Segundo semestre de 2021 registra aumento de doenças respiratórias em crianças, em Fortaleza
Entre as doenças classificadas como respiratórias nos sistemas de saúde estão sinusite, faringite, laringite e asma
Coleguinhas doentes na sala, maior exposição, ventos mais fortes, época da floração do caju: são alguns dos motivos para que mais crianças tenham procurado assistência médica no segundo semestre de 2021. Entre o mês com menor número de atendimento, em março, e setembro, o período com maior quantidade de crianças atendidas, houve um aumento de mais de 200% nos registros das Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) vinculadas à Secretaria de Saúde do Ceará (Sesa), em Fortaleza.
Os números são das Upa Praia do Futuro, Upa Altran Nunes, Upa Messejana, Upa José Walter, Upa Canindezinho e Upa Conjunto Ceará, todas geridas pelo Estado e administradas pelo Instituto de Gestão e Saúde Hospitalar (ISGH). Os dados apontam que até maio as unidades registraram menos de 100 atendimentos de doenças respiratórias em crianças e adolescentes abaixo de 16 anos. A partir de junho, o número foi crescendo até atingir 209 crianças.
É + que streaming. É arte, cultura e história.
Entre as doenças classificadas como respiratórias nos sistemas de saúde estão sinusite, faringite, laringite e asma. Só de faringite, uma inflamação da faringe causada por vírus ou bactérias, e comum em crianças, a Secretaria Municipal da Saúde (SMS) registrou 824 atendimentos de julho a setembro de 2021 em crianças de 0 a 12 anos. Setembro também com alta nos números: 223 em julho, 278 em agosto e 323 em setembro.
A gestão municipal administra outras seis UPAs, do total de 12, no município de Fortaleza. As unidades são a porta de entrada para atendimento de urgência e emergência, especialmente quando o paciente apresenta dores de cabeça muito fortes, dores no peito, dores nas costas, falta de ar, entre outros sintomas. Já o Hospital Albert Sabin é voltado para atendimentos pediátricos de média e alta complexidade, transferidos de outras unidades.
De acordo com a unidade, os números de 2021, apenas até setembro, já superam os registrados em todo 2020. São 1.213, este ano, ante 1.128 nos 12 meses de 2020. O destaque são para os meses a partir de maio, se mantendo acima dos 100 atendimentos por mês no segundo semestre, tendência não registrada na maioria dos mês no mesmo período do ano passado.
"Aumentou os números em relação ao ano passado e vem aumentando gradativamente. São muitos fatores. A gente tem uma diferença entre os semestres, porque ano passado ainda se tinha muito receio (de sair) e agora, a gente ainda tem, mas é bem menos”, explica o diretor de Cuidado e Saúde interino das UPAs, Tarcylio Esdras. O aumento se refere também, segundo ele, ao crescimento de diagnósticos mais precoces das doenças, um reflexo da pandemia com o olhar mais atento e técnico dos médicos aos sintomas, especialmente por se assimilarem com os da Covid-19.
Alguns dos sintomas de infecção do trato respiratório superior, mais comuns segundo o médico, são garganta inflamada ou irritada, espirros, nariz entupido e tosse, também vistas na Covid-19. De acordo com a Sesa, os sinais e sintomas clínicos são principalmente respiratórios, semelhantes aos de um resfriado comum. Em casos mais graves, podem também causar infecção do trato respiratório inferior, como as pneumonias. Os principais sintomas são febre, tosse, coriza e dificuldade para respirar.
“Para se ter uma medida mais fiel (à realidade) do número de pacientes com síndromes respiratórias vamos ter que esperar mais uns meses para saber se é só um reflexo desse retorno da pandemia ou se está aumentando realmente em relação ao ano passado”, ressalta o médico. O profissional deixa o alerta quanto à automedicação. A melhor indicação, segundo ele é: “na dúvida, não faça”. "Às vezes, começar o medicamento em casa, como antibióticos, piora o quadro clínico da criança. A gente entende que a intenção é boa, mas nem sempre é preciso”, pontua ainda.
Infecções das vias aéreas superiores
Os sintomas ocorrem principalmente no nariz e garganta. As infecções virais das vias aéreas superiores podem ocorrer em qualquer idade e incluem o resfriado comum e a gripe.
Tipos: resfriado, faringite e sinusite
Tratamento: Repouso e líquidos, medicamentos para aliviar a febre e dor
Infecções das vias aéreas inferiores
Os sintomas costumam se diferenciar bastante de doenças do trato superior. Neste caso, os principais sintomas podem ser febre mais alta, tosse produtiva(produção de secreção), cansaço e dispnéia (respiração difícil ou ofegante). Pessoas dos extremos, idosos e crianças menores, costumam ser o mais afetados.
Tipos: pneumonia, bronquite e asma
Tratamento: Às vezes, é preciso internamento, uso de antibióticos
Exposição e volta às aulas
“A gente observou no ano passado na emergência e consultas eletivas que nossas crianças adoeceram muito pouco. A gente viu a demanda de doenças respiratórias bem menores, porque as crianças estavam guardadas, protegidas no ambiente domiciliar. Sem sair por conta do isolamento social”, explica ainda a pediatra Vanuza Chagas. A ressalta que o adoecimento após alguns dias o retorno escolar é considerado “esperado”, porque o sistema imunológico dos pequenos está reagindo a maior exposição, com o contato dos coleguinhas e com o ambiente novo.
“Há na literatura médica do pediatra, do consultório, que chamamos de síndromes da creche. Começa a escola, aumenta esses casos respiratórios, na maioria viral”, pontua. Com isso, a indicação é manter a atenção redobrada quanto aos sintomas dos filhos e também dos outros alunos da sala.
