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Entenda a polêmica por trás do decreto que prevê a privatização do SUS, revogado um dia após ser publicado

Documento foi assinado pelo presidente Jair Bolsonaro no inicio da semana e, dois dias depois, foi revogado devido à forte repercussão negativa
19:44 | Out. 28, 2020
Autor Gabriela Almeida
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Gabriela Almeida Repórter O POVO
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Tipo Notícia

O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) assinou, nessa segunda-feira, 26, o Decreto nº 10.530, que prevê parcerias com a iniciativa privada para gerir Unidades Básicas de Saúde (UBS) do Brasil. A medida abriu precedentes, embora não diretamente, para a privatização do Sistema Único de Saúde (SUS) e repercutiu negativamente, fazendo com que o chefe de Estado voltasse atrás na decisão e anunciasse que revogaria documento- dois dias após ter o assinado.

O Brasil tem 44 mil UBS, popularmente conhecidas como postos de saúde, distribuídas entre os municípios de todas as Unidades Federativas. Esses equipamentos foram criados para prestar um atendimento primário a 80% da população e evitar o agravamento de problemas de saúde, cujo tratamento sairia mais caro ao Governo.

A gestão dessas unidades é realizada exclusivamente por entidades públicas que atendem diretrizes do SUS. Nessa terça-feira, 27, contudo, um decreto foi publicado no Diário Oficial da União (DOU) dando indícios de que o Governo estaria com a intenção de realizar parcerias privadas para seguir gerindo equipamentos.

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Em trecho do documento, foi recomendada a busca por “estudos de alternativas de parcerias com a iniciativa privada para a construção, a modernização e a operação de Unidades Básicas de Saúde dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios”.

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De acordo com Ricardo Coimbra, mestre em Economia pela Universidade Federal do Ceará (UFC), a intenção de privatizar o segmento, demostrada pelo Governo, foi pensada como um forma de diminuir os custos que ele tem com essas unidades.

Isso porque, uma vez gerindo os equipamentos, as empresas privadas é que seriam as responsáveis pelos gastos com o funcionamento das unidades e com a criação de novas. O serviço ainda seguiria atendendo populares pelo SUS, mas apenas de forma parcial.

Repercussão negativa levou a revogação

Essa "intenção", no entanto, teve uma repercussão negativa entre parlamentares e populares, que utilizaram o Twitter para se posicionarem contra o Decreto. A campanha #DefendaoSUS foi levantada na rede social, acusando Bolsonaro de tentar privatizar o sistema.

 

Além disso, o Projeto de Decreto Legislativo (PDL), instrumento que tem o poder de suspender imediatamente os efeitos de um decreto presidencial, foi protocolado por deputados do PCdoB e do PT. Parlamentares de outras legendas ainda demostraram interesse em aderir o gesto.

Como toda a pressão acerca do assunto, a Secretaria-Geral da Presidência emitiu nota na manhã desta quarta-feira, 28, justificando trecho do documento. "O objetivo primordial do decreto é tão somente permitir que sejam realizados ou contratados estudos multidisciplinares (...) para alimentar o governo de dados e informações sobre a atual situação das UBS", garantiu o órgão.

No entanto, a pasta admitiu que as pesquisas buscam analisar se a privatização é viável, citando melhorias caso unidades fossem destinadas a um "único prestador de serviços". As manifestações contrárias à decisão seguiram e, no início desta noite, Bolsonaro utilizou sua página oficial no Twitter para anunciar que decreto será revogado.

O presidente negou que o documento tenha a intenção de privatizar o SUS e informou que a intenção da modificação era possibilitar que pacientes do sistema fossem atendidos em unidades hospitalares privadas. Como justificava, o chefe de Estado frisou que existem locais onde postos de saúde não conseguiam suprir a demanda.

 

Porta de entrada do SUS

De acordo com a médica cearense Elodie Hyppolito, integrante do Coletivo Rebento, a unidade básica de saúde é a "porta de entrada do SUS". Isso porque o atendimento primário permite o acompanhamento da saúde de gestantes, bebês, crianças, adultos e idosos - prevenindo o surgimento ou o desenvolvimento de doenças mais graves- cujo tratamento sairia mais caro ao Governo.

Elodie considera como "absurdo" a possibilidade de privatização levantada pelo Decreto e destaca que empresas privadas têm o interesse na área "porque é a que tem menos custo". Reconhecendo que o sistema de atendimento dessas unidades precisa melhorar, a médica defende ainda que Governo deve liberar verbas para realizar ações, como a contratação de profissionais - e não optar pela privatização.

O economista Ricardo compartilha o mesmo posicionamento e destaca ainda uma "desigualdade" caso modelo que estava em possibilidade no Decreto fosse aplicado. De acordo com o especialista, mesmo ainda atendendo pelo SUS, as UBS dariam prioridade ao atendimento privado - que gera renda.

Segundo a Constituição brasileira, a saúde no País é "pública e universal" e deve ser regulado pelo SUS, sem interferência predominante do sistema privado. Por esse motivo, o Decreto estava ainda sendo considerado "inconstitucional" por grupos contrários ao documento.

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