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Sob isolamento social, Ceará é o segundo estado do Nordeste com mais casos de violações aos direitos humanos

Ceará teve 200 violações até o dia 14 de abril; demora em repasse de dados do Ministério é um dos problemas para atuar com medidas públicas de encontro às denúncias
13:05 | Abr. 17, 2020
Autor Marília Freitas
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Marília Freitas Estagiária do O POVO Online
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Tipo Notícia

O Ceará é o segundo estado do Nordeste com o maior número de violações contra os direitos humanos durante o período de pandemia por Covid-19. Os dados são elencados pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MdH) e fazem parte do Portal da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos, que recebe denúncias de dois canais do Governo Federal: o Disque 100 e o Disque 180.

Foram registradas, até o dia 14 de abril, 200 denúncias no Ceará efetuadas pelos telefones governamentais. O Estado fica atrás apenas da Bahia, que registrou 205 telefonemas até então. Os números são atualizados com até dois dias de atraso e os índices já podem ter aumentado. Em todo o País, foram contabilizadas 1.495 denúncias após o início do levantamento específico para o período de pandemia, que é influenciado por medidas de isolamento social e por medidas específicas de atendimento na saúde pública.

A maior incidência de violações do Estado são contra pessoas socialmente vulneráveis, com 137 registros. Segundo Cristiane Faustino, titular do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos Humanos do Ceará (CEDDH), essa parcela da população é a mais afetada devido a problemas estruturais do País que persistem na sociedade, inclusive durante o período de pandemia. “As famílias tradicionais brasileiras já têm um histórico de formação de violência e, no período de isolamento, a dificuldade de acesso a dinheiro e a alimentos aumentam a tensão do confinamento. Essa violência deve aumentar em locais e comunidades no quais as pessoas não tenham uma moradia digna”.

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A principal violência relatada nas denúncias é a de exposição de risco à saúde, que, segundo Cristiane, pode ser um movimento natural ocasionado pela mistura de sensações diante de um contágio por doença. A presidente tem recebido denúncias de cearenses que chegam com sintomas de Covid-19 na rede pública, mas voltam para casa devido a falta de assistência adequada. “Em uma possível situação de desespero, as pessoas vão denunciar e correr atrás de seus direitos”. Soma-se a situação de insegurança e colapso da saúde pública a falta de condições adequadas de saúde para se ter uma vida saudável.

Alto índice de violência contra pessoas em restrição de liberdade é reflexo de ações anteriores do Ceará

A violência contra pessoas em restrição de liberdade, que inclui detentos e internados em instituições de ressocialização, ocupa o segundo maior número no Estado, com 37 denúncias. Das denúncias, 36 se incluem na exposição de risco à saúde, seguido de maus tratos com 25 casos. Uma única denúncia pode conter diversas violações e diversas motivações.

O sociólogo e pesquisador do Laboratório de Estudos da Violência (LEV) da Universidade Federal do Ceará, Ítalo Lima, explica que as denúncias são um reflexo da permanência de problemas estruturais nessas unidades, como a superlotação. Há sete anos Ítalo estuda o sistema carcerário no Brasil. “O sistema prisional é um espaço de aprofundamento das desigualdades e, historicamente, já são espaços de maus tratos praticados por diversos atores”.

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A instauração do estado de pandemia mundial soma-se aos problemas estruturais e a persistência de dificuldades em obter acesso a informações dos detentos, como o estado de saúde ou de ações governamentais que visam evitar a proliferação do novo coronavírus. Essa angústia repercute em denúncias efetuadas por parentes da pessoa que está em privação de liberdade. “O perfil dos encarcerados dá um tom geral a quem faz a visitação. São pessoas com poucos recursos financeiros e pouca assistência jurídica. Não causa espanto o Ceará se destacar nos indicadores, pois existe uma mobilização de denúncias”.

Os indicadores abrangem os meses de março e abril, período no qual medidas de isolamento social foram decretadas no Ceará. As barreiras sociais foram estabelecidas no dia 19 de março e seguem até o próximo dia 20. O secretário de saúde do Estado, Dr. Cabeto, já afirmou que haverá prorrogação na medida.

O titular da Ouvidoria Especial dos Direitos Humanos do Ceará (OEDH), Franklin Dantas, explica que há uma demora do Ministério em repassar os dados detalhados ao Estado, o que possibilitaria um direcionamento a atendimentos personalizados para cada denúncia. O conselho é ligado à Secretaria de Proteção Social, Justiça, Cidadania, Mulheres e Direitos Humanos do Ceará (SPS), que está realizando levantamentos estaduais baseados em canais de denúncias da pasta.

Segundo Franklin, a apuração desses dados é delicada e requer manifestações setoriais de cada uma das ouvidorias dos órgãos que recebem a denúncia. “Quando não é realizada uma denúncia anônima, tentamos buscar diretamente o contato e encaminhamos para os setores”, disse.

Segundo Cristiane, o CEDDH tem feito o monitoramento dos casos de violência recebidos pela SPS. “Estamos em um momento em que foram feitos vários planos de contigência e de políticas públicas. Uma das dificuldades que estamos passando é a de verificar a aplicação dessas políticas, visto que não temos como sair de casa. É um desafio”, conclui.

Para denunciar violações aos direitos humanos no Ceará, é possível ligar para o número 155 ou enviar email para os seguintes endereços: ouvidoria.dh@sps.ce.gov.br e para o covid19direitoshumanos@gmail.com. Os canais 180 e 190 também continuam ativos.

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