Agremiações de Maracatu relatam dificuldades de manutenção e pedem maior apoio da Prefeitura

Uma das principais reivindicações dos representantes de agremiações de Maracatu em Fortaleza é o repasse de apoios financeiros previstos na Lei Orçamentária Anual

Definida como Patrimônio Imaterial de Fortaleza, a manifestação cultural do maracatu na Cidade enfrenta adversidades em meio à pandemia de Covid-19. Sem possibilidade de realizar apresentações presenciais, grupos solicitam da Secretaria da Cultura de Fortaleza (Secultfor) diálogo e mais ações que contribuam para a manutenção da tradição na Capital.

Devido à pandemia, não houve Ciclo Carnavalesco presencial na Cidade neste ano, o que reduziu consideravelmente as atuações de grupos e intensificou dificuldades financeiras. Uma das principais reivindicações dos representantes de agremiações de maracatu em Fortaleza é o repasse de apoios financeiros previstos na Lei Orçamentária Anual (LOA) aprovada para este ano.

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Entre os valores anunciados no documento, estão R$ 123 mil direcionados para o projeto “25 É Dia do Maracatu”, que busca levar mensalmente a manifestação cultural para vários locais da Cidade. Dessa forma, as agremiações recebem cachês pelas apresentações.

Além disso, foram previstos aproximadamente R$ 5 milhões para o Ciclo Carnavalesco. Como ele não foi realizado de forma presencial em 2021, o secretário Elpídio Nogueira afirmou, em janeiro, que seriam estudadas “medidas compensatórias” para ajudar profissionais do setor na Capital. Contudo, representantes de grupos alegam que isso ainda não ocorreu.

Segundo Raimundo Praxedes, presidente da Associação Cultural das Entidades Carnavalescas do Ceará (Acecce), a quantia referente ao Dia do Maracatu não foi repassada para os grupos. O presidente também cobra mais diálogo com a Secultfor, pois alega que não há retornos para as demandas apresentadas pela associação e, além disso, há dificuldade em saber “a quem se dirigir”.

De acordo com Praxedes, muitos brincantes estão vendendo instrumentos para o pagamento de aluguel, visto que várias sedes de grupos de Maracatu são alugadas. Em meio a isso, ele relata que são adquiridas cestas básicas a partir de doações para ajudar brincantes que estão enfrentando mais dificuldades. O presidente acrescenta que muitos estão pensando em deixar agremiações.

“Não há ricos no Ciclo Carnavalesco. Quem faz cultura são pessoas de classe média baixa, que produzem todo tipo de cultura. Não conheço uma pessoa que faça o Carnaval e tenha um carro com menos de dez anos de uso e que tem possibilidade de comprar seu próprio material. Muitos moram em imóveis alugados”, comenta Raimundo.

No Maracatu Rei Zumbi há 280 integrantes, dos quais muitos são crianças, segundo Teonildo Lima, presidente da agremiação. Com a paralisação de atividades, entretanto, várias diminuíram a intensidade da relação com a manifestação cultural.

Para tentar minimizar os prejuízos desse cenário, o presidente solicita espaços culturais em Fortaleza onde sejam possíveis apresentações de grupos e, assim, transmiti-las virtualmente para o público que assistiria em suas casas. Ele também sugere a promoção de aulas para brincantes para aprimoramento de seus trabalhos enquanto estão parados.

Outras adversidades enfrentadas nesse contexto são a dificuldade de comprar alimentos e de pagar materiais do grupo devido à falta de dinheiro. A situação o levou ao pensamento de até vender o Maracatu Rei Zumbi: “Procurei vender meu maracatu por 30 mil. Ninguém quer comprar, porque não dá lucro. Eu quis vender aquilo que eu mais amo na vida. Na minha história, antes de tudo eu era um brincante, e tinha o sonho de um dia ter o meu próprio grupo, para fazer de um jeito mais bonito”.

Márcio Santos, carnavalesco e vice-presidente do Maracatu Vozes da África, um dos mais tradicionais do Ceará, relata que a situação está bastante difícil. Segundo Márcio, o grupo costumava se apresentar durante todo o ano em atividades promovidas tanto pela Prefeitura e pelo Estado quanto em escolas e eventos em congressos. O Vozes da África se mantinha a partir dos cachês das apresentações. Com a paralisação, o cenário se complicou.

