Projeto de lei sobre "bolsa-estupro" é criticado por ativistas e grupos de defesa das mulheres 

Artigo que visava conceder o auxílio foi retirado de pauta, após acordo entre a relatora, senadora Simone Tebet (MDB), e o autor da proposta, o senador Eduardo Girão (Podemos)

Nesta terça-feira, 23, o termo “bolsa estupro” ganhou as redes sociais. Isso porque internautas manifestaram críticas com um projeto de lei em tramitação no Senado que prevê um auxílio financeiro para o filho de mulher vítima de estupro. 

O Projeto de Lei 5435/2020 foi criado pelo senador Eduardo Girão (Podemos-CE) – que intitulou o PL de “Estatuto da gestante”. Entregue em dezembro de 2020, o texto criava um auxílio para mulheres grávidas em decorrência de violência sexual — iniciativa que já foi discutida anteriormente e apelidada por seus críticos de "bolsa-estupro",  "pondo a salvo a vida da criança por nascer desde a concepção". 

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Contudo, o ponto será retirado do texto, após acordo entre a relatora, senadora Simone Tebet, e Girão.  Segundo a senadora, um novo texto ainda em elaboração visa criar um contexto de normais gerais de proteção às gestantes, para que depois se façam leis referentes ao atendimento humanizado, à amamentação e à atenção psicológica a mulheres que acabaram de dar à luz.

Segundo ela, o projeto não tratará de aborto. A expectativa é que o auxílio financeiro a gestante vítima de estupro fique de fora do substitutivo. Em nota, Girão defende que os demais artigos não fazem qualquer alteração no Código Penal, mas reforçam as políticas públicas de saúde em favor da gestante e "ampliam o nível da responsabilidade paterna".

"Mesmo assim, considero importante esclarecer que esse artigo aumentava a penalização do estuprador, e tratava-se de uma opção que poderia livremente ser aceita ou rejeitada por aquelas mulheres que, por questão de foro íntimo, desejassem prosseguir com a gravidez", afirma o parlamentar sobre trecho do PL retirado. 

A polêmica que criou o apelido “bolsa estupro” está relacionada ao penúltimo artigo do projeto, o qual foi retirado, que diz que:

“Na hipótese de a gestante vítima de estupro não dispor de meios econômicos suficientes para cuidar da vida, da saúde, do desenvolvimento e da educação da criança, o Estado arcará com os custos respectivos de um salário-mínimo até a idade de 18 anos da criança, ou até que se efetive o pagamento da pensão alimentícia por parte do genitor ou outro responsável financeiro especificado em Lei, ou venha a ser adotada a criança, se assim for a vontade da gestante, conforme regulamento”.

Nas redes sociais, grupos de defesa dos direitos da mulher e ativistas feministas criticam a iniciativa. Lola Aronovich, feminista e professora da Universidade Federal do Ceará (UFC) criticou o PL e divulgou a hashtag #GravidezForçadaÉTortura:

 

Segundo Lola, o projeto é uma estratégia para a proibição do aborto em todos os casos, inclusive onde hoje a prática é realizada, como em casos de estupro, fetos anencéfalos e quando a gestação apresente risco de vida para a mulher. "Isso não resolve nada. Essa mulher não vai ter acompanhamento psicológico ou jurídico e essa possibilidade do estuprador, que não vai ser nem definido assim, mas o genitor, para ele abre possibilidade terríveis, inclusive dele pedir guarda compartilhada e conseguir direitos de visita”, avalia.

Com base em pesquisa do Fórum Brasil de Segurança Pública, cujos dados revelam que 64% dos estupros no País são contra crianças menores de 14 anos ou vulneráveis, a professora defende que o PL é “uma chantagem” para mulheres, principalmente para essa faixa etária. “Muitas vezes o estuprador é o pai da menina. É terrível, é um tapa na cara de todas as mulheres e todas as meninas”, afirma a ativista.

Lola também afirma que o projeto abre precedente para a continuidade do vínculo entre vítima e estuprador. “O que garante que o genitor não vai estuprar a criança ou não vai usar esse vínculo para manter todo o tipo de contato com a vítima? Não tem como a sociedade aceitar”, conclui.

Nas redes sociais, Girão destaca ainda que a proposta original criaria uma ajuda financeira às vítimas de estupro em vulnerabilidade social que, por vontade própria e foto íntimo, decidissem seguir com a gravidez. Além disso, ele afirma que o acusado do crime arcaria com os valores sem ter a paternidade reconhecida. "Apesar da motivação que levou à inclusão dessa possibilidade no texto, em comum acordo com a relatora e para evitar despesas, o artigo foi retirado", diz.

Entidades e grupos de defesa dos direitos das mulheres temiam que o PL fosse votado ainda nesta semana. Apesar da articulação para uma apreciação imediata, a possibilidade foi descartada pela relatora designada, a senadora Simone Tebet (MDB-MS). A parlamentar trabalha em substitutivo para o texto original. Ela afiram que não há previsão de quando a proposta entrará na pauta do plenário do Senado.

O PL 5435/2020 vai na contramão do que acontece em países vizinhos — caso da Argentina, que legalizou o aborto no ano passado. Projeto de lei aprovado em dezembro de 2020 estabelece que as mulheres têm direito a interromper voluntariamente a gravidez até a 14ª semana de gestação. Texto recebeu 38 votos a favor e 29 contra; houve uma abstenção.

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