PGR descarta racismo em fala de Zambelli sobre Benedita, diz jornalista
O episódio aconteceu na última segunda-feira (1º), em meio a uma live transmitida pela própria Zambell
Membros da cúpula da Procuradoria-Geral da República (PGR) descartam que a deputada federal bolsonarista Carla Zambelli (PL-SP) tenha cometido crime de racismo ao referir-se à colega de Parlamento, Benedita da Silva (PT-RJ), como “Chica da Silva”. A informação foi divulgada pela coluna da jornalista Malu Gaspar, do O Globo.
Na avaliação de interlocutores da PGR, para avançar com o processo seria necessário comprovar que Zambelli teve intenção de insultar a colega. O caso ocorreu no começo deste mês, durante a primeira reunião de mulheres parlamentares do G-20, em Maceió. Zambelli reclamou que não poderia falar durante o evento, quando referiu-se a Benedita trocando o nome da deputada.
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“Não vou ter poder de fala. Eu não vou falar porque provavelmente… não sei por que que eu não vou falar. Parece que já foi montada pela Secretaria da Mulher, que é a Chica da Silva que vai falar”, disse em transmissão nas redes sociais. No mesmo dia, em um segundo momento, ela chamou Benedita de “Chica” durante entrevista à TV Câmara.
Posteriormente, a parlamentar bolsonarista emitiu nota pedindo desculpas e alegando ter se confundido. O comunicado argumenta que Zambelli “lamenta o referido lapso, mas torna público que não houve qualquer intenção de ofensa à sua colega de Parlamento. Mais uma vez, Carla Zambelli pede desculpas à deputada Benedita da Silva”.
O deputado Odair Cunha (PT-MG) fez representação contra Zambelli na semana passada e Benedita se manifestou repudiando a fala. A PGR ainda terá que se manifestar oficialmente sobre o caso.
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Entenda
Políticos e lideranças do movimento negro chamaram a atenção para o fato de a "confusão" de nomes remeter a uma personagem negra importante da história brasileira. Francisca da Silva de Oliveira, conhecida como Chica da Silva, foi uma mulher negra escravizada e posteriormente alforriada que viveu no Brasil no século 18. Filha de um homem branco e uma africana escravizada, ela conquistou liberdade e se tornou uma das mulheres mais ricas do país e símbolo da resistência negra.
Historiadores sugerem que o aparecimento da personagem em produções de cinema e TV ao longo das últimas décadas ajudaram a popularizá-la, mas também acabaram contribuindo para criar uma imagem negativa e estereotipada de Chica da Silva.
Coordenadora da organização não-governamental Criola, Lúcia Xavier destaca ser uma prática recorrente relegar todas as mulher negras ao lugar de escravizada e sexualizada. "Chica da Silva e Benedita da Silva são figuras ilustres, que fizeram esse Brasil melhor, cada uma em seu tempo. Mas é muito possível que estejamos diante de uma situação em que alguém se vale de uma história mal contada sobre Chica da Silva para atribuir à deputada Benedita da Silva determinadas origens e estereótipos", avalia Lúcia Xavier, uma das principais referência do movimento de mulheres negras.
Em seu quinto mandato como deputada federal, Benedita da Silva foi a primeira mulher negra a ocupar os cargos de vereadora do Rio de Janeiro, deputada na Assembleia Constituinte de 1988, senadora e governadora do Rio de Janeiro. Foi também ministra da Secretaria Especial de Trabalho e Assistência Social. Atualmente, coordena a bancada feminina na Câmara.
Reações
A Secretaria da Mulher da Câmara dos Deputados publicou nota de repúdio ao que se refere como “fala racista e preconceituosa” por parte de Carla Zambelli. “A comparação com a personagem [Chica da Silva] pode ser usada de forma pejorativa, para desqualificar sua identidade racial e, especialmente, sua história política de luta pelos direitos das mulheres”.
“Ao chamar Benedita de Chica da Silva, a referida parlamentar não tece uma fala elogiosa à nobre parlamentar Benedita, mas utiliza de ironia, deboche e escárnio para desqualificar a coordenadora da Bancada Feminina apenas por discordar de regras para participação parlamentar no evento”, completou a nota.
O episódio teve grande repercussão nas redes sociais. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva postou, em seu perfil no X, uma foto em que aparece de mãos dadas com Benedita e escreveu: “Minha amiga e companheira de muitas décadas. Exemplo de fé, muito trabalho e amor pelo povo brasileiro”.
A ministra da Mulheres, Cida Gonçalves, manifestou “solidariedade e apoio incondicional” à Benedita. “Sua trajetória ímpar na defesa dos direitos das mulheres, da igualdade racial e da justiça social precisa ser respeitada”, escreveu no X. “Reforço a necessidade de o Brasil dar um basta nessas violências que buscam atingir, a todo momento, mulheres negras em espaços de poder e decisão”.
A ministra da Saúde, Nísia Trindade, lembrou que esta quarta-feira marca o Dia Nacional de Combate à Discriminação Racial e citou uma frase da filósofa e escritora Angela Davis ao escrever: “Não basta não ser racista, é preciso ser antirracista. Meu abraço carinhoso à deputada Benedita da Silva e minha indignação diante desse caso lamentável”.
O ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Silvio Almeida, se referiu à Benedita como “uma das maiores referências da política nacional”. “Uma inspiração para homens e mulheres que lutam por um país democrático, desenvolvido e sem racismo”, postou.
Com informações da Agência Brasil.