Violência doméstica: como funcionam os grupos reflexivos para agressores no Ceará

Experiências foram compartilhadas em palestra na sede das Promotorias de Justiça de Fortaleza nesta sexta-feira, 3

Depois de cometer agressões contra mulheres, os homens precisam se autorresponsabilizar e entender as consequências da violência cometida. É o que defendem organizadores de grupos reflexivos voltados para agressores, sejam condenados ou autuados pela Lei Maria da Penha. No Ceará, experiências como essa mostram menor taxa de reincidência entre os homens participantes.

“Se a gente quer mudar comportamentos machistas, quer romper o patriarcado que traz essa masculinidade tóxica, precisa levar esses homens a reflexão, para que eles realmente tenham outras habilidades, consigam construir a masculinidade de forma positiva, de forma que não mate mulheres todos os dias”, afirma Elizângela Gomes, assistente social do Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE) e cogestora do Núcleo de Atendimento aos Homens Autores de Violência Contra a Mulher (Nuah).

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Atualmente, três grupos do Nuah atendem 83 homens e propõem reflexões sobre crenças e mitos sobre as masculinidades, o gênero e a violência contra a mulher, habilidades sociais, a Lei Maria da Penha e a autorresponsabilização. Os membros são encaminhados do 1º Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher de Fortaleza após serem autuados por violência doméstica.

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Grupos reflexivos desse modelo foram registrados também em Maracanaú, Quixadá, Juazeiro do Norte e Itapipoca. Algumas das experiências foram compartilhadas em uma palestra nesta sexta-feira, 3, promovida pelo Núcleo Estadual de Gênero Pró-Mulher (Nuprom) e Centro de Estudos e Aperfeiçoamento Funcional (Ceaf), do Ministério Público do Ceará (MPCE).

A professora Daniely Tatmatsu, coordenadora do Laboratório de Análise Experimental do Comportamento da Universidade Federal do Ceará (UFC), explicou o funcionamento do grupo de intervenção do projeto Renova, que tem o objetivo de auxiliar os homens a adquirir repertório de habilidades sociais necessárias para uma vida sem violência.

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Empatia, assertividade, resolução de conflitos e autorregulação de sentimentos são algumas das habilidades repassadas aos participantes. Um grupo de 15 homens é formado por semestre e os encontros ocorrem no Fórum Clóvis Beviláqua, em parceria com o 2º Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher.

Segundo Daniely, apenas um homem, de um grupo de 2022, voltou a ser réu em ação penal por crime de violência doméstica. A transformação de comportamento, para ela, é visível no decorrer dos encontros.

Grupos estão espalhados pelo Brasil, mas ainda em quantidade insuficiente

A primeira experiência de grupo com agressores de mulheres surgiu em 1998, antes mesmo da criação da Lei Maria da Penha, conforme a promotora de Justiça do Ministério Público de Sergipe (MPSE) Verônica Lazar, que também é diretora do Centro de Apoio ao Direito da Mulher do órgão. Ela também foi uma das palestrantes do evento.

Desde então, as iniciativas se espalharam pelo Brasil. Conforme mapeamento realizado por pesquisadores do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, 312 grupos reflexivos para autores de violência doméstica existiam em 2020.

“Já se demonstrou que esses grupos reflexivos tem a capacidade ampla de prevenir a reincidência dos agressores. Deve-se constituir uma política pública do Estado, para que haja uma disseminação maior desses grupos em cada estado, em cada município”, defende a promotora.

Elizângela, cogestora do Nuah, relembra que o projeto já recebeu suporte orçamentário do Departamento Penitenciário Nacional, conseguindo atender mais de 800 homens entre 2012 e 2014. Sem a verba, o projeto foi prejudicado. “Não existe uma política pública nacional de atenção ao homem, isso deveria ser pauta. Inclusive, é um desafio e uma vontade nossa”, afirma a assistente social.

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