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"Queremos encontrar caminhos para fortalecer a empregabilidade, mas sem perder direitos sociais", afirma procurador-geral do Trabalho

O procurador-geral do Ministério Público do Trabalho (MPT), Alberto Balazeiro, esteve em Fortaleza nesta sexta-feira, 22, e conversou com O POVO sobre a medida que vem sendo vista com "uma nova reforma trabalhista"
11:54 | Nov. 22, 2019
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Tipo Notícia

O governo federal anunciou, no último dia 11, um programa que barateia a contratação de jovens entre 18 e 29 anos com o objetivo de fomentar emprego nessa faixa etária. A Medida Provisória (MP) 905/2019 altera pontos da legislação trabalhista e cria o Contrato de Trabalho Verde Amarelo. De acordo com as estimativas oficiais, o projeto teria potencial para gerar 1,8 milhão de vagas nos próximos três anos.

A ampla proposta altera, em maior ou menor grau, pelo menos 60 artigos e 130 dispositivos da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) e é criticada por órgãos de defesa dos direitos trabalhistas, departamentos de estudos econômicos, organizações da sociedade civil e parlamentares. Entre as condições criadas estão a redução do valor do auxílio-acidente pago aos trabalhadores, a isenção da contribuição patronal de 20% para o FGTS, a maior flexibilização para o trabalho aos domingos e a ampliação da carga horária de bancários.

O procurador-geral do Ministério Público do Trabalho (MPT), Alberto Balazeiro, esteve em Fortaleza nesta sexta-feira, 22, para participar do III Encontro Estadual de Adolescentes pela Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil e conversou com O POVO sobre a medida que vem sendo vista com uma nova reforma trabalhista.

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O POVO - A Medida Provisória 905 foi anunciada no início de novembro pelo governo federal como uma medida de incentivo às contratações, principalmente de jovens em seu primeiro emprego. Entretanto, desempregados, empreendedores e diversas outras categorias profissionais também devem passar por mudanças em curto, médio e longo prazos. Quais têm sido os pontos de maior preocupação do Ministério do Trabalho?

Alberto Balazeiro - A Medida Provisória é muito extensa, ela tem 53 artigos e só trata do estímulo a contratações até o artigo 19. Temas de direito social, trabalho aos domingos, oneração do seguro-desemprego por previdência são alguns dos pontos que nos preocupam em meio a tantos. O Ministério Público do Trabalho criou um grupo de trabalho para analisar essa proposta e já temos uma primeira nota técnica. Em relação ao contrato verde-amarelo, a gente tem preocupação sobre a redução da multa de 40% em casos de demissão sem justa causa em seu aspecto jurídico, porque é uma multa constitucional.

Há também o ponto de se criar uma faixa etária que seja foco desse programa. Quando se coloca foco naqueles dos 19 aos 28 anos, a faixa etária seguinte pode assistir a uma eventual discriminação e redução dos postos de trabalho. Existe aí uma preocupação com pessoas sendo desligadas do mercado de trabalho.

Já o trabalho aos domingos e o acréscimo na jornada de trabalho dos bancários, por exemplo, são alguns dos artigos que aparecem nessa MP praticamente da mesma forma em que estavam na MP da Liberdade Econômica (MP 881/19) e acabaram sendo rejeitados. Há ainda o cancelamento de registros de profissões, como jornalistas, corretores de seguro, químicos, que é um tema até estranho à matéria tratada. É uma medida provisória sobre estímulo ao primeiro emprego que acaba desregulamentado registros profissionais.

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OP - Além dos pontos que recaem diretamente sobre os trabalhadores, existem ainda questões que dizem respeito à própria atuação do MPT. De que forma a MP pode afetar a atuação na defesa e garantia dos direitos trabalhistas?

Alberto Balazeiro - A MP afeta nossa atuação enquanto ente que fomenta o desenvolvimento e o equilíbrio das relações de trabalho por questões como a destinação das multas e das indenizações de Termos de Ajuste de Conduta (TACs) e de acordos judiciais do Trabalho.

