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"Os quadrinhos eram os meus melhores amigos", diz Vitor Cafaggi, autor de Turma da Mônica - Laços

Vitor Cafaggi participou de evento em Fortaleza neste domingo e conversou com O POVO
20:20 | Jul. 21, 2019
Autor Isabel Costa
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Tipo Notícia

Um dos quadrinistas brasileiros mais relevantes para o mercado editorial, Vitor Cafaggi, esteve em Fortaleza para participar de evento no Riomar Kennedy na tarde deste domingo, 21 de julho. Ele assina, ao lado da irmã, a também quadrinista Lu Cafaggi, a revista em quadrinhos "Turma da Mônica - Laços", que foi adaptada para o cinema em formato live action. Foi a primeira vez em que os icônicos personagens de Maurício de Sousa ganharam uma versão com atores reais. 

A HQ criada por Vitor e Luz fez tanto sucesso à época do lançamento que, pouco depois, foram encomendadas as continuações - chamadas de "Turma da Mônica - Lições" e "Turma da Mônica - Lembranças". Pouco antes de subir ao palco para falar com os fãs cearenses, Vitor conversou com O POVO nos bastidores sobre o início da carreira, mercado de quadrinhos, processos criativos, as expectativas ao entrar no universo criado por Maurício de Sousa, a jornada de criação e acompanhamento do filme.  

O POVO - Quais conselhos você daria para os jovens quadrinistas?

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Vitor Cafaggi - Quem tão começando agora? Não se preocupar tanto com indicações para prêmios. É um bom conselho. A gente tem que fazer quadrinhos. Quem faz quadrinhos faz porque gosta muito. É uma coisa difícil. Você fica em casa o tempo todo e sozinho trabalhando. Você vai trabalhar fim de semana e feriado. E você vai fazer isso por amor mesmo. Por dinheiro não é. Se fosse por dinheiro, você estaria fazendo outras coisas que dão muito mais dinheiro. E nem por prêmios também. Eu comecei a fazer quadrinhos por que sempre fui apaixonado por quadrinhos desde pequeno. Os quadrinhos eram os meus melhores amigos quando eu era um menino tímido que não tinha amigos reais. Os personagens eram meus amigos. Eu ganhava coragem para superar os desafios por causa deles. Eu conheci meu melhor amigo por causa de quadrinhos, eu conheci minha esposa por causa de quadrinhos. Os quadrinhos me deram muita coisa. Quando eu resolvi fazer quadrinhos, de certa forma, eu estava querendo retribuir um pouco o que os quadrinhos me deram. Eu faço por amor. E quero contar histórias que sejam tão importantes para as pessoas quanto as histórias que eu li da minha infância foram para mim. É por isso que eu faço quadrinhos. E acho que quanto mais inocente você for nisso, quando está começando, quanto mais fiel for a você mesmo, aos seus princípios, aos seus instintos e aos seus valores, quanto menos você procurar o sucesso e quanto menos você procurar fazer coisas que vão agradar os outros, melhor! Quanto mais sincero você puder ser com você mesmo, melhor! Se encaixar e se encontrar nos quadrinhos, e se comunicar com as pessoas através deles.

O POVO - Até hoje você consegue se divertir fazendo quadrinhos?

Vitor Cafaggi - Essa é uma ótima pergunta. Era muito mais fácil e muito mais divertido no início, quando eu publicava quadrinhos só no Orkut. Era mais simples, mais tranquilo. Hoje eu tenho que lidar com a pressão de ter um público muito maior e das pessoas terem expectativa em relação ao meu trabalho. Há uns tempos, em 2015, isso me pegou muito forte. Essa questão da expectativa das pessoas em relação ao meu trabalho. E toda essa pressão que eu meu coloquei. Depois que passou esse momento, quando eu terminei essa revista, eu queria até parar de fazer quadrinhos, depois que passou por isso melhorou novamente. Quando eu fui fazer Lembranças, que foi a terceira revista da Turma da Mônica, eu voltei a me divertir e a gostar de fazer. Eu vi que essa pressão que eu estava colocando em mim não fazia sentido. Hoje digo que consigo me divertir fazendo. Tem essa pressão por causa de prazo - principalmente quando o prazo está acabando. Aquele último mês de trabalho, no qual é preciso trabalhar igual a um louco. Eu estou fazendo um projeto agora encomendado de quadrinhos que nessas últimas semanas foram loucura. Acordar cinco horas da madrugada todos os dias. Tem essa pressão. Não tem jeito. Mas é normal e você aprende a lidar. No processo e no projeto inteiro, eu acho que é importante você se divertir na maior parte do tempo. E hoje eu, graças a Deus, consigo fazer isso novamente sim.

