Caps de Fortaleza não suprem demanda, denunciam profissionais e pacientes

Falta de recursos para o setor acarreta em pioras na saúde mental dos pacientes e em suas relações sociais, pessoais e produtivas, explica terapeuta ocupacional

Em meio ao Setembro Amarelo, quando as pessoas são incentivadas a procurar ajuda para a saúde mental, profissionais e usuários envolvidos nos serviços da Rede de Atenção Psicossocial (Raps) do município de Fortaleza denunciam a precarização enfrentada diariamente. Entre as principais reivindicações, estão a carência de profissionais para a alta demanda existente e a falta de infraestrutura para realizar os atendimentos.

José William Crispim Alves é usuário do Centro de Atenção Psicossocial (Caps) desde 2004 e reclama que de 2013 até agora o sistema vem retrocedendo. Um dos problemas que ele relata foi a retirada do serviço de artistas educadores, que trabalhavam com terapeutas ocupacionais e psicólogos para exercitar a arte com os pacientes. “Isso afetou muito, mas a partir daí as coisas começaram a piorar”, lamenta.

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Atualmente, segundo José William, o baixo número de profissionais torna o serviço com menor qualidade e com acesso mais complicado para pessoas que precisam, especialmente com a nova demanda decorrente da pandemia do novo coronavírus. “Esses profissionais estão trabalhando de forma praticamente sub-humana. E com isso, quem sofre são usuários, familiares”, enfatiza.

Somente um dos três Caps 24 horas da Capital, localizado no bairro Cidade 2000, está em funcionamento. Os outros dois estão esperando ajustes para retomar o funcionamento: um deles, localizado na Regional I, está convocando profissionais para a retomada das atividades noturnas, enquanto o outro, na Regional II, aguarda mudança de imóvel para efetivação da habilitação tipo 3, que designa o funcionamento 24 horas. A Prefeitura informa ainda que uma quarta unidade, na Regional de Saúde V, aguarda autorização do Ministério da Saúde.

Crispim, que também é membro do Fórum Cearense da Luta Antimanicomial e vice-presidente do conselho local dos Caps, argumenta ainda que a seleção pública dos profissionais, método de contratação temporária adotado pela Prefeitura de Fortaleza, prejudica a criação de um vínculo com os pacientes.

“O profissional de hoje não será o de amanhã. Até para ele fazer um plano terapêutico não tem como, porque quando ele vai pôr em prática e ver o resultado, já está na época que ele vai sair. Uma das coisas fundamentais no cuidado da saúde mental é o vínculo com o profissional”, insiste ele, que vê como uma das saídas para o problema a convocação do cadastro de reserva de um concurso recente para a área.

Para a promotora de Justiça Ana Cláudia Uchoa, que acompanha o caso em Fortaleza, há muito tempo a quantidade de profissionais atuantes na saúde mental não é satisfatória e a demanda criada pela pandemia tem intensificado esse problema. Ela explica que é necessário a criação de novas vagas de profissionais da saúde mental, mas isso esbarra na obrigação legal para controle dos gastos públicos, conforme alega a Prefeitura de Fortaleza ao órgão estadual.

Uchoa pondera que falta boa vontade política dos gestores de níveis maiores da Capital para que a situação da saúde mental melhore. Ela diz, por exemplo, que o médico Arildo Sousa de Lima, atual coordenador da Célula de Saúde Mental de Fortaleza, tem uma visão boa para a gestão, mas uma melhoria mais representativa depende do prefeito. Isso poderia acontecer, por exemplo, por meio do envio de uma lei à Câmara dos Vereadores, viabilizando novas vagas para o setor, segundo a promotora.

“Saúde mental fica em segundo plano em Fortaleza”, critica conselheira

Para Gicélia Almeida da Silva, membro do Fórum Cearense da Luta Antimanicomial e conselheira do Conselho Regional de Serviço Social (Crass), os serviços públicos de saúde mental em Fortaleza passam por um subfinanciamento e até mesmo desfinanciamento — quando há uma redução dos serviços. Ela reconhece que os recursos destinados para a área são escassos desde a esfera federal, mas pondera que a precariedade se agrava no Ceará quando se trata dos níveis estadual e municipal.

