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Entenda a Hallyu, a "onda coreana" que tomou o mundo e gera renda no Ceará

O movimento sul-coreano engloba música, cinema, culinária, moda e língua. No Ceará, os mais jovens aquecem um mercado que só cresce, mesmo em tempos de pandemia
08:00 | Ago. 30, 2020
Autor Sâmya Mesquita
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Tipo Notícia

Essa semana, a banda coreana BTS bateu um recorde histórico: é a primeira banda desde os Beatles a ter três álbuns no topo da Billboard em menos de um ano. Num mercado musical dominado pela indústria americana, o feito não é aleatório: é resultado de uma série de ações de investimentos da Coreia do Sul para exportar sua cultura para o mundo.


Nos anos 90, o país vivia uma profunda crise econômica. Uma das saídas adotadas pelo governo sul-coreano foi investir em cultura para alavancar o turismo e aquecer a produção interna. A partir daí, diversos grupos de k-pop, como é nomeada a música popular coreana, fizeram sucesso na Ásia. As novelas coreanas, também conhecidas como dramas ou doramas, também se popularizaram. E até a culinária local passou a ser exportada. Somado ao crescimento tecnológico promovido por empresas nacionais como Samsung e Hyundai, a Coreia do Sul conseguiu se tornar uma potência econômica.

Em 2019, o “Departamento de K-pop” investiu o equivalente a R$ 6,4 bilhões na área. Se compararmos aos investimentos federais aqui no Brasil, a Secretaria Especial de Cultura orça, anualmente, R$ 2,25 bilhões, segundo o Portal da Transparência. Só o K-pop rende à Coreia do Sul mais de R$ 26,4 bilhões ao ano. Em pesquisa de mercado realizada pela Organização de Turismo da Coreia do Sul em 2019, 55,3% dos visitantes estrangeiros visitaram o país devido à Hallyu.

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O movimento Hallyu, traduzido como "onda coreana", explodiu com o sucesso mundial da música Gangnam Style em 2012, do rapper Psy. De lá para cá, diversos outros grupos coreanos chegaram ao ocidente, como o Blackpink, que lançou clipe na última sexta-feira com a cantora americana Selena Gomez, e o próprio BTS. A Netflix agora investe em produções originais de novelas coreanas. E mesmo o cinema conseguiu o seu espaço quando, esse ano, o filme Parasita ganhou um Oscar na categoria de melhor filme.

 

Grupo de K-pop BLACKPINK lançou nesta sexta-feira o single "Ice Cream", música em parceria com a cantora Selena Gomez
Grupo de K-pop BLACKPINK lançou nesta sexta-feira o single "Ice Cream", música em parceria com a cantora Selena Gomez (Foto: Divulgação)

 

O que torna a Hallyu diferente é a intensidade da abordagem mercadológica. A viralização rápida nas redes sociais é importante e se deve à organização minuciosa dos fãs em fóruns especiais, ou Fancafés. O marketing das agências produtoras é ostensivo no uso das redes sociais e na venda de produtos relacionados à marca. Eles vendem de uma capa de CD diferente para cada integrante até o celular com nome do grupo. Por fim, a ocidentalização exporta o produto de forma a deixá-lo agradável também ao mercado internacional.

Coreia do Sul no Brasil

O Embaixador da Coreia do Sul Kim Chan-woo afirma que a Hallyu pode ser considerada como uma nova identidade da Coreia e que pode ajudar a melhorar a imagem nacional e o valor de marca-país do país: “Essa disseminação é importante porque nos permite comunicar e interagir com diferentes partes do mundo e aumentar a compreensão e interesse na Coreia de uma forma geral”.

