Caucaia estreia sua primeira Liga de MC’s como a única do Estado
Liga Caucaiense de MC’s movimenta a cena das batalhas de rima e estreia como a única do estado do Ceará, tendo Yori MC como primeiro campeão
Voltando para casa no sábado, 18, pela avenida Coronel Correia, que dá continuidade à Mister Hull, na garupa de uma moto Honda, fiquei me perguntando quando havia sido a última vez que saí de casa para ir a um evento dentro do meu próprio município, Caucaia. A vida inteira me deslocando rumo a Fortaleza para ir à escola, à faculdade, ao trabalho ou para os “rolês”, o anúncio da final da Liga Caucaiense de MC’s finalmente levou-me ao sentido oposto – dessa vez, não para resolver burocracias, mas por prazer.
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Depois das seletivas nas batalhas da Areninha, Asfalto e Matriz, que ocorrem semanalmente em diferentes áreas da Caucaia, oito MC’s se classificaram para rimar na estreia da Liga Caucaiense de MC’s, na Praça do Anfiteatro: Denji, Fetimic, JH, Yori, Trickster, Killmonger, Han Solo e Caveira.
Valendo R$ 1.000 e uma vaga garantida para rimar no Sana para o campeão, a competição foi dividida em três fases e incrementou modos diferentes dos mais usuais, como rounds de rima à capela (deluxe) e de perguntas e respostas (kickback).
A iniciativa partiu de um MC de batalha de Iparana, Caucaia. Daniel Santos, de 22 anos, atende pelo “vulgo” Niel e é a personificação do adjetivo “desenrolado”. Com a ajuda do pai Maurício – que não é prefeito, mas é tão popular que poderia ser – ele saiu à procura de apoio e patrocínios em estabelecimentos diversos e órgãos públicos.
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Apesar de não ter contado com o apoio da Secretaria de Cultura de Caucaia, em dois meses, ele conseguiu preencher o banner disposto na parede do Anfiteatro, atrás do palco, com cerca de dez logomarcas. Entre os “nãos” e as promessas vãs de “a gente entra em contato”, ele conseguiu garantir uma estrutura de som e luzes, autorização para o espaço, cobertura audiovisual e fotográfica, ajuda de custo para o apresentador, o DJ e os três jurados.
Além disso, claro, a premiação para o campeão e para os colocados em segundo (R$ 500), terceiro e quarto lugar (R$ 250). No espírito do hip hop, os quatro MC's finalistas e semifinalistas da competição – Caveira, Han Solo, Trickster e Yori, o campeão da noite – optaram por dividir o valor igualmente entre eles. Como disse o vencedor em uma de suas rimas daquela noite: "são os meus amigos que dividem os holofotes comigo".
Liga de MC's invadindo a cena
Unindo os recursos à criatividade, Niel investiu em formatos diferentes para que os MC’s do município “sintam que eles podem rimar como os artistas lá em São Paulo, que já participaram de campeonatos grandes, como a Red Bull Francamente e a FMS. É para que eles também se sintam perto daquilo”, pontua.
A inspiração para a criação de uma liga veio diretamente de Recife. Niel Santos descobriu a Liga Trombone de MC’s, fundada e organizada por Maria Dinda, durante uma viagem a Pernambuco. Conversando com ela, encontrou a resposta para a sua busca por “algo novo na cidade”.
“Por que não fazer na minha cidade?”, perguntou-se. Em seguida, respondeu a si mesmo: "Eu vou trazer a liga caucaiense, não só como liga de MC’s, mas também com o propósito de fortalecer a cultura local, dando voz e espaço para os artistas”.
Dito e feito. Além das rimas improvisadas, artistas independentes da cena local se apresentaram na abertura e entre a primeira fase e a final. Caribe e TH abriram o evento, Walkzin fez um show ao final da primeira fase e, para fechar as atrações, o show de Kafé abriu a final que consagrou Yori como campeão da primeira edição da Liga Caucaiense de MC’s.
“Fizeram história, papo de hip hop total mesmo. Toda a cena de Caucaia cresce junto nisso”, declara Yori sobre a iniciativa que acabou despertando o interesse de MC’s de outras áreas de Fortaleza e Região Metropolitana. E, se depender de Niel Santos, deve ser maior em 2026 e ainda expandir-se para uma liga estadual no futuro.
Yori MC: entrega e estoque de rimas
Antes de ter em mãos a folhinha de campeão da Liga, com o desenho de todos os MC’s classificados, Yori chegou ao Anfiteatro de Caucaia com o mesmo sentimento da primeira batalha que teve em sua área, no Conjunto São Domingos, conhecido como Toco. "Será que eu sou bom o suficiente para isso?", insistia o fantasma da dúvida, mas, “como na primeira vez, não me acovardei e fui fazer o que sei: rimas".
Não tem mochila, bolsa ou mala na loja onde trabalha fazendo “o que tiver para fazer”, no centro de Fortaleza, – seja entregando e fiscalizando mercadorias ou repondo estoque – que abafe os sonhos ou abarque a veia artística de Felipe de Abreu Pereira, que já dava seus indícios desde as poesias escritas aos 9 anos de idade.
Desde os 15 anos fazendo freestyle, ele fomenta a cena não só com rimas, mas também com batalhas. Ele já criou a batalha do Cajueiro, que virou batalha da Escola para atrair MC’s de outros bairros para a área, e é um dos fundadores da atual batalha do Asfalto, que ocorre às terças-feiras, a partir das 18h30min, no bairro Nova Metrópole (Jurema).
Hoje aos 25, ele “mais trabalha do que batalha” e segue cultivando a motivação do pequeno Yori: ser sempre melhor do que na batalha anterior. Movido pelo amor ao freestyle, apesar de sentir a força do trabalho das circunstâncias da vida atrasando seu sonho, ele se mantém otimista e segue “vivendo de improviso”.
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