Professora da Unilab é selecionada para coordenar pesquisa na França

Professora da Unilab é selecionada para coordenar pesquisa na França

Única brasileira selecionada pelo Programa DEA 2025, Luana Antunes fará pesquisas sobre escritoras negras na França

A professora e pesquisadora Luana Antunes Costa do Instituto de Linguagens e Literaturas da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-brasileira (Unilab/CE), em Redenção, foi selecionada pela renomada Fondation Maison des Science de l’Homme (FMSH) (Fundação Casa das Ciências Humanas, em tradução livre), criado em 1975 pelo historiador francês Fernand Paul Achille Braudel.

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Luana Antunes participou do processo seletivo do edital global, Programa de Diretores de Pesquisa Associados 2025 (DEA). Personalidades científicas de diversos países participaram do edita, porém, apenas dez cientistas foram selecionados.

A professora foi a única pesquisadora brasileira contemplada nesta edição do Programa DEA.

Ela desenvolverá suas pesquisas no Laboratório “As Áfricas do mundo” do Instituto de Estudos Políticos de Bordeaux (Sciences Po-Bordeaux), tendo como interlocutor e referente, o Professor Doutor Emérito Michel Cahen, historiador especialista em História dos países africanos lusófonos.

Sua pesquisa atual pretende trazer ao público o pensamento, a literatura e as visões de mundo propostos por autoras do Caribe e de Cabo Verde, arquipélago africano, dando continuidade, assim, aos trabalhos desenvolvidos em seu pós-doutoramento na Sorbonne Université (Paris): “Cartografias de Mulheres da África Global: margens femininas do movimento da negritude”.

Desde 2013, Luana Antunes realiza pesquisas de campo e projetos de cooperação internacional, especialmente como professora visitante na França, Martinica, Portugal, Moçambique e Guiana.

Seu trabalho se concentra em estudos comparativos de literaturas africanas lusófonas e francófonas, literaturas afro-diaspóricas, literatura e teoria produzidas por mulheres negras, relações entre literatura e política, epistemologias feministas contra-hegemônicas.

Pelo Programa DEA 2025, a professora terá fomento para a sua mobilidade acadêmica, contudo ela destaca o apoio ainda raro destinado a mulheres pesquisadoras oriundas de territórios do Sul-global e das regiões do Norte e Nordeste brasileiros: “Infelizmente, no Brasil, ainda não tenho outras fontes de financiamento para a realização da pesquisa”, lamenta a professora Luana Antunes.

Durante sua estadia de pesquisa na França, ela pretende desenvolver entrevistas, pesquisas de arquivo e organizar um evento acadêmico interligando pesquisadores de instituições brasileiras e francesas em
torno do tema de sua pesquisa.

Contribuição das mulheres negras para o conhecimento

O projeto de pesquisa selecionado, “Crioulização, crioulidades e outras camuflagens na obra de escritoras afro-diaspóricas - Uma pesquisa em Estudos Comparados (Martinica e Cabo Verde)”, aprofunda-se na contribuição das mulheres negras, na diáspora, para a construção de conhecimento sobre os processos históricos e políticos de países de origem, mas também sobre o mundo, um tema cada vez mais contemporâneo, conforme aponta Luana.

Dois nomes são o foco da pesquisadora: a escritora, professora, ativista anticolonial e feminista Suzanne Roussy Césaire, nascida na Martinica, um departamento ultramarino da França, que escreve sobretudo nos anos 1940, durante a Segunda Guerra Mundial, e a escritora contemporânea, caboverdiana Dina Salústia, cuja literatura dá voz às mulheres e às crianças, desde suas primeiras publicações nos anos 1980.

Ambas as autoras, cada uma à sua época, pensaram e escreveram sobre os fenômenos
históricos e sociais da “crioulização” em suas sociedades, caracterizada pela recombinação de fragmentos das culturas e dos povos que as formaram:

“Essas mulheres-intelectuais não olham de forma romântica para esse processo. Elas pensam os processos de violências que levaram essas populações a serem construídas dessa forma. E o primeiro processo de violência é a colonização, sendo movimentada e movimentando o processo escravizatório de diferentes grupos, como, no caso do Brasil, as populações indígenas e as populações africanas traficadas para cá”, comenta a pesquisadora, que lança a si e ao mundo uma pergunta: quem lê o texto dessas mulheres?

Ciências produzidas por mulheres

Para Luana Antunes, as ciências, em suas diversas formas, produzidas por mulheres são um aspecto histórico fundamental da pesquisa:

“Não há como pensar sobre essa realidade sem colocar no centro do debate a mulher, cujo corpo é a fábrica da escravização por produzir pessoas. Se a Europa e outros territórios do Norte Global se enriqueceram por conta do processo colonizatório da escravidão, o produto humano mercantilizado era gerido por uma mulher negra".

"Tanto no Brasil, como nos territórios dessas escritoras, as mulheres são majoritárias e são cuidadoras e chefes das famílias, permanecendo, ainda assim, na base das precarizações. Devemos reconhecer aí um padrão!”, argumenta.

A pesquisadora entende e ressalta a relevância de seu trabalho como uma resistência à colonialidade, conceito contemporâneo para a continuidade das estruturas e das lógicas coloniais na organização social até a atualidade.

Após as seis semanas de pesquisa sobre as “intelectuais das ilhas”, a professora Luana Antunes segue em licença capacitação, acompanhando congressos e eventos para, ao final, desenvolver uma última e importante atividade: ela é a professora convidada do Programa Professor Convidado 2025 do Instituto de Estudos Políticos de Bordeaux.

Ela ministrará o curso “Epistemologias do Black Feminism e do Feminismo Negro Brasileiro”, que pretende abordar obras de grandes pensadoras, militantes negras e feministas, como Angela Davis, bell hooks, Audre Lorde, Lélia Gonzalez, Carla Akotirene, Luiza Barrios, Sueli Carneiro, Djamila Ribeiro. As traduções para o francês, língua em que o curso se dará, ocorreram na tessitura da sororidade política e da irmandade entre mulheres.

“Algumas das tradutoras nem conheceram as autoras, mas se engajaram para que o texto dessas mulheres circulassem. É um véu, uma teia de aranhas que se revela quando bate a luz e que segue em construção”, comenta Luana, animada com a futura turma de alunos e com a possibilidade de ser um corpo feminino, negro, migrante, mãe-solo e de cabelo armado como um símbolo visual da negritude dentro da academia.

“Nosso corpo comunica, pois é canal de todo esse conhecimento. Como nos ensina Conceição Evaristo, somos a materialização da escrevivência”, finaliza.

Luana Antunes é professora adjunta de Literaturas africanas de língua portuguesa e Literatura e cultura afro-brasileira do Instituto de Linguagens e Literaturas, na Universidade da Integração Internacional da Lusófona Afro-brasileira (UNILAB/Ce). Doutora em Letras com Estudos Comparados pela USP e mestre em Letras – Literatura Portuguesa e Literaturas africanas de língua portuguesa pela UFF.

Ela é Líder 1 do grupo de pesquisa “Sobre o corpo feminino – Literaturas africanas e afro-brasileiras” (UNILAB/CNPq). Suas pesquisas recentes se concentram na área de Estudos Comparados e na produção literária e das ações políticas de autoras negras e africanas dos territórios da África Global (sécs. XX e XXI).

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