Kim Chan-woo ressalta que, a partir da amizade e dessa admiração entre Brasil e Coreia do Sul, podem surgir interesses de cooperações mútuas e trocas de conhecimento. Ele adianta que, recentemente, o Governo do Ceará sinalizou interesse em estreitar relações com os setores educacionais da Coreia para conhecer de perto as melhores práticas. Mas devido à pandemia causada pelo novo coronavírus, as conversas foram adiadas. O objetivo é que as relações bilaterais deverão ser cada vez mais aprofundadas: "Até porque a Hallyu diminui a distância psicológica entre os povos, fazendo com que Brasil e Coreia se tornem ‘vizinhos próximos’”, afirma.

 

Embaixador da da República da Coreia do Sul no Brasil
Embaixador da da República da Coreia do Sul no Brasil (Foto: Hélia Scheppa/SEI-PE)

O interesse pela Hallyu aumentou também o interesse turístico. A Coreia do Sul é um dos poucos países da Ásia que não exige visto para brasileiros com objetivos turísticos, com permanência de até 90 dias. No entanto, desde abril deste ano, o governo coreano suspendeu temporariamente essa isenção de visto para impedir o influxo do novo coronavírus. Mas também estão sendo emitidos vistos de longo prazo, como para estudantes de graduação e mestrado, para intercâmbio sob parceria entre universidades coreanas e brasileiras, para curso de língua coreana ou mesmo para trabalho.

Neste período de isolamento social, a Embaixada da República da Coreia no Brasil está concentrando todas as suas atividades online, o que inclui cursos, palestras e festivais. Através do Instagram, é possível acompanhar as novidades.

Hallyu no Ceará

 

A KPCE Store é virtual e vende souvenirs inspirados na cultura coreana
A KPCE Store é virtual e vende souvenirs inspirados na cultura coreana (Foto: Divulgação)

 

A onda coreana não chegou agora no Ceará. Muitos fãs já acompanhavam o k-pop antes mesmo do “efeito Gangnam Style”. Jany Caetano é administradora da página Kpop Ceará e conheceu a música coreana ainda em 2008. Ela já trabalhou em vários eventos voltados à cultura coreana e disse que, a princípio, a propaganda das músicas e dos doramas foi feita pessoalmente, principalmente entre os mais jovens. "Em algum momento, nos últimos quatro anos, isso tomou uma proporção tão grande que começou a chamar a atenção até de pessoas que não estavam buscando informação”, afirma a também dona de uma loja virtual KPCE Store. “Hoje, a Hallyu é algo tão grande que conta até com uma festa temática, que se chama Fica, Vai Ter K-Pop!”.

O empresário Anderson Sousa afirma que, com a explosão da Hallyu, o consumo de produtos que remetem à Coreia cresceu muito. Ele e sua sócia Michelle Rocha começaram a Mr. Fantasy vendendo blusas, cartões e canecas com estampas relacionadas à cultura geek, mas logo viram que a alta procura por K-pop poderia expandir seus horizontes de mercado. Passaram a participar de eventos para promover a marca. Hoje, a procura por produtos relacionados à Hallyu é tão grande que fez o empresário e sua sócia abrirem uma nova sede, no Shopping Parangaba, mesmo em tempos de crise econômica provocadas pela pandemia em Covid-19.

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Sobre a Hallyu, Anderson lembra que seu primeiro contato foi no Sana, ao assistir performances de grupos locais. Ele mesmo já participou de um. Mas foi em seu empreendimento que o empresário encontrou sua realização profissional. “Falo muito para os pais que reclamam dos filhos estarem ouvindo K-pop o dia todo: Pelo menos eles estão consumindo algo sadio. As letras são sobre amor próprio. Você pode deixar sua filha vendo dorama, que não vai achar nada impróprio ali”, afirma, lembrando que hoje consome muita música coreana.

A comida coreana é outro ponto forte. O restaurante Kpop & Food tem esse nome justamente para chamar a atenção dos jovens. Eles indicam o Bibimbap, um arroz mesclado com vários legumes e pasta de pimenta, como primeira experiência culinária.

