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Rede invisível

2017-01-21 17:00:00

A morte do relator da Lava Jato no STF, ministro Teori Zavascki, deixou o País perplexo e atordoado. Mais uma dessas tragédias que mexem com o imaginário do povo brasileiro e aguçam o sentimento de desamparo diante de um destino aparentemente padrasto. A sensação é de que algo não se encaixa. Tal como aquele impeachment sem crime de responsabilidade, que parece ter aberto todas as comportas do inferno sobre a Nação e seu povo. Mal se salta uma fogueira, e uma fornalha inteira se abre diante do cidadão atônito. Até quando? Que pelo menos a integridade, a dignidade silenciosa e a firme coragem do ministro Teori subsistam como uma rede invisível de proteção a evitar que o Brasil caia de vez no abismo.

VITÓRIA DE PIRRO
O procurador geral da República, Rodrigo Janot, foi um dos surpreendentes convidados pelo Fórum de Davos – a cúpula capitalista que se reúne periodicamente para traçar o destino do mundo e checar se algo tenta escapar do cabresto do sistema. Janot confessou candidamente que foi lá para desfazer a má impressão de que a Lava Jato seria anticapitalista e enfatizar que, na verdade, sua atuação é “pró-mercado”. Ora, não precisava se dar a esse trabalho: quem hoje tem dúvidas sobre isso, no Brasil e no mundo? Apesar de ter obtido ganhos dignos de aplauso, como a descoberta de um grande esquema de corrupção envolvendo empresários, políticos e servidores públicos, e, seletivamente – frise-se - levado à prisão alguns empreiteiros e políticos, isso virou uma vitória de Pirro quando a Lava Jato, sem necessidade, desmontou as pilastras estratégicas do desenvolvimento nacional, erguidas com tanto sacrifício desde a Era Vargas e que tinham sido reforçadas por Lula, depois do estrago cometido pela privataria tucana.

ATENTADO
É bem verdade que o projeto nacional já tinha sido apunhalado no coração quando as ações da Petrobras passaram a ser vendidas na Bolsa de Nova York, durante o governo FHC, abrindo brechas para que o principal instrumento de viabilização da soberania brasileira – a Petrobras - ficasse sob jurisdição estrangeira. Já se viu, por acaso, China, Rússia ou Índia (nações do porte do Brasil e parceiros no Brics) fazerem algo parecido, indagam os críticos? Jamais deram um tiro desse tipo no pé. Lula errou ao não desmontar esse Cavalo de Troia. Mas, pelo menos, estancou o processo de entrega do patrimônio nacional e recuperou a ideia de um projeto soberano de Nação, capaz de colocar o Brasil entre as potências emergentes do século XXI.

DESPREPARO
Infelizmente, a incursão desastrada e despreparada da Lava Jato, nas instâncias econômico-estratégicas da Nação, pôs tudo por terra e o mercado financeiro internacional terminou obtendo a grande chance, há muito esperada, de submeter o Brasil totalmente aos seus ditames, acabando com qualquer veleidade de autonomia nacional. Daí ser sem nexo a preocupação do procurador brasileiro com alguma recriminação da casta financeira mundial: bem ao contrário, o Fórum de Davos está satisfeitíssimo com o desempenho da República de Curitiba. Na verdade, está encantado, e quer que sirva de modelo para outros países com pretensões “antiquadas” de soberania.

MISSIONÁRIOS
Bem diferente é como os Estados Unidos e as demais potências econômicas tratam suas empresas estratégicas flagradas em algum delito. Jamais permitem que sejam levadas à bancarrota ou emparedadas por tribunais estrangeiros, em nome de alguma insólita campanha de moralização, que o mundo político e dos negócios sabe ser hipócrita. Eles têm a exata noção de como se firmaram e se afirmaram no mundo. Basta abrir qualquer publicação com o histórico desses impérios econômicos empresariais. Lá, empresas flagradas em atos de corrupção com o Estado pagam altas multas e são reconduzidas rapidamente ao mercado, para que não se inviabilizem e deixem de criar postos de trabalho e de arrecadarem para os cofres públicos. Tudo isso sem prejuízo dos processos penais na Justiça contra seus dirigentes. No Brasil, no entanto, matam-se as “galinhas de ovos de ouro” para agradar os concorrentes estrangeiros. Estes, por seu turno, vibram e até outorgam comendas aos bravos missionários da anticorrupção, por manterem as grandes empresas de seus próprios países na lona e abrirem mão de seus recursos estratégicos.

LEGADO
Um levantamento do banco Crédit Suisse constatou que o Brasil tem 245 mil pessoas incluídas entre o 1% mais rico do mundo, e 24 milhões de pessoas com renda abaixo de US$ 249 anuais. O número de milionários brasileiros subiu de 162 mil para 172 mil, em 2016. Já a Oxfam publicou que somente oito cidadãos do planeta detêm o correspondente aos bens somados de 3,8 bilhões de pessoas. E que desde 2015, o 1% mais rico acumula mais dinheiro do que o resto do planeta somado: https://bit.do/c5f6L . É essa a sociedade que Davos e nossos ilustres defensores do mercado querem para o Brasil. Elas desaguam em Guantánamos, Abu-Ghraibs ou nas degolas dos presídios brasileiros. Quando não, no Estado Islâmico. 

 

Por Valdemar Menezes

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