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35 anos do assassinato do "Cortabundas"; entenda o caso que aterrorizou o José Walter

No limiar entre a realidade e a ficção, O POVO relembra o caso de um dos crimes mais inusitados da Capital cearense

Hoje, dia 25 de fevereiro de 2022, completam 35 anos da morte de Francisco Evandro Oliveira da Silva, mais conhecido como o "cortabundas". Entre os anos 1985 e 1987, as moradoras do bairro José Walter, ao sul da Grande Fortaleza, sofriam com medo do “cortabundas”, ou melhor, dos “cortabundas”. O nome incomum descreve exatamente o tipo de atividade que os sujeitos praticavam, um tipo de crime sem precedentes: invadiam a casa das vítimas e faziam cortes na região das nádegas de mulheres, crianças e adultas, com um estilete.

Ninguém sabia ao certo o porquê dos cortes. Foram tempos difíceis que culminaram com uma cobertura massiva nos jornais e com o aparecimento dos três principais suspeitos. Francisco Evandro Oliveira da Silva—à época, com 26 anos— era o principal suspeito a ser capturado em 6 de fevereiro de 1987.

A conta aponta que cerca de 70 mulheres foram atacadas por Evandro, mas apenas três prestaram queixa à Polícia. Foi um verdadeiro caos. Moradores se revezavam para “pastorear” as portas de casas e colocavam panelas nas janelas para sinalizar algum movimento suspeito.

Quando capturado, Evandro confessou que praticava os crimes por fetiche— ele planejava masturbar-se enquanto cortava as mulheres, mas seu tempo era curto e, para não ser pego, fugia rapidamente.

Ele foi preso no Instituto Presídio Professor Olavo Oliveira (IPPOO), onde foi assassinado por outro presidiário, um homem conhecido como “Fonfon”. Em 2010, o comissário de polícia civil na época, Airton Lopes, publicou um relato completo do caso, em que descrevia todos os acontecimentos que envolviam os atos praticados pelos “cortabundas”.

Todos se conheciam

Antes de Evandro, outro homem chamado Luiz Donald Uchôa Félix, conhecido no bairro como “McDonald”, também foi preso por cortar nádegas. Luiz era filho de um motorista policial da Secretaria da Segurança Pública do Estado (SSP).

 

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Luiz Donald Uchôa Félix, conhecido como "McDonald"(Foto: Acervo O POVO)
Foto: Acervo O POVO Luiz Donald Uchôa Félix, conhecido como "McDonald"



“McDonald cortou várias bundas, mas como ele nasceu no Conjunto José Walter, foi fácil para as vítimas o reconhecerem. Após investigações, o pai de uma das mulheres de McDonald encontrou uma carta nas coisas de sua filha e entregou ao comissário Aírton Lopes e este entregou ao Dr. Vicente Ferreira, delegado do 8º Distrito”, diz o relato de Aírton.

O comissário descobriu que McDonald estava morando em Brasília (DF) e trabalhando em uma oficina mecânica. A Polícia de Fortaleza entrou em contato com a de Brasília, que o prendeu e o transferiu para a Capital cearense de avião.

Mas a história não para por aí. Existiu um segundo “cortabundas”, Aparecido dos Santos Reis, conhecido como “Topo Gigio”, também teve o seu nome estampado em manchetes pelos mesmos crimes nada genéricos. De acordo com o relato do comissário, Topo Gigio teria iniciado a praticar os crimes para inocentar McDonald, de quem era conhecido.

 

Aparecido dos Santos Reis, conhecido como "Topo Gigio"(Foto: Acervo O POVO)
Foto: Acervo O POVO Aparecido dos Santos Reis, conhecido como "Topo Gigio"



Na casa do suspeito número dois, foram encontrados: uma peruca loira, um estilete e uma substância negra, como uma graxa—que ele usava no corpo para ficar liso. “Ele cortava as vítimas com um estilete e emendava o ânus com a vagina”, explica Aírton. Diferentemente de Evandro, os dois primeiros suspeitos negavam a autoria dos cortes.

O relato do comissário chega à conclusão mais inusitada: Dona Mirtes, mãe de McDonald, como a mandante do crime. “Presa por tráfico de drogas, D. Mirtes negou que houvesse contratado Topo Gigio e Evandro para cometerem os crimes e assim, forjar a inocência do filho”, finaliza o comissário.

Mas os acontecimentos subsequentes contrariam a versão da senhora, à época do relato, já falecida. O homem que matou o terceiro cortabundas Evandro, Fonfon, era um conhecido próximo à Dona Mirtes, o que influenciou os policiais a considerarem a morte do terceiro suspeito como uma “queima de arquivo”.

McDonald, Topo Gigio e Fonfon, no entanto, negaram até o fim o envolvimento nos crimes e que a mãe de um deles os havia contratado.

Problemas mentais

Manchete do jornal O POVO sobre a prisão do "terceiro cortabundas", Evandro(Foto: Acervo O POVO)
Foto: Acervo O POVO Manchete do jornal O POVO sobre a prisão do "terceiro cortabundas", Evandro

 

Como um dos jornais que cobriam o caso, O POVO publicou em 7 de fevereiro de 1987, junto com a notícia sobre a prisão de Evandro, um texto em que explicava a condição mental do suspeito.

Segundo o texto noticioso histórico, Evandro havia levado uma queda e batido a cabeça quando ainda era uma criança. Com as sequelas do acidente, ele sofreu um leve traumatismo.

“Na época em que isso aconteceu, seus pais foram avisados por médicos especialistas que deveria ser submetido a um sério tratamento para se recuperar da lesão sofrida no crânio”, diz o texto. Mas, devido às condições financeiras precárias da família de Evandro, ele não foi tratado.

"Eu tinha ouvido falar dessa história, mas achava que era uma invenção"

O caso "cortabundas" gerou uma enorme comoção durante os anos 80, mas devido à natureza singular dos crimes, muitos habitantes de Fortaleza começaram a acreditar que tudo se tratava de uma lenda. Porém, para os moradores do bairro José Walter e, sobretudo, para os familiares das vítimas, a história foi real e ainda reverbera o terror com a reminiscência das memórias. O jornalista e quadrinista Talles Rodrigues, por exemplo, é um desses moradores.

Talles é o escritor do livro "Cortabundas: o maníaco do José Walter", uma reportagem em formato de HQ que conta a história dos crimes. O jornalista fortalezense morou no bairro a sua vida inteira, mas também chegou a acreditar que o cortabundas nunca existiu. 

"Eu tinha ouvido falar dessa história, mas achava que era uma invenção. Mas minha minha mãe falou que não, que tudo tinha realmente acontecido e que ela lembrava da confusão que tinha sido lá no bairro", conta Talles. O jovem, então, decidiu pesquisar mais a respeito e o caso acabou se tornando o tema do seu trabalho de conclusão de curso (TCC).

Ele passava horas na biblioteca pública estadual (Bece) folheando arquivos históricos de jornal, como o próprio O POVO, em busca de informações que aprofundassem o relato da história. Durante a pesquisa, ele chegou a, inclusive, conversar com familiares de duas vítimas. "As matérias tinham o endereço da pessoa a quem elas se referiam, tipo 'fulano de tal, na rua tal'. No início, achei que isso seria péssimo hoje em dia, mas depois achei bom porque facilitou um pouco a minha pesquisa (risos)", diz Talles.

Atualmente, o livro de Talles está à venda em formato e-book e físico, para saber mais informações, clique aqui.

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