Coluna Vanessa Passos: Não estou sem criatividade, só estou exausta
A coluna dessa semana é o meu desejo para todas as mulheres que me leem. Que, assim como eu, possam seguir nessa caminhada rumo à leveza. É um aprendizado. Porque nem sempre é bloqueio criativo, às vezes, você só está exaustaA criatividade também precisa ser alimentada, foi o que eu descobri. Depois de uma sequência de viagens, de trabalhos, de orientações de alunos de escrita, eu tentei voltar ao meu novo romance, do qual já havia terminado a primeira versão, que é o trabalho do meu pós-doutorado em escrita criativa na PUC/RS, e eu não reconheci o texto. Não consegui voltar para ele nem para as personagens. Não consegui me conectar com a história nem pensar num mísero novo título – porque "A primogênita", apesar de bom, ia parecer uma continuação de "A filha primitiva", o que não é.
Então me vi sem saber o que fazer. Sem criatividade. Ri sozinha da própria desgraça, lembrando dos tempos de adolescência em que eu imitava João Grilo no filme "O Auto da Compadecida": “Nem uma gota de pensamento. Nem um clarão de entendimento. Quanto mais eu penso, me dou com as ventas na parede” (risos).
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AssineA verdade é que, diante de toda a correria, não me sobrou tempo para terminar de ler o livro que eu queria, nem para pesquisar obras de arte na internet, um dos meus passatempos favoritos, ou jogar um carteado com a minha filha (mesmo que ela sempre ganhe de mim). Eu me dei conta de que minha criatividade estava minguando e que eu não estava conseguindo nem ter a ideia para um título novo, porque sim, eu estava exausta.
O mais doloroso de tudo isso é que, mesmo exausta e ciente de que precisava descansar, eu sentia culpa. Culpa por não produzir como antes e por precisar descansar. E já ouvi escritores dizendo que não ligam se não estão escrevendo, que tenham intervalos e que isso não os torna escritores menores. Mas é claro que não. Eles são homens. A vontade mesmo era dizer: você já olhou para baixo e percebeu que tem um pinto no meio das pernas?
Para os homens, o simples fato de ser homem já os valida na vida, na escrita e no mercado literário, infelizmente. Nós, mulheres, precisamos provar coisas, na maioria das vezes, temos de lidar com jornada dupla, às vezes tripla, e, se não queremos ser mães, somos questionadas porque a maternidade não é uma opção ou uma prioridade. É sempre uma sinuca de bico que caminha para o mesmo lugar: a exaustão e a culpa. Uma retroalimenta a outra.
Eu ainda não tenho respostas. Mas ouvi uma canção essa semana da Sandy, um feat com Wanessa Camargo, que já determinei que seria meu lema de vida:
"Aprendendo a fazer nada/ Entendendo que nem tudo é questão de vida ou sorte. Aprendendo a ser errada/ E que nem toda direção requer um norte/ Reaprendendo a ser leve/ Reaprendendo a ser leve/ Reaprendendo a ser leve, solta/ Ventania louca/ Leve".
A coluna dessa semana é o meu desejo para todas as mulheres que me leem. Que, assim como eu, possam seguir nessa caminhada rumo à leveza. É um aprendizado. Porque nem sempre é bloqueio criativo, às vezes, você só está exausta.
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