A profissional ainda diz que está acompanhando o Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) entre a Prefeitura de Fortaleza e o Ministério Público, mas argumenta que as ações realizadas pelo poder municipal são feitas “parcialmente ou não são realizadas”. “Fortaleza acaba reproduzindo o que boa parte dos municípios cearenses fazem, de que a saúde mental está em segundo plano”, critica, “até reconheço certo esforço, mas é muito pouco diante da dimensão que essa política exige”.

A falta de recursos para o setor acarreta não só na piora da saúde mental do paciente, mas também de suas relações sociais, pessoais e produtivas dele, conforme explica a terapeuta ocupacional Arismenia Lima, conselheira do Conselho Regional de Fisioterapia e Terapia Ocupacional da 6ª Região Ceará (Crefito 6-CE). Ela enfatiza que os Caps estão trabalhando com uma quantidade insuficiente de profissionais, gerando uma fila de espera de pacientes, que ficam sem a frequência de atendimento adequada.

Arismenia explica que a ideia do Caps é a realização de um atendimento multiprofissional centrado no paciente, com participação de profissionais de diversas áreas, como os psicólogos, enfermeiros, médicos e assistentes sociais. “A proposta é que ele aprenda a ressignificar e transformar suas dores e dificuldades, identificando seus fatores de proteção e de risco”, detalha a profissional. “Também há o papel de montar uma rede de apoio no seu território, para que ele possa se fortalecer diante das dificuldades”, finaliza.

Procurada, a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) disse, em nota, que houve concurso para o setor em 2018, válido até 2022, onde todos os médicos psiquiatras aprovados foram convocados. As vagas ofertadas, porém, não foram todas preenchidas e houve novo concurso em 2020, para mesma especialidade, porém, novamente as vagas não foram totalmente preenchidas. A gestão municipal, no entanto, não se manifestou acerca dos outros profissionais da saúde, que compõem o cadastro de reserva.

A pasta acrescentou ainda que o paciente adulto ou infantil, com sofrimento ou transtorno mental, incluindo aqueles com necessidades decorrentes do uso de álcool e outras drogas, podem buscar atendimento na Capital, nos Caps, que funcionam, de segunda a sexta, das 8 às 17 horas.

Já os pacientes em crise, que necessitem de atendimento noturno, o município oferta acolhimento de urgência e estabilização no Caps localizado no bairro Cidade 2000, com nove leitos, a Santa Casa de Misericórdia com 12 leitos contratualizados para desintoxicação e a Sociedade de Assistência e Proteção à Infância de Fortaleza (SOPAI) com 25 leitos para crianças e adolescentes. Além disso, o Hospital Mental, localizado no bairro Messejana, gerido pelo Governo do Estado do Ceará, atende as demandas que necessitam de internação.

O POVO questionou a secretaria sobre problemas relatados por usuários e profissionais, como a falta de vínculo com profissionais temporários e a fila de espera resultante do aumento da demanda, mas não obteve retorno.

Leia a íntegra da nota da Secretaria Municipal de Fortaleza (SMS):

A Secretaria Municipal da Saúde (SMS) informa que o paciente adulto ou infantil, com sofrimento ou transtorno mental, incluindo aqueles com necessidades decorrentes do uso de álcool e outras drogas, podem buscar atendimento, na capital, nos Centros de Atenção Psicossocial (Caps), que funcionam, de segunda a sexta, de 08h às 17h.

Já para os pacientes em crise, que necessitem de atendimento noturno, o município oferta acolhimento de urgência e estabilização no Caps localizado no bairro Cidade 2000, que possui 09 leitos, a Santa Casa de Misericórdia com 12 leitos contratualizados para desintoxicação e a Sociedade de Assistência e Proteção à Infância de Fortaleza (SOPAI) com 25 leitos para crianças e adolescentes. Além disso, o Hospital Mental, localizado no bairro Messejana, gerido pelo Governo do Estado do Ceará, atende as demandas que necessitam de internação.

Fortaleza possui outro dois Caps autorizados para o funcionamento em 24h. Um localizado na Regional de Saúde I, que atualmente está convocando profissionais para a retomada das atividades noturnas e outro na Regional II de Saúde, em mudança de imóvel para efetivação da habilitação tipo 3 (Caps Geral). Além destes, uma quarta unidade, na Regional de Saúde V, aguarda autorização do Ministério da Saúde.

