Integrantes de facções trocam comunidades por flats na Beira Mar

Integrantes de facções trocam "comunidades em guerra" por flats na Beira Mar

Criminosos com mandado de prisão em aberto conseguem alugar os imóveis com os próprios documentos. Delegado alerta que locatários não fazem cruzamento dos dados com a Polícia

A prisão de Gutierre da Cunha Rodrigues, condenado por integrar organização criminosa e com mandado em aberto referente à sentença condenatória, revelou que os criminosos têm buscado moradia em áreas nobres, fora das comunidades, no intuito de fugir das guerras entre grupos rivais e da Polícia

De acordo com o diretor adjunto do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), Rodrigo Jataí, um desses pontos escolhidos é a Beira Mar, em Fortaleza, com aluguel de flats por temporada. 

Conforme o diretor adjunto do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), Rodrigo Jataí, essa busca por moradia em área nobre tem se tornado rotineira. Ele destaca a facilidade no aluguel, pois os locatários não costumam verificar a identificação dessas pessoas, se é alguém com mandado de prisão em aberto. "São aluguéis de curta temporada e com uma rotatividade, não é como um aluguel de 30 meses", destaca. 

"É um local mais nobre e fácil de alugar. É muito rotativo e o ideal é que as pessoas tenham cuidado quando for locar, mas depende de cada pessoa, de cada proprietário. Ele (o preso Gutierre de Cunha Rodrigues) usou os próprios documentos, dados dele, mas não há uma comunicação entre os apartamentos e da Polícia sobre a pessoa que deu entrada com determinado nome", informa Rodrigo.

No caso de Gutierre, há antecedentes criminais por porte ilegal de arma de fogo, receptação e desobediência. Além da sentença por integrar organização criminosa. A rotina dele foi acompanhada pela inteligência da Polícia. O criminoso evitava sair do flat, mas recebia várias visitas.

Conforme o delegado, o homem era investigado por participação em homicídios no Vicente Pinzon. Crimes são registrados durante guerra de facções, que causou mortes e interferiu no funcionamento de escolas e estabelecimentos comerciais na região. 

A função do indivíduo na organização criminosa era de manutenção com armamentos, além de receber armas no flat para realizar limpezas. Conforme o delegado, ele também preparava pessoas para manusear armas longas.

Gutierre integrou o Exército Brasileiro (EB) e utilizava o conhecimento que recebeu sobre armamentos e segurança nacional para distribuí-lo entre criminosos. 

Em 2023, um homem apontado como integrante do Comando Vermelho (CV) também foi preso em um flat na Beira Mar, em Fortaleza, como alvo da operação Profilaxia. Ele era apontado por envolvimento com o grupo de Valeska Pereira Monteiro, conhecida como Majestade.

O homem possuía antecedentes por roubo de veículo, porte ilegal de arma de fogo, receptação, lesão corporal dolosa, roubo à pessoa e direção perigosa. Ele era responsável pela logística de armas de fogo do grupo de Majestade, conforme investigação da Polícia Civil do Ceará. O criminoso ainda possuía um mandado em aberto por integrar organização criminosa. 

Ex-membros do Exército estariam fazendo manutenção de armas do grupo criminoso 

Esse não é o primeiro caso de uma pessoa que integrou o Exército Brasileiro (EB) ser cooptada pelas facções criminosas para manusear e realizar manutenções de fuzis. 

No ano de 2020, o ex-fuzileiro naval Bruno Rafael Nascimento Leandro, de 30 anos, conhecido como Rafael Finin, foi preso apontado como chefe de uma facção criminosa que atuava no Maciço de Baturité.

Rafael era acadêmico de Direito e possuía antecedentes por homicídio, roubo, associação criminosa e porte ilegal de arma de fogo. O homem foi preso ao realizar compra de votos na cidade de Redenção.

Na época, o então titular da Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS), Sandro Caron, apontou que Rafael atuava há pelo menos dez anos no crime organizado de forma interestadual, pois passou pelo Ceará, Rio Grande do Norte e Pernambuco.

Por ser um ex-fuzileiro naval, ele possuía vasto conhecimento e treinamento militar. Ele usava desse conhecimento para praticar homicídios e assalto a banco.

Talentos de pessoas usados a serviço do RH do crime 

O POVO mostrou, com base em investigação da Polícia Civil, que pessoas enviavam currículos do crime em um grupo para ingressar na facção Guardiões do Estado (GDE). Os arquivos eram repassados por criminosos e havia um cadastro informando nome, apelido, área de atuação, cidade, bairro, padrinho e tempo de atuação no crime. 

Depois que integravam a facção, essas pessoas tinham a "oportunidade" de subir na carreira hierárquica e se tornar um "frente" na comunidade, atingindo um patamar superior entre os faccionados. Foram 88 mandados de prisão cumpridos  pela Polícia Civil do Ceará

Esse tipo de "RH" do crime é citada em uma investigação referente a um chefe da facção Guardiões do Estado (GDE). Em conversas obtidas pela Polícia Civil, o criminoso solicita a um comparsa que verifique quem são os criminosos com talentos em determinadas áreas e crie uma lista. 

""Macho faz logo uma lista aí uma lista dos caba que rouba, esse aqui é 33, esse aqui mata, tá entendendo? Nós tem que ter a equipe dos ladrão, dos que mata, dos que tem a bocada, dos que vende. É assim que se era o crime organizado (...) pra meter um fortalecimento mesmo legal, tem que dividir. Aqueles menino que gosta de roubar, tem um 32 guardado, bota o 32 na mão dos menino e bota na pista pra roubar. Uma parte vai pro fortalecimento e a outra parte vai pro ladrão. É assim”, comenta o homem em uma das conversas.

 

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