Hyunwoo Sung veio pra Fortaleza trabalhar no Pecém, mas decidiu aproveitar os dotes culinários de sua mãe e abrir um restaurante de comida coreana. O K-Bab tem público prioritariamente jovem justamente devido à Hallyu. “A influência coreana tem crescido a cada ano. Mas pessoas de mais idade também gostam muito de nossa cultura”, afirma. Branco Sung, como é conhecido, recomenda um prato chamado Japchae, um macarrão de batata doce, legumes, carne e um molho à base de shoyu. Também tem a opção com camarão e vegetariano.

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Depois de experienciar a cultura através da música, da TV e da culinária, muitos buscam dar um passo adiante: aprender a língua. Não são muitos os cursos de coreano no Estado, mas a internet permite um acesso relativamente mais fácil a materiais de estudo e cursos online.

Foi ainda no 1º ano do ensino médio que quatro estudantes do Cariri começaram a ministram aulas na Escola Estadual Dona Maria Amélia Bezerra, em Juazeiro do Norte. Elas ensinam a ler e a escrever em hangul, o alfabeto coreano. Também explicam regras, cultura, curiosidades e costumes. “A ideia do clube de coreano foi bem recebida pela coordenação, pois nunca ouviram falar sobre algo assim em uma escola”, afirma a integrante Katarina Mariano. No perfil do Instagram 4ST4RS GIRLS, as estudantes também dão dicas e tiram dúvidas sobre a língua.

A publicitária Amanda Gomes assiste dorama há muitos anos. O hobbie e o interesse pela cultura coreana levaram-na a pesquisar sobre o mercado de trabalho e as oportunidades de intercâmbio para falantes da língua: “Descobri que há vários sonhos: uns querem trabalhar com tradução de doramas na Netflix, outros querem fazer intercâmbio, outras querem encontrar um namorado. Também tem aqueles que fazem o curso para dançar na Coreia junto com os artistas”, afirma, ressaltando que estudantes de todas as idades buscam aprender o idioma.

 

A iniciativa de dar aulas de coreano na escola surgiu ainda no 1º ano do ensino médio
A iniciativa de dar aulas de coreano na escola surgiu ainda no 1º ano do ensino médio (Foto: Reprodução/Instagram)

Viajar para a Coreia do Sul

Depois de conhecer o K-pop, os dramas coreanos, a comida e a língua, viajar para a Coreia do Sul pode parecer uma opção viável para estudar, trabalhar ou simplesmente conhecer o país. Se o objetivo não for apenas o turístico, é necessário emitir o visto coreano. A solicitação deve ser feita pessoalmente na Embaixada em Brasília. Devido à pandemia, o prazo mínimo para emissão de visto é de 14 dias.

É preciso preparar os documentos de acordo com o objetivo da viagem: documentos adicionais devido à pandemia, como atestado médico que conste presença ou ausência das sintomas do novo coronavírus, e autorização de quarentena. A qualquer pessoa que visite a Coreia vinda do exterior é obrigatória a quarentena de 14 dias. Para solicitar o visto, é necessário agendar a data e o horário pelo email emb-br@mofa.go.kr ou pelo telefone 61-3321-2500.

Para conhecer mais sobre a Hallyu

Ouça o Podcast K-Papo, disponível no Spotify. A jornalista Érica Imenes e a escritora Babi Dewet falam sobre a Hallyu dentro de questões como racismo, política, padrão estético e mercado internacional. O programa sempre conta com convidados especiais, de conhecedores da cultura a artistas coreanos.

Assista ao canal no YouTube Coreanismo. Manu Gerino resenha doramas coreanos de forma crítica e responsável.

É possível também assistir doramas em outras plataformas, além da Netflix. No Viki o conteúdo é gratuito, mas uma conta premium permite acesso sem propaganda. Já o Kocowa tem um catálogo mais extenso, mas para assistir é preciso ter um plano de assinatura.

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