Polícia descarta envolvimento de vereador em homicídio, mas aponta indícios de compra de votos
Análise dos celulares de Ivanilson do Batoque, vereador de Alto Santo, cita áudios sobre distribuição de bens e dinheiro em troca de votos
Um relatório de análise complementar de dados telemáticos da Polícia Civil do Ceará, concluído neste mês, afastou a participação do vereador eleito de Alto Santo, Francisco Bezerra Barreto, conhecido popularmente como Ivanilson do Batoque (PL), em um inquérito policial que investiga um crime de homicídio.
No entanto, a análise do conteúdo extraído dos aparelhos celulares do parlamentar, realizada pela Delegacia Municipal de Alto Santo, apontou "fortes indícios da prática de crimes eleitorais", especificamente o crime de compra de votos.
O vereador Francisco Bezerra Barreto estava sendo investigado no Inquérito Policial 408–84/2024, instaurado para apurar o homicídio que vitimou José Eudismar Moreira Pinto, ocorrido no dia da eleição municipal do ano passado (06/10/2024).
Ausência de vínculo com homicídio
O relatório da Delegacia Geral de Polícia Civil, que analisou o conteúdo de dois celulares do vereador, esclareceu que "não foi possível colher indícios que revelem a participação do investigado no referido crime de homicídio". Em relação a um dos aparelhos (Redmi), a polícia não vislumbrou "nenhum elemento de informação que pudesse constituir o cometimento de algum crime".
Em um celular da marca Samsung, apesar do grande volume de dados extraídos - incluindo 4.891 conversas, 11.976 áudios e 175.000 imagens -, a equipe de investigadores não encontrou áudios relacionados ao caso de homicídio.
Suspeita de compra de votos
Apesar da ausência de ligação com o assassinato, a análise dos dados do celular Samsung M12 revelou uma série de arquivos em áudio que evidenciam o possível crime de "compra de voto", tipificado no artigo 299 do Código Penal.
As transcrições dos áudios mostram o vereador, identificado como "Francisco" em alguns bate-papos, engajado em negociações para adquirir apoio eleitoral em troca de dinheiro, bens ou vantagens.
Entre os principais indícios de crimes eleitorais revelados pelas transcrições:
- Negociação de bens por votos: em um áudio datado de 24/09/2024, Ivanilson do Batoque instrui um contato a dar "cinco sacos de cimento" a um eleitor e sua mulher, dizendo que o voto deles "é só isso aí". Ele também menciona um amigo do eleitor que receberia "um pneu de mota e são cem reais";
- Controle de pagamentos: o vereador demonstra preocupação com a eficácia dos pagamentos, mencionando um caso anterior frustrante: "Se sair igual na Pesqueira, que eu dei quatro mil reais ao cara, apareceu nove voto";
- Estratégia de pagamento tardia: em 06/09/2024, ele expressa cautela ao dar dinheiro antecipadamente: "se der dinheiro antes da eleição, é mesmo que jogar no mato, eles não votam não, macho. O dinheiro pra dá a esse pessoal aí, tem que ser um dia antes". Ele também sugere que o foco deve ser a "compra de voto";
- Esforços de captação e gastos elevados: em um áudio, ele detalha o alto investimento: "Eu já gastei trinta mil reais, só dentro do Tibolo e o Jardim. Tudo segurando, voto e tudo...". Ele também planejava gastar quantias substanciais nos dias que antecediam o pleito: "do dia vinte e cinco, dez mil, no dia trinta, dez mil, e no dia, dez mil no dia da eleição";
- Recebimento de bens de opositores: em 03/09/2024, o vereador relata ter instruído um eleitor a receber "dois milheiros de tijolo" de um candidato adversário, mas a votar nele (Ivanilson), confiando na sua palavra;
- Cautela contra fiscalização: em uma conversa de WhatsApp com o contato "Hermoge Cimento", o vereador pede para cancelar uma entrega de cimento porque "os homi tão apertando aí" (possível referência à polícia ou fiscalização), sugerindo que a entrega fosse feita "depois da eleição" para evitar o risco de o carro ser pego com o material. Ele também se recusa a fazer transferências via pix por ser candidato, alegando que uma transação poderia "me lasca[r]".
Encaminhamento ao MP
Diante dos fortes indícios de crimes eleitorais, a Polícia Civil, por meio do delegado Wagner Luiz de Lima, encaminhou o relatório de extração ao promotor de Justiça da comarca de Alto Santo-CE, para conhecimento e para a adoção das "medidas que a Vossa Excelência entender cabíveis".
O POVO procurou o vereador por meio de mensagem enviada em perfil de uma rede social para solicitar um posicionamento do parlamentar sobre o caso. A reportagem também tentou ligar para a Câmara Municipal de Alto Santo, por meio de número disponibilizado no site da instituição.
Apesar das tentativas de contato, não houve retorno até a publicação deste material. O espaço continua aberto para manifestação e será atualizado caso haja devolutiva.
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