O POVO - Como foi o processo de entrar na criação do Maurício de Sousa? Foi um desafio?

Vitor Cafaggi - Não foi (risos), foi tão tranquilo. O primeiro trabalho que eu faço com o Maurício é com uma coletânea que estavam fazendo homenagem aos 50 anos de carreira do Maurício. Eu tive 15 dias para fazer essa história. E eu criei uma historinha de quatro páginas do Chico Bento. Como eu tinha pouco tempo, não tive como ficar sofrendo muito. E era eu no meio de outras 49 pessoas. Quando somos chamados em 2011 para fazer uma história longa da Turma da Mônica - que acabou virando Laços - o Sid (Sidney Gusmão, editor) ligou para a gente umas sete horas da noite mais ou menos. Ele ligo e fez o convite. A Lu e eu jantamos. E na mesma hora começamos a trabalhar. Tínhamos dois anos para fazer a história. Mas a empolgação foi tanta que na mesma hora começamos a trabalhar. E naquela mesma noite a gente já sabia o que ia ser a história, sabia os temas que a gente queria ir trabalhar, sabia como a gente queria atingir o público com ela, já sabia tudo sobre. A gente recebeu esse contato com tanta naturalidade, com tanta tranquilidade - que 90% do processo de fazer Laços foi divertido e gostoso. A gente não teve que fazer pesquisa de nada. A gente leu Turma da Mônica durante toda a vida. A Lu é dez anos mais nova que eu. Eu li muito nos anos 1980 e ela veio logo depois. Ela comprava, queria ter os dela. Quando ela tinha dois anos, eu tinha doze. Ela queria ler as revistinhas, mas não sabia ler ainda e eu lia com ela. Turma da Mônica foi muito presente na nossa infância. E na minha um pouco mais por conta da Lu. A gente não fez pesquisa nenhuma. A gente lembrava das histórias, de referências, de coisas que queríamos ter visto nas histórias e nunca vimos. Só o fim da criação foi mais tenso, por conta do prazo. Mas a gente não sentiu pressão nenhuma. Foi encontrar os amigos de infância novamente e voltar a brincar com eles. Depois, fizeram essa pergunta muitas vezes. “Vocês sentiram essa pressão”. E parte disso foi sentido na hora de fazer a continuação. Nessa hora sim, o bicho pegou. Mas para laços foi muito tranquilo.

O POVO - Vocês brigam quando estão desenvolvendo um projeto?

Vitor Cafaggi - A gente nunca nem discutiu. A gente nunca questionou. As três revistas de Turma da Mônica são os único projeto que fizemos juntos mesmo, Lu e eu. A gente sempre confia muito um no outro. Tudo que eu faço quero mostrar para ela antes e perguntar o que ela está achando. Eu confio no bom gosto dela. A Lu tem muito bom gosto e é mais artística do que eu. Sou um cara mais comum. A Lu gosta de coisas artísticas. Eu gosto de coisas meio idiotas, às vezes. Então, a gente sempre se respeitou muito. Foi muito tranquilo trabalhar junto. No Laços, a Lu dava os retoques nos meus desenhos. Eu mostrava algumas coisas e ela achava que estava ruim. Eu ia consertar na hora. Nem questionava. O que um falava, o outro respeitava. E a gente não teve nada. Sempre fomos muito razoáveis. Não temos questão de ego e de disputa. Até porque nunca teve. A Lu é dez anos mais nova do que eu. Nunca fez sentido eu brigar com ela ou a gente discutir e ter disputa. A Lu é uma menina que nasceu dez anos depois. Quando eu tinha quatorze, ela tinha quatro. A gente sempre se respeitou e confiou um no outro. Quando fomos fazer lições, eu tive a primeira ideia. Estávamos os dois pensando na história. Eu apresentei e ela vetou na hora. Foi no almoço. Eu só aceitei. E acabou que a mesma ideia continuou na minha cabeça, eu reformulei um pouquinho e a Lu acabou não tendo outras ideias. Quando fui apresentar a ideia para ela com ajustes, ela disse que aconteceria, pois eu mudei coisas que incomodavam. A gente se respeita e baseia tudo na conversa.

O POVO - E sobre essa pequena crítica de que o filme induz a fuga das crianças?

