Barroso defende regulação das mídias e que IA não substituirá trabalho humano no Judiciário
Ministro defende que STF age com cautela e que tecnologia precisa de regulação; Também defendeu que não se pode abrir mão da presença humana nas decisões do Judiciário
Durante a palestra “Plataformas Digitais, Inteligência Artificial e os Desafios do Mundo Contemporâneo”, realizada nesta segunda-feira, 21 de julho, na sede da OAB-CE, em Fortaleza, o ministro Luís Roberto Barroso, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), defendeu uma regulação responsável das plataformas digitais, sem comprometer a liberdade de expressão, e reforçou que a inteligência artificial não substituirá o trabalho humano no Judiciário.
Barroso afirmou que o STF tem atuado com moderação em decisões envolvendo redes sociais e liberdade de expressão. Segundo ele, apenas dois casos concretos chegaram à Corte: um envolvendo crítica grosseira a uma professora e outro sobre perfil falso usado para ofensas. Neles, foram fixados três critérios:
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1. Postagens criminosas: Devem ser removidas após simples notificação (vítima, MP ou terceiros);
2. Postagens não criminosas: Só geram remoção obrigatória após decisão judicial, preservando o debate público;
3. Dever de cuidado das plataformas: Algoritmos devem ser programados para impedir a veiculação de crimes graves como pornografia infantil, tráfico de pessoas e terrorismo.
“Essas medidas não comprometem a liberdade de expressão, a menos que se considere pornografia infantil como liberdade de expressão, o que seria um problema conceitual e ético”, destacou o ministro durante sua fala.
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Regulação como instrumento democrático
Para Barroso, a regulação não é uma ameaça à liberdade, mas uma forma de garantir justiça, segurança e equilíbrio:
- No plano econômico: Para assegurar tributação justa, impedir monopólios e proteger autores;
- Na proteção de dados e privacidade: Já consagrada em várias democracias;
- Na proteção da sociedade contra manipulações digitais: Como campanhas coordenadas de desinformação.
Ele destacou que o Código Penal brasileiro já define com precisão crimes contra a democracia, aprovados em 2021. “Não se trata de ‘atentado à democracia’ em termos vagos, mas de tipos penais específicos como abolição violenta do Estado de Direito e violência política”, esclareceu.
IA não substituirá o juiz
Barroso foi enfático ao afirmar que, apesar do avanço das tecnologias e do uso crescente da inteligência artificial no Judiciário, a supervisão humana é indispensável para garantir decisões de qualidade.
“No avanço tecnológico, a gente não pode desprezar, em matéria de direito, a supervisão humana. Mesmo com ferramentas capazes de produzir primeiras versões de decisões, o juiz continua indispensável para a Justiça”, ressaltou.
O Supremo, segundo ele, já utiliza IA para organizar processos e identificar temas repetitivos, o que aumenta a eficiência sem abrir mão do controle humano. “Mais do que uma decisão 100% humana, o cidadão tem direito a uma decisão de qualidade. Se a IA puder ajudar a termos decisões melhores e mais rápidas, ótimo”, concluiu.
A era das plataformas digitais e os desafios democráticos
Barroso alertou para os efeitos da revolução tecnológica na sociedade. Segundo ele, crises políticas são passageiras, mas a inteligência artificial e as novas tecnologias estão redesenhando a comunicação, a economia e até o significado do que é ser humano. Ele lembrou que a internet inicialmente democratizou o acesso à informação, mas hoje enfrenta desafios como:
- Circulação sem filtros editoriais: Facilitando a disseminação de desinformação, discursos de ódio e ataques à reputação;
- Tribalização da vida social e viés de confirmação: Algoritmos reforçam crenças pré-existentes e radicalizam posições, prejudicando o diálogo;
- Crise no jornalismo tradicional: Com impacto na construção de fatos comuns em uma democracia;
- Amplificação de conteúdos nocivos: Como os “comportamentos inautênticos coordenados”, que manipulam artificialmente a circulação de informações.
Barroso defendeu que alguns conteúdos devem ser regulados, independentemente de ideologia: “Não pode haver pornografia infantil, terrorismo, tráfico de pessoas na rede social, são crimes graves que colocam a sociedade em risco”, afirmou.
O ministro contextualizou a era atual como a terceira revolução industrial — a revolução digital — marcada pela digitalização da vida cotidiana: computadores pessoais, smartphones, internet e redes sociais. “Hoje temos um vocabulário novo com palavras como Google, TikTok, Netflix, que mudaram completamente nossa vida adulta”, afirmou.
Essa transformação criou uma nova economia baseada no conhecimento e na informação, em que as empresas mais valiosas do mundo migraram de setores tradicionais como petróleo e automóveis para gigantes da tecnologia.
IA como motor da quarta revolução industrial
Barroso afirmou que vivemos o início da quarta revolução industrial, centrada na inteligência artificial. Embora reconheça os riscos, ele se diz otimista: “A IA é comparável a invenções como o fogo, a roda, a escrita, a eletricidade, o motor de combustão e os avanços da medicina”.
Entre as aplicações positivas, Barroso destacou:
- Melhor capacidade de decisão: A IA armazena e processa informações com mais velocidade que o cérebro humano;
- Revolução na linguagem: Traduções automáticas e personalizadas com timbre de voz para aulas e conteúdos em vários idiomas;
- Avanços na medicina: Diagnósticos por imagem e cirurgias assistidas por robôs já são realidade.