De acordo com o vice-presidente, a sede do Maracatu Vozes da África é alugada e há um custo de contas fixas como água, luz, internet e o próprio aluguel. Para compensar essa escassez de recursos, integrantes estão procurando outros meios para sobreviver. “Nós temos mais de 300 brincantes e entre 30 a 40 pessoas que trabalham diretamente com o grupo, entre artistas plásticos, cantores, músicos, compositores, soldador e aderecista. Então, todas essas pessoas foram afetadas. Está sendo muito complicado e as pessoas estão procurando outros meios para compensar essa falta”, relata Márcio Santos.

O carnavalesco afirma que uma alternativa encontrada para continuar resistindo durante a pandemia foi por meio de lives realizadas nos perfis do Maracatu em redes sociais, contribuindo também para "ficar próximo das pessoas e dos integrantes do grupo”. Segundo Márcio, ainda que o Vozes da África tenha sido contemplado pela Lei Aldir Blanc, o fomento não é suficiente para manter o grupo.

Diante desses cenários, ele sente que falta mais “acolhimento” e “reconhecimento” com as agremiações por parte da ação municipal e espera que haja mais “diálogo”, algo ressaltado também pelo presidente e fundador do Maracatu Nação Pici, Carlos Brito.

Ele relata que pensou que a situação enfrentada "seria diferente" pelo fato de o Maracatu ser considerado Patrimônio Imaterial de Fortaleza. Segundo Carlos, não há procura nem um encaminhamento definido de como os grupos devem agir por parte da secretaria.

"O Carnaval e o Dia de Maracatu passaram e nada aconteceu. Parece que não temos importância cultural para a sociedade", alega. Assim como Márcio Santos, Carlos Brito considera insuficiente para a manutenção da agremiação os valores concedidos por auxílios emergenciais culturais na Capital.

Dessa forma, são enfrentadas dificuldades para pagar aluguel e ajudar alguns brincantes que estão passando por situações mais adversas. O presidente acrescenta: “Os brincantes sentem falta das apresentações e do convívio, porque nós nos sentimos como se fôssemos uma família. Muitos nos pedem ajuda com alimentos e não temos tantos recursos, então ficamos sem poder ajudar. Nossa principal dificuldade é essa: não poder ajudar quem realmente necessita”.

Posicionamento da Secretaria da Cultura de Fortaleza

Na última segunda-feira, 3, a Secultfor realizou uma reunião com representantes de maracatus de Fortaleza. No encontro, os participantes manifestaram suas reivindicações. Em nota, a pasta informou que será lançada uma política de apoio aos maracatus com parte de recursos remanescentes da Lei Aldir Blanc.

Na nota, a Secultfor alega que foram executados R$ 13,194 milhões dos R$ 17,82 milhões destinados ao Município por meio da Lei Aldir Blanc. Assim, o encaminhamento dos valores remanescentes aguarda decisão do Governo Federal quanto à prorrogação da lei, cuja sanção deve ocorrer até dia 12.

Confira a nota da Secultfor na íntegra:

A Secretaria Municipal da Cultura de Fortaleza (Secultfor) informa que foi realizada, na tarde desta segunda-feira (03), uma reunião na sede da pasta com representantes dos Maracatus da Capital cearense. O encontro teve como principal objetivo escutar as reivindicações da categoria e identificar possíveis alternativas para o apoio aos grupos. Ficou definido que a Secultfor lançará uma política de apoio aos Maracatus com parte do recurso remanescente da Lei Aldir Blanc.

Dos R$ 17,82 milhões destinados por meio da Lei Aldir Blanc para o município de Fortaleza, foram executados o total de R$ 13,194 milhões, equivalente a 74% de execução. A destinação dos recursos remanescentes aguarda decisão do Governo Federal em relação a prorrogação da lei. A sanção presidencial da lei está prevista para ocorrer até o dia 12 de maio deste ano.

Ressalta-se que neste ano já foram realizados encontros com os grupos de Maracatus, com membros do Conselho Municipal de Política Cultural (CMPC) e do Conselho Municipal de Proteção do Patrimônio Histórico e Cultural de Fortaleza (Comphic), além de reuniões com representantes dos fóruns das linguagens artísticas. A pasta ainda segue em constante diálogo com outros órgãos da Prefeitura de Fortaleza e do Governo do Estado do Ceará.

Diante da crise econômica e social gerada pela pandemia da Covid-19, em que o setor cultural foi, sem dúvidas, um dos primeiros a sofrer os efeitos, a Secultfor manteve ações de apoio aos artistas com apresentações virtuais, auxílio emergencial, pagamento do Edital das Artes e execução da Lei Aldir Blanc. Os grupos de Maracatus foram contemplados nessas ações, com destaque para a Lei Aldir Blanc e para o auxílio emergencial Uma Força para a Cultura.

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