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Mais de 7 mil imóveis em terrenos de marinha poderão ser vendidos no Ceará

Medidas regulamentadoras e de informatização de procedimentos ainda devem ser estabelecidas nos próximos meses. País tem cerca de 300 mil imóveis na situação
13:42 | Fev. 06, 2020
Autor Rubens Rodrigues
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Rubens Rodrigues Repórter do OPOVO
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Tipo Notícia

Os cerca de 7,4 mil imóveis em terrenos de marinha no Ceará serão colocados à venda pela União, conforme o Ministério da Economia (ME). Isso acontece porque o Governo Federal, por meio da Secretaria de Coordenação e Governança do Patrimônio da União do Ministério da Economia (SPU/ME), está se preparando para vender sua parte desses terrenos. O Brasil tem aproximadamente 300 mil imóveis nesse cenário. Com as vendas, a União espera arrecadar R$ 3 bilhões.

Os terrenos de marinha são porções de terra que eram cobertas pelo mar, praias, canais ou mangues e que foram aterradas após a demarcação da Linha do Preamar Média (LPM). Decretado pela Lei nº 9.760, de 1946, a demarcação é realizada pela SPU. No Ceará, a Universidade Federal do Ceará (UFC) teve papel importante nesse processo.

Nos casos de terrenos de marinha é aplicado o regime de aforamento, quando há contrato de domínio perpétuo de um imóvel com pagamento de foro anual à União, uma taxa que corresponde a 0,6% do valor do terreno, segundo consta no site do Ministério da Economia. Já a taxa de ocupação pode valer de 2% a 5% do valor do terrenos. As benfeitorias devem ser feitas pelos proprietários e não constam nesse montante.

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Em nota, a pasta destaca que, para que as vendas tenham início, ainda faltam medidas regulamentadoras e de informatização de procedimentos, o que deverá ser concluído nos próximos meses. "O ocupante foreiro paga taxa anual correspondente à 83% do domínio útil do terreno do imóvel. Com a remição poderá comprar da União os 17% restantes, passando a ter o domínio pleno da propriedade", diz o ME. Salas comerciais, condomínios de casas, edifícios e até indústrias estão entre os imóveis oferecidos para venda por meio de remições de foro.

No anúncio da venda dos terrenos, o titular da SPU, Fernando Bispo, afirmou que a prática deve romper com o contrato datado de 1831, que está defasado. "Essa experiência de propriedade compartilhada com a União já não condiz com a realidade atual", declarou. "O procedimento de avaliação será automatizado e isso vai acelerar bastante o trâmite dessas remições". Detalhes desse processo devem ser estabelecidos em breve via portaria.

Problemática ambiental

Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Geografia da UFC, Jeovah Meireles destaca que existem conflitos sérios nas comunidades tradicionais ao longo das zonas costeiras com a prática conhecida como grilagem de terras, quando terrenos são adquiridos por meio de documentos não oficiais. A comunidade de Xavier, em Camocim, o território dos Tremembés na barra do Mundaú e comunidades do assentamento Maceió, em Itapipoca, estão entre essas terras. 

Comunidade indígena dos Tremembés, na barra do Mundaú, estão entre os povos que enfrentam conflitos devido a grilagem de terras
Comunidade indígena dos Tremembés, na barra do Mundaú, estão entre os povos que enfrentam conflitos devido a grilagem de terras (Foto: Aurélio Alves/O POVO)

"Nessas regiões são desenvolvidas atividades tradicionais, econômicas, culturais e muito possivelmente esse novo instrumento de mercantilização pode aprofundar conflitos e provocar consequências sociais ruins para essas populações que há anos lutam pela garantia desses territórios", avalia.

Ele afirma que ambientalmente a decisão pode ser preocupante. "A União precisa ter um controle da dinâmica costeira, dos fluxos que modelam nosso litoral", disse, a exemplo das ondas, marés e ventos. Ele defende que é "preciso ter uma visão pública, coletiva, da zona costeira diante da subida do mar", que está em torno de 3,55 mm ao ano.

Por se tratarem de áreas que atravessam processos erosivos, esses territórios podem ser afetados com a ocupação da orla do continente. Jeovah Meireles projeta cenário de interferência nas comunidades que ancestralmente ocupam o patrimônio da União e que, acumulando impactos ambientais ao longo do tempo, vem sendo sucateado.

Questionado se houve análise sobre os possíveis danos ao meio ambiente que a decisão poderia trazes às zonas, o Ministério da Economia respondeu que "não se trata da venda de terrenos sem benfeitorias e, por isso, não há o que se cogitar sobre análise de danos ambientais".

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