Letrista Capinan celebra 80 anos com contribuição ativa para a cultura brasileira

Encontro virtual acontece nesta sexta-feira, 19 de fevereiro, para celebrar o aniversário de José Carlos Capinan. A live contará com presenças de Jards Macalé, Roberto Mendes e Gereba

José Carlos Capinan costuma se deitar na rede, pegar seu celular e fazer o trabalho que já domina há seis décadas: compor. Ao completar 80 anos nesta sexta-feira, 19 de fevereiro, pretende contribuir para a cultura brasileira até quando for possível. Continua tão ativo que na terça-feira, um dia antes de conceder entrevista ao O POVO, havia realizado uma composição inédita: “Ainda me lembro o pijama mijado do filósofo/ Jean Paul Sartre/ Que passou pela Bahia/ E vendia jornais escritos em Pequim/ Pelas ruas de Paris/ O homem é um projeto que se faz/ Assim ele dizia e falava de utopias/ que hoje já não se falam mais/ Em Salvador lembrou-se do seu amor Simone/ E pedia quente o seu acarajé/ Era um branco Gege/ Se pode haver/ E via o mundo de forma bem diferente/ Podes crer”.

“Começo a escrever o que vem no espírito, na minha alma”, explica sobre seu processo criativo. O texto acima, por exemplo, coloca em evidência um dos mais importantes filósofos do século passado e contrasta seus sentimentos utópicos com a desesperança que a sociedade atual enfrenta. “Acho que estamos esquecendo o amanhã, a luz, por causa dessa coisa louca que é o obscurantismo, a pandemia e a dificuldade do fazer cultural”, afirma. Em meio à conjuntura social e política que os brasileiros vivem, o artista também começou a se perguntar com frequência sobre o amor em suas canções. “O amor é político. Hoje, amar faz parte de uma sociedade nova, utópica. O amor tem um peso muito grande. Ele é revolucionário”, defende.

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Mas o setor musical não é a única área em que Capinan trabalha. Atualmente também é coordenador do Museu Nacional da Cultura Afro-Brasileira (Muncab), localizado no centro histórico de Salvador. A instituição busca dar visibilidade à influência da matriz africana no Brasil. “O negro trouxe uma contribuição fantástica para nossa civilização, no fazer, no sentir, na culinária, na medicina, na religiosidade, na música… Eles trouxeram uma contribuição inestimável, que não tem visibilidade, uma vez que o preconceito e o racismo impedem que mostremos essa importância”, explicita.

Com décadas de funcionamento, o espaço enfrentou dificuldades durante o segundo semestre do ano passado por causa do atraso da liberação de recursos do Ministério do Turismo. “Eu acho que a extinção do Ministério da Cultura foi um atraso, um retrocesso, que prejudica as ações culturais e que nos atingiu”, afirma. Por causa da situação, o lugar se sustentou por meses com o auxílio dos próprios funcionários e do público, em geral. Agora, a terceira parcela do convênio que mantém com o órgão público foi liberada, o que garante mais um ano de atividades.

O cotidiano do artista é um esforço contínuo para a manutenção da memória cultural do País nas diversas áreas. Ele define sua trajetória ao citar o poema de Carlos Drummond de Andrade (1902 - 1987): “No meio do caminho havia uma pedra… E por aí vai. Essa pedra cresce, a gente a ultrapassa, e ela continua a nos oferecer outro obstáculo. Mas a marcha não para, ela sempre vai funcionando um pouco, conforme vai dando, em cada situação que o País passa politicamente”. Para o letrista, o importante é perseverar. “Vou tentar sobreviver o máximo possível a toda essa loucura, a essas dificuldades, trabalhando”, completa.

Influência na música brasileira

Nascido no interior da Bahia, em Esplanada, Capinan se mudou para Salvador após ingressar na faculdade. No local, conheceu vários músicos e passou a contribuir ativamente para o cenário artístico da época. Começou escrevendo peças teatrais e estreou no universo da música com “Ladainha” (1966), composta em parceria com Gilberto Gil e gravada por Nara Leão. Neste mesmo ano, compôs, ao lado de Paulinho da Viola, a música “Canção para Maria”, que ficou em terceiro lugar no 2° Festival de Música Popular Brasileira, promovido pela TV Record. Mas foi em 1967 que obteve maior destaque quando a canção “Ponteio”, interpretada por Edu Lobo, ganhou a 3ª edição do evento.

Suas parcerias continuam. Produziu a música “Soy Loco Por Ti, América” também ao lado de Gil. Colaborou com a letra “Miserere Nobis”, do disco “Tropicália: ou Panis et Circensis” (1968) e, com isso, se tornou um dos tropicalistas. O movimento, que surgiu durante a Ditadura Militar (1964-1985), se propunha a incorporar várias linguagens e estéticas com o objetivo de repensar o Brasil.

Trabalhou com Jards Macalé, Fagner, Elizeth Cardoso, Elis Regina, Maria Bethânia, João Bosco, Moraes Moreira, Tom Zé e outros. “Minha história foi construída com muitos parceiros. Essa parceria foi um diferencial imenso no meu trabalho. Talvez eu seja um dos autores que tem mais parceiros na música brasileira em gêneros diversos”, comenta.

Além de ser responsável pelas letras de várias canções, ainda escreve poemas. Tem, em seu repertório, os livros “Confissões de Narciso” (1989), “Balança mas Hai Kai (1989) e “Uma Canção de Amor às Árvores Desesperadas” (1996). “Eu não vejo diferença entre letra de música e poema. Estão apenas em suportes diferentes. Não penso como se houvesse diferencial. A palavra tem uma relação direta com a música. A palavra poética, sobretudo, tem muita ligação com a música”, diz.

Capinan nas páginas do O POVO

O POVO registrou aspectos da trajetória de Capinan durante suas seis décadas de carreira. Participação no movimento tropicalista, entrevistas e parcerias com artistas cearenses são alguns dos destaques. Confira abaixo as páginas do jornal:

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Homenagem aos 80 anos

O aniversário de Capinan será comemorado pelo Museu Nacional da Cultura Afro-Brasileira (Muncab) nesta sexta-feira, 19, às 19 horas. O evento virtual, que será transmitido no canal do Youtube da instituição, tem presença confirmada de Jards Macalé, Roberto Mendes e Gereba. Com bate-papo sobre música e arte, a iniciativa contará com mediação do jornalista Leonardo Lichote, especialista na área musical.

Além disso, haverá o lançamento de uma minissérie em que o artista comenta sobre o surgimento de suas principais canções. Dividida em cinco capítulos e dirigida por Jamile Coelho, a obra percorre as histórias de “Viramundo”, “Miserere Nóbis”, “Soy Loco Por Ti, América”, “Papel Machê”, “Tempos Quase Modernos” e “Yaya Massembá”.

Especial 80 anos do Capinan

Quando: sexta-feira, 19 de fevereiro, às 19 horas
Onde: no canal do Youtube do Muncab
Mais informações: no Instagram @muncaboficial

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