Aos 74 anos, Stellan Skarsgård comenta 1ª indicação ao Globo de Ouro
Em entrevista ao O POVO, ator sueco fala sobre como Hollywood passou a aceitar outros sotaques e idiomas ao longo dos anos
Aos 74 anos, Stellan Skarsgård já fez mais de 150 filmes e séries, incluindo vários sucessos de Hollywood como “Mamma Mia!”, “Piratas do Caribe”, “Gênio Indomável” e até “Vingadores”. Em 2026, será a primeira vez que o ator sueco estará nas principais apostas para uma indicação ao Oscar de atuação, dessa vez sem ser em inglês.
“Valor Sentimental” recebeu oito indicações ao Globo de Ouro, incluindo Melhor Filme em Língua Não-Inglesa ao lado do brasileiro “O Agente Secreto”. Na trama escrita por Joachim Trier e Eskil Vogt, Gustav Borg (Stellan) é um cineasta renomado da Noruega que tenta se reaproximar da própria filha enquanto mergulha no processo criativo do seu novo roteiro.
"Eu decidi que ele não faz nada por maldade", conta Stellan Skarsgård em entrevista ao O POVO, quando perguntado sobre onde ele encontrou a humanidade desse homem que causa tanta angústia na filha. "Ele machuca as pessoas porque é descuidado, porque está excessivamente preocupado com a própria arte, ou com o que quer que seja. Ele fere os outros porque não entende”. Leia a entrevista completa:
O POVO - Você tem uma longa trajetória em Hollywood, e essa é a primeira vez que você é indicado ao Globo de Ouro em categoria de filme, atuando em uma língua estrangeira. Como você percebe que Hollywood mudou em relação aos filmes de outros países e com outras línguas?
Stellan Skarsgård - Ah, sim, enormemente. Quando comecei em Hollywood, nos anos 1980, tudo ainda era totalmente dominado pelo mercado americano e pelos filmes americanos. Naquela época, a globalização ainda não tinha começado de fato, então Hollywood era, até certo ponto, um fenômeno local, mesmo que já ganhasse muito dinheiro com exportação, a maior parte da receita ainda vinha do próprio mercado interno. Depois de algumas décadas, passou-se a ganhar mais dinheiro internacionalmente do que dentro dos Estados Unidos, e isso também mudou a forma como os atores de língua estrangeira eram vistos. Nos anos 1980, se você tinha sotaque, basicamente só podia fazer vilão, de preferência russo, nazista ou algo do tipo. Hoje isso não é mais assim. Agora, você pode interpretar personagens bons ou, como no caso do Borg em "Valor Sentimental", personagens complicados.
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O POVO - Falando sobre esse personagem complicado... Há nele uma sensação de rigidez, mas também de fragilidade contida, e o filme foge de grandes explosões emocionais. Como você encontrou a humanidade desse homem?
Stellan Skarsgård - Eu decidi que ele não faz nada por maldade. Ele machuca as pessoas porque é descuidado, porque está excessivamente preocupado com a própria arte, ou com o que quer que seja. Ele fere os outros porque não entende. Isso o torna patético de certa forma. Durante a maior parte do filme, ele tenta se aproximar da Nora, mas nunca consegue. Ele faz isso com piadas desajeitadas, sempre errando o alvo por pouco, ficando a um metro do objetivo que ele mesmo estabeleceu. Isso é, em parte, engraçado, em parte trágico, mas também muito compreensível e muito comum entre os homens, ou entre as pessoas, de forma mais ampla, inclusive mulheres.
O POVO - Você pode falar mais sobre o seu trabalho com Renate? A tensão entre vocês dois é muito real e comovente.
Stellan Skarsgård - Ela é fantástica porque, qualquer coisa que decida interpretar, isso aparece nela. Você vê as emoções, vê os pensamentos sob a pele dela. É algo extraordinário. Você tem diante de si uma verdadeira “máquina da verdade”, e isso te obriga a ser verdadeiro também. Não há como enganar emocionalmente quando se está na presença dela.
O POVO - O que Joachim lhe disse sobre escolher você para o papel?
Stellan Skarsgård - Ele não me contou muita coisa no início, pelo menos não diretamente. Eu já tinha ouvido falar, mas escutei mais detalhes ao longo da turnê de imprensa. Ele disse que me observava há anos, que queria trabalhar comigo e que achava que eu era um bom ator. Com o tempo, ficou mais claro para mim que ele tentou equilibrar o lado negativo do personagem com a minha humanidade, e acho que isso foi uma decisão muito sábia.