“Ficou doente, não pode ir para a escola. Não podemos esquecer também que ainda estamos em uma pandemia, e as crianças (menores) estão desprotegidas sem vacinação. É um risco e qualquer quadro gripal não pode ser descartado da Covid-19. É um risco de contágio para as outras crianças”. Segundo a médica, é preciso observar a evolução de sintomas como febre, desconforto respiratório e abatimento geral e, com uma possível piora, procurar o sistema médico.
A indicação de crianças saudáveis, mas que em suas salas de aula houve casos recentes de doenças respiratórias, é a observação. Com qualquer sintoma mais leve, como coriza e febre baixa, a criança já não deve ser enviada à escola. “As escolas também têm que ficar vigilantes, precisam ficar alertas para orientar os pais para que crianças doenças não estejam na escola. É evitar que essa criança doente frequente a escola e possa fazer vírus circular no ambiente”, ressalta a pediatra.
A médica alerta também o aumento da doença de mão-pé-boca e dermatite atópica nas últimas semanas em seus atendimentos. A condição de mão-pé-boca é causada pelo vírus Coxsackie da família dos enterovírus que habitam normalmente o sistema digestivo e também podem provocar estomatites, um tipo de lesão como a afta, que afeta a mucosa da boca. Embora possa acometer também os adultos, ela é mais comum na infância, antes dos cinco anos de idade, de acordo com o Ministério da Saúde.
“É altamente contagiosa. Nós temos surtos em creches e por isso esse paciente doente precisa ficar em casa. Em maio, observamos um aumento no número de casos e agora estamos vendo novamente. Justamente por esse retorno e a frequência diária das crianças, pode haver a transmissão”, pontua ainda. Em geral, como ocorre com outras infecções por vírus, a doença regride espontaneamente depois de alguns dias.
Sinais característicos da doença mão-pé-boca:
- febre alta nos dias que antecedem o surgimento das lesões;
- aparecimento, na boca, amídalas e faringe, de manchas vermelhas com vesículas branco-acinzentadas
- no centro que podem evoluir para ulcerações muito dolorosas;
- erupção de pequenas bolhas em geral nas palmas das mãos e nas plantas dos pés, mas que pode
- ocorrer também nas nádegas e na região genital;
- mal-estar, falta de apetite, vômitos e diarreia;
- por causa da dor, surgem dificuldade para engolir e muita salivação.
Fonte: Ministério da Saúde
Já a dermatite atópica é uma doença genética, crônica e onde a coceira e a pele seca são as principais características. Acomete principalmente as grandes dobras do corpo como braços, joelhos e pescoço. De acordo com a Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD), a condição pode ser acompanhada de outras formas de atopia como asma, rinite ou conjuntivite, embora essas não precisem ocorrer ao mesmo tempo. Alguns fatores podem agravar ou desencadear a dermatite atópica, como: sudorese excessiva (ambiente quente, variações repentinas de temperatura e roupas quentes) e baixa umidade no ambiente, além de estresse. A doença não é considerada contagiosa.
A médica ressalta, entretanto, que o retorno à escola é um processo positivo e importante para as crianças. Segundo ela, esse adoecimento com a volta ao ambiente escolar é considerado “normal”, especialmente após um longo período de isolamento. O momento pede apenas observação e segurança.” Esse retorno é essencial e importante para o desenvolvimento da criança. A escola tem um papel fundamental nesse desenvolvimento infantil, no brincar, na interação com outras crianças, no processo de socialização e no desenvolvimento da fala”, defende ela.
O médico Tarcylio Esdras ressalta ainda que incentivar, dependendo, claro, da idade do pequeno e o grau de entendimento, as crianças aos cuidados de prevenção a doenças, pode ajudar nesse processo escolar. “Quando mais cedo a criança consegue compreender e participar desse processo de prevenção, e autocuidado, é proveitoso não só para ela, mas para a família, para as escolas e os próprios coleguinhas”, pontua.
Mais ventos e caju no segundo semestre
A pediatra Vanuza Chagas ressalta que nessa época do ano é comum o aumento de doenças respiratórias, especialmente em crianças. “A gente vê essa época do ano no nosso estado pelo aumento dos ventos. Também pela floração do caju, já que aqui é uma região rica em cajueiros . Esse pólen acaba sensibilizando mais as crianças. Vento, poeira, fungos, pólen, uma série de fatores que aumentam os quadros de rinite, faringite, laringite e crises de asma, além de complicações de quadros de sinusite”, explica a médica.
A previsão da Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos (Funceme) era que desde agosto haveria o aumento dos ventos, com rajadas mais significativas. Entre os fatores, para isso há o deslocamento do sistema de alta pressão atmosférica do Oceano Atlântico Sul em direção ao Nordeste do País e a redução da nebulosidade, por exemplo.
“É uma época que floresce mais e a mudança no tempo. Alguns crianças já têm predisposição à alergia à flor do caju. Pode ser isso, mas eu ressalto que é multifatorial: é o clima, é o período pós pandemia, tem o olhar médico, são vários fatores”, ressalta Esdras.
Junto com a falta de chuva e com o aumento dos ventos, o interior do Estado vem apresentando ainda baixa umidade relativa do ar, segundo o indicativo da Funceme desde as semanas de setembro. A umidade relativa e a temperatura do ar estão inversamente relacionadas uma à outra, de forma que nos horários mais quentes do dia, principalmente no início da tarde, se tenha a menor umidade relativa do ar.
No final de setembro, a Funceme chegou a emitir alerta para baixa umidade, na região Centro-Sul, com valores iguais ou inferiores a 20%. Nestes casos, segundo a Organização Mundial da Saúde, o indicativo é beber bastante água, especialmente crianças e idosos.