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Mapeamento genético revela as consequências da escravidão nas Américas

Alta taxa de mortalidade entre homens e crianças e estupros de mulheres escravizados marcaram os traços genéticos da população negra brasileira

Entre os séculos XVI e XIX, cerca de 12,5 milhões de pessoas foram traficadas da África às Américas para serem submetidas ao trabalho escravo. O impacto da escravidão é sentido até hoje por negras e negros das Américas, principalmente pelo racismo estrutural que, na prática, priva a população negra de direitos básicos e oportunidades.

Além disso, a própria genética dos descendentes de escravos foi influenciada pela desumanidade da escravidão, afirma pesquisa da companhia 23andMe e da Universidade de Leicester, no Reino Unido. Ela foi publicada no periódico American Journal of Human Genetics, no dia 23 de julho de 2020

Ao analisar o DNA de mais de 50,2 mil pessoas negras das Américas, o estudo identificou poucos traços genéticos de africanos de Senegal e Gâmbia - o que é estranho, já que durante o século XVI a região era origem de muitas pessoas escravizadas nas Américas, inclusive no Brasil. De acordo com os pesquisadores, isso se dá por dois principais motivos.

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Primeiro, foi da região então chamada de Senegâmbia que veio a maioria das crianças escravizadas. Pelas péssimas condições sanitárias e de nutrição nos navios negreiros, poucas delas resistiram e muitas morreram antes de chegar ao continente americano. Estima-se que cerca de dois milhões de homens, mulheres e crianças morreram nos navios negreiros. Outra possível razão é que boa parte dos escravos da Senegâmbia trabalhavam em plantações de arroz e morriam de malária.

Estupros no Brasil

Ainda que mais de 60% dos escravizados trazidos da África fossem homens, o estudo indicou que grande parte das descendências veio de mulheres africanas. Na América Latina, o dado ainda é mais forte. De acordo com a pesquisa, para cada homem, entre 4 e 17 mulheres contribuíram para a genética dos descendentes.

Os pesquisadores atribuem isso às práticas de estupro de mulheres africanas escravizadas, seja pelos “senhores”, seja por outras formas de exploração sexual. O estudo verificou ainda a alta mortalidade de escravos homens na América Latina.


A prevalência feminina na genética também foi causada pelo “branqueamento” racial, uma tentativa de “diluir” os traços negros na população latinoamericana. Políticas nacionais de branqueamento foram implementadas em muitos países da América Latina, estimulando a imigração européia para que homens brancos tivessem filhos com mulheres negras.

Países de origem

Outra descoberta importante para os pesquisadores foi a origem de muitos traços genéticos dos Estados Unidos e da América Latina vindos da região onde atualmente estão a Nigéria e Benin. No entanto, não há registros transatlânticos indicando fluxo dessas regiões.

Para os pesquisadores, isso é explicado pelo tráfico de pessoas escravizadas dentro do próprio continente africano. "Essas viagens teriam espalhado a ancestralidade comum no Caribe britânico para outras regiões das Américas que não estavam em comércio direto com regiões específicas da África", indicam.

Mapa mostra a origem dos países americanos
Mapa mostra a origem dos países americanos (Foto: Divulgação/Pesquisa)

Já no Brasil, a maioria das conexões genéticas é com a região do Congo, de onde quase dois milhões de africanos foram traficados para o País, afirmam os pesquisadores em entrevista à BBC Brasil. Mesmo assim, há diferenças entre o Nordeste e o Sudeste do Brasil.

"Afro-brasileiros do Nordeste têm ancestralidade tanto do Congo quanto da região da Nigéria. No Sudeste, afro-brasileiros têm ancestralidade sobretudo congolesa", explicou a pesquisadora Sandra Beleza, da Universidade de Leicester, para a BBC.

Com informações da BBC Brasil.


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