Vitor Cafaggi - Eu não sabia até você falar. A gente trabalha na continuação, em Lições. A gente queria que o clima de Laços fosse dos climas anos 1990 com crianças vivendo aventuras. Esse pretexto deles fugirem era para a gente mostrar nossa visão dos quatro personagens entre apenas eles. E para isso a gente queria só os quatro juntos. Não queríamos outros personagens da Turma, não queríamos os pais e não queríamos mais ninguém em Laços. A gente cria essa jornada do herói que eles vão seguir para encontrar o Floquinho. E eu lembro que tive um certo medo sobre isso quando fiz Laços. De acharem que estava tendo uma indução a fugir e tudo mais. Quando a gente faz Lições, que o título é Lições por conta disso, a gente parte exatamente de onde Laços termina. Esses meninos fizeram uma coisa errada, desobedeceram os pais. Eles não fogem de casa na verdade. Eles nunca pensam em não voltar. Mas fazem uma coisa errada. Desobedecem os pais e vão passar a noite na floresta. Mas eles são bem-sucedidos. Quando eles voltam, estão se achando o máximo e que podem fazer tudo. Como a gente vai lidar com eles a partir daí? Lições parte desse começo. Eles estão achando que podem tudo. E eles vão tentar fugir da escola por um motivo bobo, baseado na minha vida inclusive. Fiz isso de fugir da escola por motivo bobo. Eles fogem da escola e a partir daí há consequências. As coisas partem daí. Tanto eles quanto os pais vão ter uma série de lições para se encontrarem. Não vejo muito sentido em falar que eles fugiram de casa e incentivar as crianças a fugir de casa. Em hora nenhuma a intenção é “vamos fugir”. É “vamos buscar nosso cachorro e trazer para casa”.

O POVO - E qual foi a expectativa ao pensar na história transposta para o audiovisual?

Vitor Cafaggi - Uma das primeiras coisas que a gente pensa fazendo Laços, por que ela não teria continuação, ela seria uma história fechada, a gente pensa como seria um filme da Turma da Mônica e como fazer esse filme em quadrinhos. A gente não tinha essa ideia que o quadrinho ia virar um filme depois. Quando fico sabendo, foi pouco antes do Carnaval e só foi divulgado em dezembro. Nós guardamos segredo por muito tempo. A gente teve uma empolgação inicial. Mas ao mesmo tempo a gente segurou muito a onda. Contamos para nossos pais, minha esposa e minha sogra. Eles ficaram mais ansiosos do que a gente. Lu e eu tínhamos uma noção. Talvez nem fosse acontecer. Quantos projetos são anunciados e não saem do papel. Seguramos a onda. As coisas demoraram a realmente acontecer. E eu tinha um receio sim. Cinema nacional a gente sabe que tem coisas boas, mas tem coisa feitas a toque de caixa. Não sabíamos quem seriam as pessoas envolvidas com a produção, quem seria o diretor, quem seriam as crianças. Não sabíamos a visão que teriam da nossa história, pois vai muito da interpretação.

O POVO - E como se desenrolou esse processo?

Vitor Cafaggi - Uma das primeiras coisas que a gente pensou é que a maior missão era escolher o quarteto que faria o filme. Laços é tão em cima dos quatro, é tão mostrando os quatro, se fossem escolhidas as crianças certas, seria 80% do filme. A gente tinha medo do que ia virar isso. Quando entra o Daniel Rezende (diretor), a gente fica mais tranquilo. Ele entra por ter corrido atrás disso. Quando ficou sabendo que teria o filme, ele procurou a MSP (Maurício de Sousa Produções) e a produtora para saber se tinha diretor. Não era um cara que queria fazer por grana. Ele estava ali por amor. Ele já conhecia Laços e adorava a história de Laços. A gente ficou bem mais tranquilo quando o Daniel entra. No dia que o Sidney mostrou a foto das quatro crianças pra gente, ficamos apaixonados pelos quatro. Quando a gente viu o vídeo deles tendo a notícia, apaixonamos mais ainda. E começamos a seguir no instagram e achamos eles incríveis. Fomos nas filmagens e conhecemos todo mundo pessoalmente. Nos sentimos muito valorizados pelo Daniel e pela produtora. As crianças estavam super felizes da gente estar lá também. A gente já relaxou. E vendo o primeiro teaser fiquei mais feliz ainda. Quando vi o trailer, mais feliz ainda. Quando fui ver o filme tinha certeza de que ia gostar do filme. Não tinha jeito, sabíamos o carinho e da competência de todo mundo. Fomos ver o filme com muita tranquilidade.

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