Mudanças climáticas podem reduzir presença de mandiocas silvestres no NE

Estudo observou os cenários para 11 espécies da planta até 2100; mudanças podem tornar regiões menos adequadas para a cultura

Mais da metade das espécies de mandioca silvestre presentes no Nordeste pode ter sua área de presença reduzida até 2100, de acordo com um estudo realizado pelas universidades federais Rural de Pernambuco (UFRPE) e do Recôncavo Baiano (UFRB), além da Universidade Estadual de Santa Cruz (Uesc). A pesquisa, divulgada nesta sexta-feira, 4, na edição trimestral dos Anais da Academia Brasileira de Ciências, aponta que até 54% das espécies nativas podem ser afetadas, com parte delas sendo completamente extintas.

Os resultados foram obtidos a partir da análise de 11 espécies silvestres nativas da região, a partir da simulação de seis variáveis climáticas, como precipitação anual, chuvas nos meses mais secos e úmidos e temperatura média diária e anual. Os dados foram combinados para prever onde as mandiocas terão as condições necessárias para viver até o século XXII.

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Dois cenários foram criados com base nessas simulações, um otimista e um pessimista. Nas melhores condições encontradas pelo estudo, cinco das espécies analisadas podem sofrer redução na faixa de distribuição até 2100. Já na simulação mais preocupante, a expectativa é de que seis espécies sejam prejudicadas pelas mudanças climáticas.

Em ambos, quatro dessas espécies podem experimentar redução total de suas áreas de ocorrência. A bióloga e pesquisadora da UFRPE, Karen Yuliana Suarez-Contento, explica que essa redução pode ser atribuída ao fato de os eventos climáticos estarem se tornando cada vez mais extremos.

"A gente observou que as mudanças na precipitação e na temperatura são as que mais vão afetar as ocorrências dessas espécies. A previsão é que as temporadas de chuva sejam com ainda mais chuva, e as temporadas de seca sejam com ainda mais seca", explica a pesquisadora.

Os prejuízos causados por esses cenários climáticos não afetariam apenas a mandioca silvestre, mas também a cultivada, comumente utilizada para consumo humano. Segundo Karen, o sumiço da espécie silvestre pode prejudicar a mandioca que nós comemos, podendo afetar a sua ocorrência também no futuro.

"Algum dia elas [espécies silvestres] poderiam ser usadas para melhoramento da mandioca cultivada, porque essas espécies poderiam ter algumas adaptações ecológicas, que ajudariam a suportar algumas condições climáticas adversas, que talvez a mandioca [cultivada] não consiga", acrescenta.

A planta também é parte importante na diversidade das regiões de caatinga e serrado, servindo de alimento e fonte de nutrientes para diversas espécies de animais, como bovinos, caprinos, ovinos, aves e suínos, que extraem nutrientes das raízes e hastes (parte aérea) da mandioca.

Outra preocupação apontada no estudo é a possibilidade de que essas mudanças climáticas possam afetar não só a mandioca, mas também outros tipos de culturas silvestres como o arroz, o milho e o feijão. As causas seriam semelhantes às da mandioca.

"Essa é a tendência para essas espécies. As mudanças climáticas estão sendo extremas, então os lugares que são mais quentes vão ficar ainda mais quentes, os lugares que têm mais chuva vão ter ainda mais chuva. Isso afeta qualquer tipo de planta porque as condições ótimas para essas plantas crescerem vão mudar", pontua Suarez-Contento.

A cerca de 70 anos do prazo estipulado pelo estudo, os pesquisadores apontam a necessidade de medidas imediatas para conter os efeitos das mudanças climáticas. Dentre as soluções, estão a criação e a expansão de áreas protegidas, o estabelecimento de corredores ecológicos, além da restauração de áreas degradadas.

"Para algumas das espécies essas áreas protegidas são muito importantes para a conservação. Então, a expansão dessas áreas protegidas e talvez a restauração de algumas áreas que seriam degradas, acho que seria algo importante para conservar essas espécies, além da educação ambiental também. As comunidades são as que têm contato direto com essas espécies e elas que podem ajudar a protegê-las", conclui.

Mandioca cultivada x mandioca silvestre

A principal diferença entre as mandiocas silvestres em relação às cultivadas está na sua morfologia e uso. A planta silvestre possui raízes mais curtas e mais substâncias tóxicas, enquanto a cultivada tem raízes mais longas e menor presença de componentes tóxicos.

A diferenciação também se dá nas aplicações de ambas as espécies, pois a silvestre costuma ser utilizada para a alimentação de animais e extração de borracha, enquanto a cultivada é em maioria usada para consumo humano.

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