Saiba o que é o "fungo preto", que já foi identificado em dois estados do Nordeste

Doença causada por fungos é chamada de mucormicose e causa necrose nos tecidos, podendo levar a mutilações e até à morte. Pessoas com imunidade baixa e diabéticas estão mais suscetíveis à infecção

Uma infecção fúngica que ficou conhecida como “fungo negro” tem causado preocupação após surto  associado a casos de Covid-19 na Índia. A doença chamada mucormicose é causada por um grupo de fungos comuns na natureza, encontrados na terra ou em alimentos em decomposição. Sem tratamento, a doença pode levar a operações mutiladoras ou até à morte. Infectologistas explicam, porém, que a infecção é associada à baixa imunidade e mais frequente em diabéticos e não há motivo de alarde para a população em geral.

O apelido de “fungo negro” acabou sendo disseminado não pela cor do fungo, mas devido à necrose dos tecidos faciais que leva à descoloração causada pela infecção. É provável que a maioria das pessoas já tenha tido contato com esses fungos ao inalar esporos fúngicos que estão no ar. 

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No entanto, os fungos que causam mucormicose, pertencentes à ordem Mucorales, normalmente não provocam infecção em pessoas saudáveis, segundo a infectologista Lisandra Damasceno, docente do Departamento de Saúde Comunitária da Universidade Federal do Ceará (UFC).

“Indivíduos que têm doenças que levam à diminuição da imunidade, ou fazem uso de medicamentos que diminuem a imunidade são os mais propensos a desenvolverem a infecção”, completa. Sem a defesa adequada ao organismo, o fungo invade os tecidos após ser inalado, alcançando a mandíbula, os olhos, e o cérebro, chegando aos vasos sanguíneos e levando à necrose.

Na Índia até o começo de junho eram mais de nove mil casos da mucormicose, que têm sido associados ao novo coronavírus. O país asiático vive segunda onda pandêmica e passa de 29,1 milhões de casos e 354 mil mortes causadas pela Covid-19.

No Brasil, foram identificadas duas pessoas em Pernambuco e no Rio Grande do Norte. No primeiro caso, a paciente é diabética e fez uso de antibiótico e corticoides. Em 2021, já foram notificados 29 casos da mucormicose no País, dos quais pelo menos quatro são investigados pela associação com a Covid-19.

O uso de corticoides é comum para pacientes internados com Covid-19. Contudo, altas doses ou administração inadequada desse tipo de medicamento pode elevar as taxas de açúcar no sangue, dificultando o controle da diabetes.

O infectologista Flávio Telles, coordenador de micologia da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI) e professor na Universidade Federal do Paraná (UFPR), aponta que o recente surto de mucormicose na Índia pode ser explicado pela alta incidência de diabetes aliada ao agravamento da pandemia.

O país asiático tem 77 milhões de diabéticos, segundo maior índice do mundo, de acordo com dados da 9ª edição Atlas da Federação Internacional de Diabetes (IDF, na sigla em inglês), lançada em 2019. A Índia fica atrás somente da China, que possui 116,4 milhões de diabéticos. 

"A mucormicose é conhecida desde o século 19, mas não é tão frequente no Brasil. É preciso conhecer a doença porque tem alta taxa de mortalidade em pacientes com Covid-19 e mucormicose, chegando a 60%. Mas não é motivo de alarde para a população em geral", garante Flávio.

Confira os sintomas, tratamento, riscos relacionados à mucormicose segundo especialistas ouvidos pelo O POVO.

Como o fungo age no organismo das pessoas atingidas?

Ao serem inalados, os fungos ficam depositados no nariz e seios paranasais, e começam a invadir os tecidos que estão próximos, como a mandíbula, os olhos, e o cérebro, chegando também aos vasos sanguíneos e levando à morte dos tecidos. Nesse sentido, as complicações relacionadas à doença incluem isquemia, trombose, infarto e necrose dos órgãos acometidos.

O quadro pode evoluir para extrema gravidade se não for rapidamente diagnosticado e tratado. A necrose dos tecidos pode levar a uma infecção disseminada ou sequelas permanentes devido a necessidade de remoção dos tecidos mortos, o que pode levar a perda ocular, perda de tecido ósseo ou massa cerebral.

Quais são os sintomas da mucormicose?

Os sintomas iniciais são obstrução nasal, secreção nasal sanguinolenta e fétida e dor de cabeça. Dor ocular, vermelhidão da face e paralisia do olho quando já tem acometimento ocular. O fungo pode ainda causar pneumonia ou infecção generalizada.

Como é o tratamento da mucormicose?

O tratamento é cirúrgico associado ao uso de antifúngico endovenoso. A cirurgia é fundamental para a remoção dos tecidos mortos e controle da infecção, e o tratamento ocorre com o antifúngico anfotericina B, cujo uso é prolongado e de alto custo para o sistema de saúde.

Por que existem casos de mutilação em pessoas que apresentam a mucormicose?

Ao invadirem os vasos sanguíneos causando morte dos tecidos, os fungos são extremamente agressivos, sendo necessária a remoção imediata dos tecidos necrosados para o controle da infecção. Portanto, o indivíduo pode ter perda do olho, de tecido ósseo e cutâneo, e até mesmo perda de tecido cerebral.

Que condições favoreceram esse surto de casos de mucormicose na Índia?

A alta frequência de diabetes na população indiana, e o uso de corticoides em doses elevadas, ou até inapropriadas, para o tratamento da Covid-19. Um dos efeitos colaterais desse uso inadequado de corticoides é a elevação das taxas de açúcar no sangue, o que pode dificultar o controle da diabetes.

Por que pessoas com diabetes ou Covid-19 são mais suscetíveis ao fungo preto?

Tanto a diabetes descontrolada quanto a Covid-19 levam a um estado de imunossupressão (queda da imunidade), que associado ao uso inadequado de corticoides pode favorecer a proliferação e invasão do fungo nos tecidos. Assim, pessoas com diabetes descontrolada e um quadro grave de Covid-19 são mais propensas a evoluírem com este tipo de infecção.

Existe risco de um surto no mucormicose no Brasil como ocorreu com a Índia?

Não é provável. A doença é conhecida desde o século XIX, mas não é tão frequente no Brasil. É importante que pacientes diabéticos com Covid-19 sejam acompanhados com atenção especial, mas não há motivo para alarde na população em geral.

com informações da Agência DW e da Agência Brasil

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