Ex-funcionários relatam expulsão de bar em Fortaleza e apontam racismo

Caso aconteceu na última sexta-feira, 26. Vítimas relataram que se sentiram humilhados e discriminados racialmente pelo tratamento da gerente do estabelecimento. Administração do bar nega acusações

Um casal de ex-funcionários relata ter sofrido racismo e discriminação racial após afirmar ser expulso do estabelecimento comercial Mormaço Bar, localizado no bairro Aldeota, em Fortaleza. O caso aconteceu na noite da última sexta-feira, 26, por volta das 22h30min. Ambos são ex-funcionários do local e relatam que foram agredidos de forma física e verbal pela gerente do bar.

O episódio teria acontecido após o atendente David Freitas, de 33 anos, e o cozinheiro Mike Yorhason, 31, acessarem uma área próxima a cozinha do bar para falar com uma amiga que trabalha no local. Na denúncia, David relata que a gerente foi até eles informar que não era permitido a presença de pessoas que não fossem funcionários do bar na área e disse para eles saírem do local.

É + que streaming. É arte, cultura e história.

+ filmes, séries e documentários

+ reportagens interativas

+ colunistas exclusivos

Segundo o casal, eles não estavam acessando a área restrita e, em seguida, a gerente deu início às afirmações de expulsão ao casal. “Ela foi para atacar a gente. Ela chegou e falou: “Eu preciso que você vá embora'”, disse David. Ainda segundo ele, o momento foi constrangedor porque a funcionária começou a falar em um tom alto seguido de gritos e empurrões dizendo que o casal não era bem-vindo no bar.

“A gente não atacou ela e só questionamos: “Pra quê isso?”. E ela falou: “A gente só não quer que vocês estejam aqui e que você saia”. A parte grave é porque ela tocou no meu namorado, empurrando com o corpo”, afirma o atendente. O casal relata que pelo menos oito pessoas, que aguardavam na fila do banheiro no corredor de acesso à área da cozinha, presenciaram o caso.

Os dois, que se reconhecem como homens negros, relataram ao O POVO que se sentiram humilhados e discriminados racialmente pelo tratamento da gerente, identificada como Lara Damasceno, que, segundo eles, é uma mulher branca. “Não existe outra palavra a não ser racismo, ela foi racista”, afirma David.

Eles explicaram que iam conversar com uma amiga fora da área da cozinha, mas que, logo depois, a gerente apontou para uma placa de identificação informando que era proibido a entrada. "Foi um desrespeito ela se sentir na autoridade de gritar com a gente. Ela foi encostando em mim e me empurrando para trás", conta Mike Yorhason.

Ele disse que a situação foi pacificada após a amiga do casal e chefe de cozinha do bar interferir na ocasião após perceber que a gerente estava alterada. “Para não ser mais constrangedor pra gente, resolvemos sair. Foram gritos e eu não achava que isso ia acontecer. Funcionários nos falaram que ela — gerente — falou depois que a gente não era bem-vindo por ninguém e nem pelos donos”, conta.

Ainda segundo David, minutos antes, um ex-funcionário do bar também estava com a namorada na mesma área onde o fato aconteceu e não foi tratado da mesma forma que ele pela gerente. Ele afirma que o ex-funcionário disse que estava lá conversando com o setor da cozinha e não aconteceu nada com ele e a namorada e que ninguém tirou o casal de lá.

O POVO buscou o Mormaço Bar, nesse domingo, 28, para saber um posicionamento do local sobre os episódios. Em comunicado, o sócio proprietário do bar, Junior Lima, informou que “não houve qualquer tentativa de expulsão do casal do bar ou atos de injúria ou discriminação racial”.

Ainda segundo Júnior, o casal estava numa área restrita para funcionários. “Quando percebido pela gerência foi orientado que os mesmos se dirigissem para área de clientes como procedimento padrão da casa com qualquer pessoa que, porventura, acesse os espaços restritos do bar”, explica.

O sócio proprietário afirma que não houve “registro de violência verbal ou física” por parte da funcionária. “Na tentativa de conduzi-los até a área permitida para clientes, um deles retruca e avança contra a nossa funcionária que dá passos para trás e se retira imediatamente do local como registrado em câmeras de segurança no momento do ocorrido”, pontua.

Desvio de função e tratamento desigual

A denúncia também revelou outros episódios envolvendo o bar e o ex-funcionário David de Freitas no período em que o atendente fazia parte do quadro de funcionários do estabelecimento, entre agosto do ano passado e março deste ano. Em sete meses de atividades no bar, David afirmou que foi submetido a desvio de função e que foi tratado de forma desigual dos demais funcionários pela atual gerente do bar.

Segundo ele, o contrato de trabalho com o bar informava a função de atendimento, com atuação no salão principal do estabelecimento. Mas, conforme David, ele era ordenado a capinar o terreno do estabelecimento com as mãos e a limpar os ventiladores alocados no bar.

“Eu era o único funcionário do salão que ela me obrigava a chegar uma hora mais cedo. “Você chega uma hora antes que é para você capinar o quintal com as mãos”. Tinha que capinar sem nenhum instrumento. Ela me tratava como se eu fosse escravo pessoal dela”, revela o ex-funcionário.

O atendente disse que também era obrigado a limpar cerca de 11 ventiladores do bar. “Limpar ventilador gorduroso, com crosta de gordura, e com produto químico”, conta. Ele afirma que não era fornecido nenhuma proteção para executar as atividades. “Eu inalava os produtos e eu tinha que limpar e fazer tudo sozinha”, disse.

O ex-funcionário disse que foi demitido em março deste ano logo depois de encerrar o seu turno de trabalho. Ele afirmou que não foi apresentado o motivo da demissão pela gerente do estabelecimento na ocasião. Um mês depois, o cozinheiro Yorhason também foi desligado do quadro de funcionários do bar. Ele também informou que nenhum motivo foi apresentado na demissão.

Sobre os episódios, o sócio proprietário do bar, Júnior Lima, disse ao O POVO, nesse domingo, 28, apenas que “não há qualquer registro ao longo do tempo”. Em relação às demissões, o estabelecimento informou que as justificativas foram expostas "para ambos no ato da demissão". Os motivos não foram divulgados ao O POVO.

O casal registrou um Boletim de Ocorrência (B.O) na Delegacia de Repressão aos Crimes por Discriminação Racial, Religiosa ou Orientação Sexual (Decrim), da Polícia Civil do Ceará (PC-CE), em Fortaleza, nesta terça-feira, 30, sobre o caso.

Dúvidas, Críticas e Sugestões? Fale com a gente

Os cookies nos ajudam a administrar este site. Ao usar nosso site, você concorda com nosso uso de cookies. Política de privacidade

Aceitar