critica.

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“Por mais que seja só um momento de escuta, quando eu recebo o retorno dos pacientes no final eles sempre agradecem. Eles dizem que apenas esse momento de escuta, por mais que seja de tempo pequeno, os ajudou bastante a desabafar”, alegra-se a psicológica Morgana Araújo, que completou oito meses de atuação profissional nesse domingo, 7.

Apesar de ser uma iniciativa da Secretaria da Regional I, o serviço já foi solicitado por toda Fortaleza, além de Itapipoca, Cascavel, Eusébio, Acarape, Jaguaruana, Aquiraz, Maracanaú, Maranguape, Pindoretama, Pacatuba, São Gonçalo do Amarantes, Juazeiro do Norte, Jardim, Acaraú, Aracati, Aratuba, Beberibe, Cajazeiras, Paraíba, Paracuru, Trairi, Uruburetama, Caucaia e Paraipaba. Existiram ainda atendimentos de pessoas de Campina Grande (PB), Alto da Beleza (RN), Parnaíba (PI) e Pesqueira (PE).


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