Morte da mãe, seleção e artilheiro do Porto: conheça a trajetória do atacante cearense Evanilson

Antes de ganhar protagonismo, o ofensivo de 24 anos passou por uma infância tímida e humilde, pensou em parar com o esporte após perder a mãe e enfrentou diversos percalços

Um rosto cearense tem se tornado cada vez mais frequente nas capas dos jornais portugueses. Com 19 tentos anotados em 28 partidas na atual temporada, o atacante Evanilson, esperança de gols do Porto, tem sido destaque nos campos europeus em 2024.

O jogador entra em campo na tarde desta quarta-feira, 21, pela Liga dos Campeões da Europa, para enfrentar o Arsenal, da Inglaterra, nas oitavas de final da competição.

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Em conversa exclusiva com o Esportes O POVO, o primeiro treinador de Evanilson – quando ainda era apenas uma criança tentando a sorte no esporte pelas escolinhas de Fortaleza – José Neto Maia, falou sobre a infância do atleta, sua ida para o Fluminense, o trágico falecimento de sua mãe quando ainda estava na base e os primeiros destaques do atleta quando atuava sob seu comando no Estação Antônio Bezerra, clube cearense famoso por revelar grandes atletas.

Antes de ganhar tal protagonismo, o ofensivo de 24 anos passou por uma infância tímida e humilde, pensou em abandonar o esporte após a morte de dona Madalena e enfrentou diversos percalços, mas superou as dificuldades através de talento perseverança e braços acolhedores e cultivar amores para além do futebol.

Os primeiros rabiscos com ou sem a bola no pé

Antes de distribuir canetas, dar passes de letra ou marcar pinturas que poderiam estar num quadro, Evanilson tinha uma paixão fora do futebol: o desenho. Segundo seu primeiro treinador, o atacante chegou ao Estação muito tímido, não gostava de puxar assunto, às vezes preferia se distanciar e fazer suas ilustrações.

Seus amigos mais próximos dizem que ele tem um talento raro para colocar sentimento no papel.

Entre as artes estampadas em diferentes lugares, que traspassaram seu caderno, estavam as três cores que representavam o primeiro clube a ganhar sua torcida e também o rosto da própria mãe, com quem o ofensivo tinha uma relação muito próxima.

“Evanilson chegou ao Estação com 11 para 12 anos, acompanhado pelo pai dele, seu Valdeci, conhecido como senhor Bibi. Era um garoto muito tímido, que até hoje ainda tem isso. Era um garoto triste, na dele, calado. Com o tempo fora do Brasil, essa timidez vai passando, mas ainda é uma característica dele”, disse José Neto.

Antes do Estação, Evanilson passou pela escolinha do Fortaleza, onde era treinado pelo seu pai, ainda jogando na quadra, mas se encontrou mesmo no clube do bairro Antônio Bezerra.

José relata que quando chegou, ainda criança, ele já era muito talentoso, mas que teve que desenvolver diversos aspectos.

“Ele chegou e era um garoto tímido, franzino, eu brincava sempre dizendo que ele só tinha orelha, mas eu coloquei para treinar e vi que era muito talentoso. Era de poucas palavras, mas era diferente”, disse Neto Maia, que completou: “Tinha doze anos e foi titular do sub-13, com atletas um ano mais velhos. No ano seguinte, foi campeão cearense, eleito o melhor jogador da competição”.

Sobre o trabalho de formação do Estação, o técnico comentou: “Temos o trabalho de revelar talento. O Estação é um provedor. Ele não forma jogador para ele, não tem profissional, ele forma para outros clubes”.

Alguns outros jogadores que passaram pelo técnico José Neto Maia: Osvaldo, Mota, Pio e Daniel, este que foi relacionado pelo Fluminense para a final da Libertadores de 2023.

Conquista seguida de angústia: viagem ao Rio para jogar no Fluminense e morte da própria mãe

Além de treinador do Estação Antônio Bezerra, José Neto também atuava como “olheiro” do Fluminense, responsável por captar jogadores para as categorias de base do clube carioca. Assim se deu o caminho de Evanilson.

“A ida dele ao Fluminense se deu pelo excelente campeonato cearense que fez [no sub-13]. Ele foi campeão, fez um golaço na final contra o Ceará, e era um jogador que chamava muita atenção”, disse.

Evanilson era o representante do próprio sonho e também do sonho de seu pai, que brigou pela sua carreira com unhas e dentes desde que o filho demonstrou ter aptidão com o esporte. Quando teve a ideia de levá-lo ao Rio de Janeiro, Neto imaginou receber resistência por parte da família, algo que não aconteceu.

 

“Não tivemos nenhum problema. O pai sempre apoiou, ele era o treinador dele quando era da escolinha do Fortaleza, e era um sonho.”

Porém, claro, despedidas são sempre dolorosas. Evanilson sonhava em dar uma casa para a mãe e melhores condições para a família. A primeira viagem foi movida a lágrimas, tanto de saudade premeditada como sonhos que poderiam ser alcançados por uma família que muitas vezes careceu de dinheiro, mas nunca de apoio de uns aos outros ou amor dentro de casa.

O treinador conta que, quando levou Evanilson para os testes no Fluminense, ele foi acompanhado de mais seis atletas, porém, foi o único aprovado.

Quando chegou ao Rio de Janeiro, aí sim encontrou as primeiras dificuldades.

