Xenofobia contra brasileiros em Portugal aumenta 505% em 5 anos, aponta relatório

Em 2017, a nacionalidade brasileira era apontada como motivo de 18 queixas, 10,1% do total. Relatório de 2021 traz um total de 109 queixas, 26,7% do total

Os índices de xenofobia contra brasileiros residentes em Portugal tiveram um salto de 505% num intervalo de 5 anos. Quem mostra isso são os dados divulgados neste mês pela Comissão para a Igualdade e contra a Discriminação Racial. A entidade analisou o perfil de 408 denúncias de discriminação racial recebidas ao ano passado e A maioria era de “pessoas de nacionalidade brasileira”, que respondiam por 109 queixas — 26,7% do total.

Em 2017, abertura da série histórica, o preconceito com nacionalidade brasileira era apontado como motivo de apenas 18 queixas — 10,1% do total, ocupando a terceira posição. Paralelo a isso, a porcentagem de brasileiros morando em Portugal bateu recorde neste ano. No primeiro semestre de 2022, o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) contabilizou 250 mil brasileiros vivendo legalmente no país.

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Se levado em consideração os turistas brasileiros, o estimado é que cerca de 500 mil "brazucas", como os portugueses chamam, estejam por lá.

“Sempre a população brasileira foi a mais preponderante em Portugal, principalmente por causa da língua, dessa proximidade cultural histórica. Mas especificamente esse aumento está relacionado à crise econômica, política e social que a gente (Brasil) vem enfrentando desde 2016. É uma crise em vários níveis, ao mesmo tempo que Portugal se reergue de uma crise”, explica a professora Mariana Selister Gomes, doutora em Sociologia pelo Instituto Universitário de Lisboa e professora da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), à repórter Thais Borges, do portal Correio 24 horas, parceiro do O POVO via Rede Nordeste.

Muitos dos imigrantes possuem dificuldade em se adaptar com a língua do país, já que a população em geral não considera que os brasileiros falam a mesma língua que eles. É comum nas universidades, relatos de estudantes que não podem escrever com o português brasileiro.

Segundo Mariana, é algo que vai além de diferenças de sotaque. “Eles dizem que a gente fala ‘brasileiro’, que não é a mesma língua, que não é a língua de Camões (poeta português, autor de "Os Lusíadas"). Inclusive, dizem que a gente estragou a língua, que não entendem o que a gente fala. Muitas vezes, fazem questão de não entender”, diz.

Há ainda um outro fator problemático. Alguns proprietários se recusam a alugar imóveis para brasileiros. Em outras situações, eles pedem muitos meses de antecedência para “garantir” o pagamento, como explica a pesquisadora Cynthia Luderer, do Centro de Estudos de Comunicação e Sociedade da Universidade do Minho, que fica em Braga, também ao Correio.

“Se liga para ter informações e expressa o sotaque do Brasil, é grande a chance de receber muito mais ‘não’. Trabalho, a depender da área, também é complicado. Mas na restauração já ouvi muitos elogios em relação aos brasileiros, assim como na construção. Mas em algumas áreas, devido à questão da língua, as barreiras são bem complicadas”, conta.

Cinthia menciona também um certo “cheiro” de nacionalismo no ar que poderia contribuir nesse aumento de xenofobia. Durante o período de restrições da Covid-19, tinha campanhas a favor de uma “portugalidade”, além de serem fixados em alguns objetos, o símbolo da mais recente bandeira do país. Até mesmo em mercados, há um incentivo de consumo local.

“Ainda que seja uma bandeira sustentável, podemos vincular esses discursos a um apelo que já se percebe no campo político com o avanço do partido de extrema direita, que se sobressaiu na última eleição”, diz Luderer.

Baiano espancado em boate em Portugal

No último dia 6, em um dos episódios recentes mais graves, o baiano Douglas Rosa, 36, que mora no país há três anos, foi espancado em uma boate na cidade do Faro. “Eu gosto muito de Portugal, amo muito, mas não sei agora se é um lugar tão seguro”, diz a esposa de Douglas, a auxiliar de cozinha Gislaine Rosa, 33, ao Correio 24 horas.

Baianos, Gislaine e Douglas moram em Portugal há três anos e forma vítimas de xenofobia
Baianos, Gislaine e Douglas moram em Portugal há três anos e forma vítimas de xenofobia (Foto: Acervo pessoal / Correio 24 horas via Rede Nordeste)

"Todo estrangeiro aqui sofre um pouco. São casos de senhorio que não querem arrendar apartamento porque você é brasilero. As portuguesas de mais idade têm ciúmes de brasileiras porque, na antiguidade, diziam que brasileiras vinham para cá tomar marido. Então, eu já esperava sentir isso”, conta, também ao Correio.

“Mas eu não esperava esse nível de agressão, de tentativa de homicídio, que foi o que ocorreu. Esperava ouvir 'volta para o teu Brasil', mas não de tentar matar meu esposo”, diz sobre a agressão.

Douglas, no entanto, considera que o acontecido com ele se trata de um caso isolado. “Minha vida no país não muda muito. Infelizmente, a noite em Portugal se torna um pouco violenta, mas no dia a dia, onde eu vivo com minha família, não chega nem perto daquilo que aconteceu”, conta.

Ele espera que as devidas providências sejam tomadas. “Fora esse acontecimento, que foi devido a uma atitude covarde e isolada de seguranças que não justificam o nome que carregam, é trabalhar para buscar e alcançar o que viemos buscar aqui”, acrescenta. (Com Correio 24 horas, via Rede Nordeste)

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