Promotor detalha investigação sobre tortura no sistema penitenciário do Ceará

A partir do relato de um interno, em menos de 24 horas, foram realizadas perícias e conclusão de 72 laudos. A investigação durou menos de 10 dias

A análise de imagens internas, o depoimento de mais de 100 pessoas, uma denúncia com mais de 50 páginas e seis agentes públicos réus por tortura contra 72 detentos. O caso, denunciado pelo O POVO, ainda em setembro de 2022, foi detalhado pelo promotor de Justiça Nelson Gesteira, no Núcleo de Investigação Criminal (Nuinc), que atuou na operação Martírio, que prendeu os acusados um mês após a denúncia. Atualmente, eles estão em liberdade e afastados das funções.

"Peia foi ontem na cela B1". Essa fala despertou o interesse de Nelson Gesteira, que a ouviu de um detento que denunciava ter sofrido violência em uma unidade prisional. Com a afirmação, o promotor apurou mais informações e decidiu seguir para o IPPOO 2 para constatar a denúncia. Em menos de 24 horas, foram realizadas perícias e conclusão de todos os laudos para a investigação que durou menos de 10 dias.

A cena descrita pelo promotor é de um pátio com cerca de 30 presos, sem sinais de agressão física. Nelson conta que o grupo, composto por ele, um juiz , um defensor público e um servidor da Vara, seguiu no corredor das celas e foi perguntado aos internos se tinha alguém lesionado. Todos levantaram as mãos.

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De acordo com o promotor, eram 72 internos lesionados, alguns de forma mais leve e outros apresentavam marcas pelo corpo, pés e costas machucados pela ação da tonfa, uma espécie de cassetete. Todos foram fotografados e individualizados. O promotor conta que acionou os principais responsáveis pelo sistema penitenciário. "O secretário se mostrou indignado com a situação e ali, imediatamente, administrativamente, ele afastou toda a direção da unidade, designou um interventor e providenciou a logística para o exame de perícia médica legal", ressaltou.

Nelson relatou que tudo precisava ser rápido para que as provas fossem preservadas. Ele destaca ainda que outras denúncias estão sendo investigadas em outros quatro inquéritos. Parte desses processo está sob sigilo, com o objetivo de preservar informações pessoais dos policiais penais acusados. 

De acordo com o promotor, o Ceará é o estado que mais processa agentes públicos por tortura no Brasil, mais que em São Paulo, que tem uma população maior. "O número mostra, não que o Ceará é o estado que há mais tortura, mas o que investiga e fiscaliza mais", ressalta. Para Nelson, os procedimentos executados não estão equivocados, mas sim o excesso que é praticado pelo servidor público. 

O promotor do Nuinc relembra os anos de 2014 a 2016, que segundo ele registraram "o pior período em relação a direitos humanos e ao controle das unidades prisionais". Em 2016, 50 presos foram mortos no sistema penitenciário cearense. Desses casos, reportagem do O POVO apontou que 10 foram elucidadas.

 

A Secretaria da Administração Penitenciária e Ressocialização (SAP) divulgou, por meio de nota, que repudia qualquer ato que atente contra a dignidade humana. "A Secretaria afirma que todos os casos suspeitos recebem as devidas apurações internas como também são encaminhadas a Controladoria Geral de Disciplina dos Órgãos de Segurança Pública. O sistema prisional do Ceará virou um modelo de referência nacional em vários aspectos, com destaque para a ressocialização", ressalta o órgão.

A pasta comunicou que entre os anos de 2009 até 2019, os presídios cearenses tiveram 210 presos assassinados. Desde que a SAP foi criada, em 2019, esse número caiu para 2 vidas perdidas de forma violenta.

 

 

 

 

 

 

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