Pela lei da ação civil pública, de 1985 e que vale para todo o Ministério Público brasileiro, a reparação deve ser ao dano local. Por exemplo, se há uma situação de trabalho em condições análogas ao escravo em Fortaleza, a indenização que quem praticou esse ato deve reverter para a comunidade de Fortaleza. Pela Medida Provisória, se cria um programa nacional de reabilitação relacionada a acidentes de trabalho o qual não contempla todas as matérias da nossa área de atuação e cujo recursos irão para o Tesouro da União. Ou seja, as comunidades locais não verão a reversão.

Um outro aspecto é a duração dos TACs, apenas dois anos. Assim, a gente vai ter uma refiscalização contínua de matérias, o que incentiva a judicialização das relações trabalhistas e traz prejuízos às próprias empresas, que não poderão dar uma obrigação alternativa.

OP - Diante disso, como os procuradores do Trabalho e o Ministério Público do Trabalho estão se articulando?

Alberto Balazeiro - Temos conversado com o Executivo e com o Congresso Nacional, além, de abrir nossos canais, para contribuir com esse debate. Queremos encontrar caminhos para fortalecer a empregabilidade, mas sem perder direitos sociais e nosso norte constitucional de proteção ao valor social do trabalho. Esperamos que esses temas sejam dialogados com os poderes a fim de encontrar formas que de fato gerem mais emprego digno no Brasil.

Leia na íntegra a nota técnica produzida pelo Ministério Público do Trabalho:

Nota Pública

O Ministério Público do Trabalho, instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis nas relações de trabalho, por seu Procurador-Geral do Trabalho, Alberto Balazeiro, vem manifestar sua avaliação preliminar do Programa Verde Amarelo, veiculado através da Medida Provisória nº 905/2019.

A defesa dos direitos sociais é, em verdade, uma defesa da própria sociedade e da Constituição Federal. Desta maneira, qualquer alteração legislativa que deixe de avançar a pauta dos direitos sociais deve ser analisada de forma detalhada em face de sua constitucionalidade e convencionalidade junto às obrigações internacionais do Estado Brasileiro quanto à Direitos Humanos nas Relações de Trabalho.

Nesse sentido, o Ministério Público do Trabalho vem informar a criação de grupo de estudos para analisar em profundidade o Programa Verde Amarelo, alteração legislativa trazida por meio da Medida Provisória nº 905/2019, sob os seus diversos prismas, inclusive sobre a sua regularidade material e formal, tanto no aspecto da sua constitucionalidade como no da convencionalidade, este último no que se refere às obrigações internacionais do Estado Brasileiro quanto aos Direitos Humanos nas Relações de Trabalho.

Os objetivos enunciados pelo Governo Federal - avanço na empregabilidade e desenvolvimento econômico – não podem deixar de contar com a salutar ampliação do debate democrático, sobretudo em matéria de direito social, que deve se realizar precipuamente no âmbito do Poder Legislativo, considerando a grande extensão de medidas, inovações jurídicas e revogações de disciplinamentos legais de várias profissões. O Poder Legislativo, como instância deliberativa das demandas mais essenciais da sociedade, deve ser prestigiado, inclusive pela aptidão natural para o debate, diálogo e convergência de múltiplas visões sociais.

O Ministério Público do Trabalho, apesar de não consultado, foi ainda afetado por disposições que limitam a sua atuação e a do próprio Poder Judiciário na reparação de violações a direitos difusos e coletivos, tendo sido criados empecilhos à recomposição dos bens jurídicos atingidos mediante destinação de indenizações e multas cominatórias, o que será objeto de todas as providências cabíveis visando a correção de tal equivocada interferência, inclusive porque tais disposições não guardam qualquer relação com os objetivos enunciados, de geração de empregos.

O Ministério Público do Trabalho continuará sempre aberto à sociedade e as instituições governamentais para contribuir no debate no campo da sua atuação e sempre visando o cumprimento da sua missão constitucional, seja para encontrar consenso na alteração e melhoria das disposições apresentadas, seja para apresentar os questionamentos judiciais pertinentes na defesa dos valores e direitos fundamentais trabalhistas.

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