Lembrai-vos do fascismo
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Lembrai-vos do fascismo

2018-09-02 00:00:00

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) indeferiu, atropeladamente, a candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, seguindo a lógica da corrente doutrinária punitivista e de viés político que se apoderou de parte do Judiciário e tem atropelado a Constituição, segundo abalizados juristas. Isso vem prevalecendo no Judiciário desde o julgamento do Mensalão do PT, prosseguiu com o impeachment sem crime de responsabilidade da presidente Dilma Rousseff e levou à condenação e prisão, por meios questionados internacionalmente, o candidato do PT, líder absoluto nas pesquisas eleitorais que, segundo especialistas, tem tudo para ser eleito no primeiro turno. O que traduziria o desejo expresso da maioria do povo brasileiro - fonte da legitimidade do poder político - de elegê-lo.

 

Até a ONU, através de seu Comitê de Direitos Humanos, depois de acionada, percebeu que algo estranho estava acontecendo (percepção que se espalha pela comunidade internacional). E concedeu uma medida cautelar, de efeito obrigatório, para que os direitos do ex-presidente a concorrer às eleições fossem garantidos até o resultado final do julgamento. O TSE resolveu desacatar o pacto assinado pelo Brasil e apostar na ilegalidade internacional. Abriu, assim, condições para que o candidato da extrema direita, Jair Bolsonaro (PSL), se desvencilhe de seu maior concorrente a quem não pode vencer nas urnas.

 

Quem assistiu à entrevista de Bolsonaro ao Jornal Nacional não tem dúvidas do perigo que ele representa para a democracia. Que ele pretenda prosseguir com o programa de Michel Temer, de modo ainda mais radical (ao igual que Alckmin, Álvaro Dias, Amoedo, Meireles), é problema seu. No entanto, quando atravessa a linha da legalidade, ameaça o Estado Democrático de Direito com eventual intervenção militar, faz apologia da violência policial, exalta a ditadura, louva torturadores, ataca os direitos humanos e rejeita os tratados internacionais, nessa área, seria caso para o Ministério Público. Estarrecedor é ver parte da elite econômica incensando o capitão e pavimentando seu caminho para o poder (apesar de ser uma aberração), desde que ele impeça a volta de um governo de esquerda. Repete-se o cenário dos anos 30, na Alemanha, quando a nata do empresariado local incentivou o fascismo, impelindo-o à destruição da democracia alemã com o mesmo propósito. Segundo o presidenciável Ciro Gomes (PDT), entrevistado anterior do JN, os eufóricos empresários que aplaudiram Bolsonaro de pé (!), na Fiesp - templo do baronato paulista - "sequer taparam o nariz".

 

Será que o Brasil aguentaria mais um governo ilegítimo, fruto de artimanha golpista? Até onde vai o desdenho à soberania popular? É espantoso como se tenta fazer passar a ideia de que estamos vivenciando uma eleição "normal" e seguindo o "figurino democrático" quando, na verdade, se vive um golpe branco, continuado, e a exceção se espalha pelo aparato institucional brasileiro, a tal ponto que segmentos do Judiciário se tornaram o centro do poder, sem mandato popular para isso, sobrepondo-se ao cidadão (sujeito da soberania popular) e selecionando os candidatos em quem este pode votar ou não. Mais: o próprio STF acaba de sacramentar um dos objetivos fundamentais da guerra empreendida pelo golpe contra os trabalhadores: a terceirização irrestrita do trabalho, que entrega o assalariado, de pés e mãos atados, ao patrão, fazendo o País regredir ao século XIX. E isso logo depois de os próprios juízes federais receberem polpudo, acintoso e exclusivo reajuste salarial.

 

É pedagógico recordar como certos setores (não todos) da Justiça brasileira têm apresentado um histórico antidemocrático. Basta citar o episódio da entrega da militante alemã Olga Benário ("Maria Prestes"), à Alemanha nazista. Ela estava grávida de um brasileiro: o líder comunista Luiz Carlos Prestes, igualmente preso. Antifascista, judia, temia-se que os nazistas a executassem. De nada valeram os questionamentos jurídicos levantados por seu advogado: os ministros da Corte suprema recusaram-se a enfrentá-los, quando provocados. Por maioria de votos, simplesmente não conheceram dos pedidos

 

Olga foi entregue aos nazistas e levada para o campo de concentração de Ravensbrück. Lá, deu à luz a Anita, que foi resgatada pela avó paterna, depois de uma memorável campanha internacional. No campo de concentração, ela trabalhou como escrava para a Siemens e servindo em experimentos médicos. Dali seria transferida, na Páscoa de 1942, para destino incerto, com outras prisioneiras. Depois, se soube de sua execução em Bernburg.

 

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