Chegada da variante delta no Ceará preocupa especialistas; orientação é redobrar os cuidados

A mutação indiana, mais contagiosa que a cepa original, foi identificada em quatro pessoas que chegaram de voos vindos do Rio de Janeiro para Fortaleza

20:04 | Jul. 30, 2021

A mutação indiana foi identificada em quatro passageiros de voos que vieram do Rio de Janeiro para Fortaleza (foto: reprodução)

Os primeiros casos da variante delta do coronavírus no Ceará foram confirmados nessa quinta-feira, 29, em comunicado feito pela Secretaria da Saúde (Sesa). A mutação indiana foi identificada em quatro passageiros de voos que vieram do Rio de Janeiro para Fortaleza. Mais contagiosa que a cepa original, a chegada da delta preocupa especialistas pela possibilidade de combinação com outras variantes.

Em entrevista divulgada pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), o pesquisador Dr. Fábio Miyajima, coordenador da Rede Genômica da Fiocruz Ceará, comentou acerca da chegada da variante no Estado. Segundo especialista, cerca de 17 exames que foram realizados no Centro de Testagem de Viajantes tiveram resultados positivos para Covid-19. Desses, quatro eram infecções pela mutação delta.

Dos infectados (um trio de mulheres e um homem) três apresentavam sintomas leves e moderados e um estava assintomático. Em anúncio dado pela pasta de saúde anteriormente, foi informado que os pacientes têm idade entre 22 e 26 anos e são moradores de Fortaleza (dois), Caucaia e Itapipoca. Eles vieram em três voos diferentes e os órgãos de saúde procuram por quem compartilhou aeronaves.

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Segundo Fábio, os cinco outros positivados estavam infectados pela variante gama (P.1), que surgiu pela primeira vez no Amazonas e já soma uma quantidade significativa de casos no País. Tanto a gama como a delta são consideradas pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como cepas de preocupação, isso porque são mais transmissíveis. O especialista fez um alerta para os riscos da entrada da delta no Ceará.

"Uma já está sendo um problema, que é a P1, imagina uma combinação delas. Existe também a chance delas se tornarem mais competentes, continuarem evoluindo. E existe também a chance de recombinação entre variantes. Então todos esses fenômenos não podem ser descartados", pontuou Miyajima.

Variantes diminuem eficácia de vacinas

O especialista também demostrou preocupação sobre o fato de que as cepas podem diminuir a eficácia das vacinas que existem. "As variantes de preocupação em geral são mais transmissíveis, são mais competentes, também tem a capacidade de enganarem o sistema imune e de causarem falhas nos sistemas vacinais", pontuou, destacando que não dá para saber se a P1 é a mais transmissível.

Dentre todos os imunizantes disponíveis até agora contra a patologia, nenhum oferece 100% de proteção contra a infecção por coronavírus, como mostrou estudos internacionais. Isso significa que, mesmo vacinado, o individuo pode se infectar novamente e apresentar até mesmo um quadro grave de saúde.

Em relação às variantes, as reinfecções podem afetar ainda mais o esquema vacinal, pois as mutações são mais resistentes. Um estudo publicado pela revista Nature apontou que a vacinação com as duas doses da vacina da Pfizer protege "fortemente" contra a delta. Contudo, pesquisas de Israel concluíram que a eficácia do imunizante contra a variante, em termos de prevenção completa, caiu para 64%.

Edson Teixeira, imunologista e professor do curso de medicina da Universidade Federal do Ceará (UFC), explica que as mutações ocorrem quando o vírus muda algumas de suas proteínas e acaba ficando mais resistente, se "fortalecendo". O docente pontua que o Brasil tem ainda uma circulação viral alta, o que facilita tanto a entrada de novas cepas como a criação delas, como foi o caso da variante gama. 

"Quando a gente conseguir controlar a circulação viral vai melhorar a situação, porque não vai ter mais vírus circulando", pontua o especialista. Teixeira reforça que não há vacina com eficácia de 100% e destaca que imunizantes da AstraZeneca e da Pfizer registram, segundo estudos, eficácia acima de 90% em casos graves da delta. Já a vacina da farmacêutica Janssen preocupa por ser dose única.

"O único estudo que nós temos demostra que ela não tem uma eficácia importante contra a variante delta", pontua ainda o imunologista. No entanto, ele esclarece que as pesquisas não são conclusivas e que novos estudos estão sendo realizados para verificar a possibilidade da vacina ter duas doses. 

Medidas sanitárias precisam ser redobradas

A chegada da delta ocorre no momento em que o Ceará avança na retomada econômica, liberando eventos com até 200 pessoas em espaços abertos e se preparando para o retorno presencial das aulas. No entanto, se por um lado o avanço representa uma melhora do quadro sanitário da Unidade Federativa, com a entrada da delta se transformou em preocupação para especialistas.

"É preciso redobrar o cuidado, como distanciamento social, uso de máscara e acelerar a vacinação, que é o mais importante, especialmente no momento de reabertura dos eventos porque quanto mais pessoas você tem contato mais você tem chances de transmissão", destacou o imunologista Edson.

O mesmo pensamento é mantido pelo Dr. Fábio Miyajima: "As medidas não podem ser abrandadas de tal maneira que a gente vá permitir a transmissão de forma ampla na sociedade. Então essas medidas são importantíssimas. Nós não podemos relaxar do Covid, é um inimigo biológico bastante astuto. Nossas medidas também têm que ser bastante expressivas e perspicazes".

Fábio pontuou que "só o tempo vai mostrar" se a delta é mais transmissível do que a P.1 e como a cepa irá se comportar dentro da Unidade Federativa. O especialista também destacou o trabalho que tem sido realizado no Estado para fortalecer a vigilância imunológica, destacando que as ações estão muito mais proativas e o monitoramento mais ativo, diferente do que aconteceu na entrada da variante gama.

Por exemplo, para tentar evitar um espalhamento da cepa, a rede de vigilância genômica realiza um rastreio nos casos importados. A ideia é evitar a transmissão comunitária, que é o estágio onde o vírus se espalha dentro dos municípios e pelos bairros. O Estado conta atualmente com um Centro de Testagem de Viajantes e barreiras sanitárias em vias específicas, para monitorar a entrada de novas variantes.

Em sua página no Twitter, o governador Camilo Santana (PT) informou que falou sobre a variante delta com o Comitê de Saúde hoje, em reunião realizada semanalmente- mas não especificou assunto. O último decreto anunciado vale até o dia oito de agosto. Por tanto, se houver novas medidas elas devem ser informadas em data próxima ao dia da expiração do documento.