Além disso, a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) de Fortaleza, é composta ainda por três residências terapêuticas e cinco unidades de acolhimento, contemplando as cinco Regionais de Saúde da Capital

Já em relação aos profissionais, como parte do Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) entre a Prefeitura de Fortaleza e o Ministério Público, houve o concurso em 2018, com certame válido até 2022, onde todos os médicos psiquiatras aprovados foram convocados. As vagas ofertadas, porém, não foram todas preenchidas. Houve novo concurso em 2020, para mesma especialidade, porém, novamente as vagas não foram totalmente preenchidas.

Confira iniciativas de psicoterapias gratuitas no Ceará

- Psicólogos Voluntários do Ceará

Agendamentos pelo Instagram (@psicólogosvoluntariosceara) ou pelo e-mail (psicologosvoluntariosceara@gmail.com).

- Escuta Terapêutica do Projeto Carmens

Agendamentos pelo Instagram (@carmens_comunidade) ou pelo e-mail (carmenscomunidade@gmail.com).

- Conexão Afetiva

Público Alvo: profissionais e colaboradores da área da Saúde, profissionais de segurança, pacientes com Covid e familiares de pacientes com Covid.

Agendamentos pelo Instagram (@plantaopsi_) ou pelo site (https://www.conexaoafetiva.com.br/ ).

- Plantão Coronavírus

Iniciativa do Governo do Ceará. É possível ser atendido pelo WhatsApp (85 98439-0647) ou pelo telefone (0800 275 1475)

- Centro de Atenção Psicossocial (Caps)

É possível ainda receber atendimento psicológico gratuito por meio dos Caps, por meio do Sistema Único de Saúde (SUS). Veja lista de endereços e contatos em Fortaleza:

Regional I

CAPS GERAL

-Centro de Atenção Psicossocial Nise da Silveira – Rua Soares Balcão, 1494- São Gerardo. Telefones: 3105.1119 / 3452.1960

CAPS AD

-Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas Dr. Airton Monte – 24hs
Av. Monsenhor Hélio Campos, 138 – Cristo Redentor (Dentro do CSU e UAPS Virgílio Távora). Telefones: 3433.9513

Regional II

CAPS GERAL

-Caps Geral Dr. Nilson de Moura Fé 24hs – Rua Pinto Madeira, 1550 – Aldeota. Telefones: 3105.2632 / 3105.2638

CAPS AD
– Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas – Dr. José Glauco Bezerra Lobo. Rua Giselda Cysne, s/n – Cidade 2000 (próximo ao Posto de Saúde Rigoberto Romero)

– Centro de Atenção Psicossocial – Álcool e Drogas – Centro – Rua Dona Leopoldina, 08 – Telefone: 3223-63-88

CAPS INFANTIL
– Dr. Marcus Vinicius Ponte de Sousa Infanto Juvenil – Rua Giselda Cysne, 87 – Cidade 2000- próximo ao Posto de Saúde Rigoberto Romero. Telefone: 3249-50-03

Regional III

CAPS GERAL
Prof. Gerardo da Frota Pinto -Rua Francisco Pedro, 1269 – Rodolfo Teófilo. Telefones: 3433.2568 / 3105.3451

CAPS AD
– Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas Caps AD – Rua Frei Marcelino, 1191– Rodolfo Teófilo. Tele3105.3420 / 3105.3722

Regional IV

CAPS GERAL
– Centro de Atenção Psicossocial – Av. Borges de Melo, 201 – Jardim América. Telefones: 3131.1690 / 3494.2765

CAPS AD
– Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas – Caps AD – Alto da Coruja -Rua Betel, 1826, Itaperi. Telefones: 3493.5538

Regional V

CAPS GERAL
-Centro de Atenção Psicossocial Bom Jardim Caps II -Rua Bom Jesus, 940 – Bom Jardim. Telefones: 3245.7956 / 3105.2030

CAPS AD
-Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas -Rua Antônio Nery S/N-Granja Portugal – Telefones: 3105.1023 / 3488.5717

Regional VI

CAPS GERAL
– Centro de Atenção Psicossocial – Rua Carlota Rodrigues, 81 – Messejana. Telefones: 3488.3312 / 3276.2051

CAPS AD
– Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas – Casa Da Liberdade – Rua Salvador Correia de Sá, 1296- Sapiranga. Telefones: 3273.5226 / 3278.7008

CAPS INFANTIL
– Centro de Atenção Psicossocial Infantil Maria Ileuda Verçosa – Capsi – Rua Virgilio Paes, 2.500- Cidade dos Funcionários. Telefones: 3105.1510 / 3105.1326

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