“Um garoto humilde, com pouca comunicação, vivendo coisas diferentes em uma cidade grande, em um time grande como o Fluminense”, detalhou José, que contou ainda que, mesmo antes de completar 14 anos, Evanilson passou a morar no alojamento do clube por ser “acima da média”.

Segundo ele, Evanilson só não jogou como zagueiro e goleiro na base, de resto, atuou em todas as posições possíveis, incluindo lateral e volante, pois tentavam aproveitar sua velocidade.

A fase mais difícil da vida de Evanilson veio em 2017. Morando no Rio de Janeiro, o atacante recebeu a notícia da morte de sua mãe, com quem tinha uma ligação muito forte. Muitas vezes, a inspiração de seus desenhos. A todo momento, a inspiração de sua vida, que o fazia buscar um futuro brilhante.

“Ele veio ao Ceará [após o acontecimento] e não quis mais voltar, para ele nada mais fazia sentido algum. Com isso, todos nós, em um trabalho de muitas mãos, tentamos convencê-lo a voltar, falamos que era o futuro dele, que ele iria salvar a família. Hoje, essa é a realidade”, disse José.

São sete irmãos, uma família carente, que residia em uma periferia em Cajazeiras, localizada no Estado da Paraíba, bem perto do Ceará, Estado onde nasceu. “Toda a família via seu potencial, não só o óbvio de talento, mas também como um provedor financeiro que poderia mudar a vida deles”, explicou.

Mas não foi tão fácil convencê-lo a retornar. “Ainda assim, toda a situação lhe deixou depressivo. Ele não conseguia jogar mais, passou cerca de um ano sem entrar em campo. A cabeça de um garoto sozinho pesa muito”, contou Neto Maia, que finalizou dizendo que, no fim das contas, o atual destaque do Porto teve personalidade para assumir as condições e voltou com foco renovado para se tornar um grande jogador.

O atacante ficou na base do Fluminense até 2019, onde passou pelas categorias sub-15, sub-17 e sub-20. Em 2018, passou pelo profissional, mas retornou para as categorias de base. Nesse retorno, se tornou um dos principais artilheiros da base do Brasil com 28 gols em 34 partidas em um ano. Em 2020, de volta ao profissional, estreou contra o Corinthians como titular e balançou as redes duas vezes.

Mesmo com a timidez citada e falas como “Ele não é o rei da resenha, não domina o vestiário”, José explica que isso não interfere em Evanilson ser ou não um bom jogador de grupo, pois sempre foi muito respeitoso com seus companheiros e criou ótimas amizades.

Destaque recente no Porto, chances de seleção e propostas da Premier League

“Evanilson em estado de graça. O atacante do FC Porto, de 24 anos, atravessa o seu melhor momento desde que assinou pelos dragões [...] Seu faro de gol voltou a ser letal para a meta adversária, ajudando a equipe a superar obstáculos complicados”, destacava o Jornal A BOLA, um dos principais da cobertura esportiva de Portugal, em publicação no fim de janeiro.

Após marcar dois gols na partida contra o Farense, pelo Campeonato Português, Evanilson também comentou a sua fase atual e destacou.

"Fico muito feliz por esta boa fase, que surge de muito trabalho, tanto individual como de toda a equipe. Quanto à seleção, vou continuar a trabalhar e esperar que a oportunidade apareça".

Outro que comentou acerca da possibilidade foi o também brasileiro Pepê, que jogou como meia na ocasião e contribuiu com duas assistências na partida.

“O Evanilson trabalha muito, é alguém que merece vestir a camisa da seleção brasileira”, disse o atleta, que esteve em convocações recentes.

O camisa 30 dos Dragões pode superar, nessa temporada, a sua melhor fase pela equipe portuguesa, quando marcou 21 gols em 2021/2022.

Até agora, são 19 tentos anotados e quatros assistências registradas em 28 partidas, sendo 18 delas como titular.

Vale lembrar que jogou inicialmente pelo Porto B, onde se destacou rapidamente, com seis gols em cinco partidas, e foi buscar espaço na equipe A.

Hoje, são 139 jogos com 54 gols marcados e 16 assistências anotadas no time principal.

Com contrato até junho de 2027, o Esportes O POVO confirmou que o brasileiro tem sondagens em andamento de clubes da Premier League.

A multa rescisória de Evanilson é fixada em 100 milhões de euros e, atualmente, é a mais alta do plantel portista.

Segundo Neto Maia, o staff do atleta projeta o jogador na próxima Copa do mundo.

“Com tantos craques, o futebol cearense nunca colocou ninguém numa Copa do Mundo, eu sempre brinco que será um dos meus jogadores, e sinto que pode ser ele”, completou.

Clubes do coração

O clube de três cores que Evanilson pintava nas paredes do Estação era o Fortaleza Esporte Clube, o primeiro time que o cativou e que ele vestiu a camisa por um curto período, na escolinha da equipe. Porém, depois de toda a história que viveu em terras cariocas, hoje, Evanilson é torcedor de um outro tricolor, o Fluminense.

O “Bebê” vai jogar?

Evanilson vem de uma família de conquistas e sonhos compartilhados. O futebol tem um lugar especial nessa divisão. Tanto seu pai quanto seus irmão também jogaram em times de comunidade, mas não chegaram a ser profissionais como ele.

Seu pai era um amigo, que estava em todos os jogos e entoava um grito conhecido pelos colegas de equipe e técnicos: “Cadê o Bebê, o Bebê vai jogar?”. Bebê era o apelido carinhoso adotado pela sua família para chamá-lo.

“Nunca faltava a um treino e ficava no campo durante horas”, contou Neto.

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